O vento sopra calmamente, balançando as folhas nas árvores. Um grupo de ninjas patrulha a área prestando atenção em todo e qualquer movimento que possa vir de dentro da mata. Mas mesmo isto não é o suficiente, assim como uma tempestade, a Lâmina do Dragão corta os corpos, lançando quantidades absurdas de sangue e membros em todas as direções imagináveis. Este é o jeito de matar de Ryu Hayabusa, o mais memorável ninja dos consoles que agora está de volta com Ninja Gaiden: Master Collection.
Dark Souls é difícil? Pode até ser, mas não chega aos pés de Ninja Gaiden, uma série que vai punir qualquer um dos menores erros seus. A série que retornou no Xbox clássico infelizmente não teve toda a explosão de popularidade que Tomonobu Itagaki esperava, mas com toda certeza deixou a marca de ser um dos jogos mais difíceis da sexta e sétima gerações de consoles, principalmente na sua casa original, a Microsoft e seu Xbox. No entanto, como os códigos de Black e o segundo original foram perdidos, ficamos com as versões Sigma.
Ninja Gaiden Sigma
Essa é a primeira iteração da série na nova geração de consoles do ano de 2007. Aqui acompanhamos Ryu ainda nos seus jovens anos como ninja, treinando em uma missão com Murai, um mestre de outro clã. Enquanto conversa com Murai, Ryu descobre que sua vila está sob ataque e retorna apenas para descobrir uma entidade conhecida como Doku roubando a Lâmina do Dragão Negro, uma poderosa arma protegida pela clã Hayabusa.
Com a vila em ruínas e o mundo à beira do ressurgimento de um herdeiro do Dragão Negro, resta a Ryu ir atrás da lâmina. Durante sua jornada ele irá conhecer Rachel, uma caçadora de demônios que irá ajudá-lo em sua jornada, enquanto busca derrotar sua própria irmã Alma nas terras do fictício Reino de Vigoor, local onde uma misteriosa figura orquestra todos os envolvidos nos eventos ligados à Lâmina do Dragão negro e o futuro do jovem Ryu.
A versão Sigma de Ninja Gaiden é o segundo título alternativo do jogo, sendo o primeiro o melhor e mais desafiador Ninja Gaiden Black. Sigma incorpora muito de seu predecessor mais hardcore, mas também abre mão de muitos elementos, com a retirada de roupas alternativas, os jogos de SNES disponíveis e alterando várias áreas, o que em contrapartida é realmente bom, criando um balanço entre clássico e alternativo.
Grandes mudanças como cenas adicionais e novas áreas de combate quebram a mesmice e o que se espera vindo direto do original. Novas cenas contextualizam melhor Doku, o antagonista inicial do game, tornando o jogo uma excelente porta de entrada para novos jogadores. Mas não se engane, mesmo sendo mais fácil que Ninja Gaiden e Ninja Gaiden Black, Sigma ainda irá fazer com que você se esforce para poder ser excelente no jogo. Afinal de contas, ele ainda leva o título de Ninja Gaiden.
Mesmo com estas inúmeras diferenças ainda existem segmentos de backtrack que são ridículos, como a área da fábrica e sua chave da sala de controle. Mas um exemplo de mudança para o melhor é a