Acredito que seja impossível citar a geração PlayStation 2 e Game Cube sem acabar falando de Resident Evil 4. Se não é a maior experiência desta geração, está lado a lado com as demais e consagrou a franquia da Capcom com um dos maiores patamares no universo dos videogames. Não é à toa que, desde então, o título é relançado para todas as plataformas – acredito que ganhando até de Minecraft e deve estar próximo de The Elder Scrolls V: Skyrim neste quesito.
No entanto, estamos em 2023 e quase vinte anos depois de seu lançamento a produtora decide nos trazer um remake. Seguindo os passos do que foi visto do trabalho realizado em RE2 e RE3, os fãs temiam o pior e poderia ter dois resultados: uma das maiores visitas ao passado ao lado do que tivemos em Final Fantasy VII Remake ou um dos maiores tiros no pé que esta empresa já deu – e olha que não seria o primeiro.
Para a nossa sorte e alegria geral da nação, Leon S. Kennedy não só retornou em sua melhor forma como traz a experiência definitiva deste consagrado título. Não podemos nem vamos desmerecer o original aqui – afinal de contas, seria um sacrilégio – mas temos de ser sinceros: essa repaginação no projeto faz muito mais bem do que o contrário e mostra que esta história e personagens continuarão vivos por mais algumas gerações daqui em diante graças ao trabalho primoroso da equipe de desenvolvimento.
Uma viagem de Resident Evil 4 ao futuro
Para mim, um dos elementos mais primorosos e especiais que o remake de Resident Evil 4 trouxe foi manter tudo na base de como era antigamente. Gameplay, mal foi tocado. Cenários e visuais revisados e, vamos ser sinceros, mantém o mesmo charme do original. Nem mesmo as interpretações de cada um foram mexidas, com muitas frases representando 1:1 do que existia antigamente.
A solução não é manter o original imaculado. É melhorar o que faltava nele para atingir uma geração inédita de consoles e computadores. E o que já era nota 10 antes, consegue mostrar com orgulho a sua medalha ainda nos dias de hoje através da nova versão. E aquilo que foi alterado, acredite, foi para um bem maior e aprimora ainda mais a aventura de Leon contra o perigoso Osmund Saddler.
Para isso, a Capcom decidiu trazer alguns elementos inéditos e que envolvem ainda mais os jogadores naquela ambientação de survival horror com um pouco de ação. A mecânica stealth, por exemplo, não é só muito bem-vinda como entrega um verdadeiro show à parte enquanto você avança. Inicialmente é restrita para se aproximar de inimigos e dar uma facada, porém conforme vai pulando os capítulos isso cresce e toma proporções ainda mais satisfatórias. Te pouparei dos spoilers, mas grave isso contigo.
Além disso, eles trazem Ashley para ainda mais próxima do público em Resident Evil 4, tornando-a mais esperta e oferecendo mais opções na jornada. É um saco ter de ouvir os gritos de “LEOOOON”? Sim, ainda é. No entanto, admito que foi muito mais agradável agora que ela obedece suas ordens e pode até se manter escondida do que antigamente. Afinal de contas, se alguém quer ser protegido, tem de colaborar.
Inclusive, nos poucos trechos inéditos desta versão, a estrela dela brilha ainda mais. Nada mais justo para uma personagem que basicamente é alvejada durante todo o trajeto e que ficou conhecida por ser “insuportável”. Desta vez a Capcom aumentou ainda mais as suas participações e mesmo que eu tenha críticas negativas sobre parte deste teor, isso acaba sendo irrelevante no fim das contas.
O mais importante é que modernizaram algo com todo o carinho e cuidado que apenas RE4 poderia receber. Não só pela hype ou pelo pedido incessante de uma base de fãs que não cansou de pedir isso via redes sociais ou em apresentações. Fizeram no momento certo, com um time que se mostra apaixonado pelo original e respeitando tudo o que tornou a experiência em um resultado mágico.
Versus Los Iluminados
O protagonista de Resident Evil 4 tem em suas mãos o mais diverso arsenal de armas possível para um herói da franquia. Fuzis, pistolas, espingardas, submetralhadoras, Magnum, lança-foguetes e uma que te acompanha do início ao fim da jornada: as facas. Considerando que você mantém a visão em terceira pessoa, mais próxima ao corpo de Leon, isso já serve para causar um grande estrago no que está em sua frente.
E se tem uma seleção de armas grande para você escolher bem, as opções de se aniquilar um inimigo também são variadas. Particularmente falando eu fiquei muito empolgado em ver que alguns morriam apenas com iluminadores, outros com tiros específicos em certos lugares do corpo, encarar ameaças que são protegidas por um escudo ou peças de metal pelas suas vestes…enfim, as possibilidades são enormes e você tem de se adaptar da melhor forma. É isso ou a morte certa.
Falando em morte, isso é bem importante de discutirmos aqui neste review: o jogo se tornou extremamente traiçoeiro e se você acha que conhece cada canto dali, é melhor rever seus conceitos. Há muito mais armadilhas espalhadas e que vão muito além das simples presas para ursos. Vi, mais de uma vez, inimigos literalmente parados na virada de uma porta ou casa, esperando para te atacar. Pontes caindo, galinhas te atacando, objetos caindo…a Capcom encontrou formas variadas de aniquilar suas esperanças.
E não falo isso reclamando ou achando elementos ruins dentro de Resident Evil 4. Em algumas delas eu até me diverti, principalmente quando você passa a usar isso como uma vantagem contra Los Iluminados. Citando como um exemplo, amei fazer o nobre senhor da motosserra pisar e ficar preso em uma armadilha para ursos enquanto descarregava os pentes de todas minhas armas nele. Tem várias outras formas de matar os demais, fazendo um amplo uso do cenário ao seu redor.
O problema maior é quando você encara qualquer oponente sem a menor oportunidade de vencer usando a inteligência. Claro que todos possuem suas fraquezas, inclusive os chefões, porém é complicado demais se ver na frente de uma criatura de uns 5 ou 6 metros e saber que será na base do tiro. Vou conseguir? Diz a lenda que sim. Amedronta e dá uma pontada de desespero? Isso com toda a certeza do universo.
Ainda que siga a mesma estrutura, todos estes elementos diversificam bem mais o que foi visto no passado e traz uma verdadeira aula de como transformar franquias sem tirar o fator diversão delas e nem se perder no meio. O que FF7 Remake mudou muitas coisas e aprimorou, RE4 fez o exato oposto mantendo sua qualidade e chegando ao mesmo resultado. E nenhum dos dois está errado, já que são os jogadores que saem ganhando.
Nada neste mundo é perfeito
Acalmem-se, eu não vim acabar com os seus maiores sonhos e te impedir de pular de cabeça em Resident Evil 4. No entanto, não podemos passar por aqui sem citar algumas falhas que o título apresenta no geral. Eu passei por sufoco com algumas delas, inclusive, que me fizeram pensar se devia prosseguir com a experiência – mesmo que ela fosse excelente em seu objetivo principal.
Em uma delas o título simplesmente voltou para a tela inicial do PS5 e mais de uma vez na mesma partida. Dos quatro dias que passei jogando ele por completo, isso ocorreu em apenas um deles e não voltou a se repetir nos trechos finais para mim. Porém, foi uma grande dor de cabeça e em uma delas eu perdi uma parte do meu progresso, me obrigando a passar por um trecho complexo mais de uma vez.
Além disso, foi mais de uma vez que pude ver oponentes e até animais com suas partes desaparecendo pelas paredes ou escadas. Isso vai me fazer reduzir bruscamente a nota dele neste review? Não, podem respirar tranquilamente. Só me fez perceber que essas coisas estão se repetindo por toda a indústria de games e nem mesmo as primeiras atualizações são capazes de consertar este tipo de erros. Não é como RE3 que tinha apenas 4h de conteúdo, mas ainda assim poderia haver uma dedicação maior com o tempo que levaram para trazê-lo à vida.
E tem algo em Resident Evil 4 que não culpo a localização, pois acredito que tenha sido algo que está presente na versão original também: é impressão minha ou a Ashley está com o fôlego de uma fumante? Pode anotar, você dá uma guinada com o Leon, ela vem atrás e duas pedaladas já começa a ouvir a coitada ofegando como se tivesse corrido uma maratona. Sim, ela é uma dondoca e a filha do presidente. Pode ser sedentária também. No entanto, em quesito auditivo, é extremamente angustiante. Isso sem citar os constantes gemidos e sons “sugestivos” no meio da ação.
Sendo muito sincero com vocês, como eu disse acima, apenas o abrupto fechamento do jogo no PlayStation 5 me causou um transtorno de fato. Os demais são incômodos – sejam visuais ou de áudio, que acabam sendo ignorados conforme você faz progresso. Não acho que sejam tão relevantes assim, mas quais sei que muita gente vai apontar como uma das coisas que pode ter irritado enquanto jogavam.
De resto, pode mergulhar diretamente em mais este remake da Capcom que não só vale a pena como é inquestionável a sua importância dentro deste nicho atualmente. Não vai ter erro, pode adquirir Resident Evil 4 que o arrependimento vai beirar ao zero. E isso é multiplicado caso não teve como jogá-lo no passado, se tornando essencial para ver o ápice de uma franquia que estava cada vez mais distante destes “dias dourados”.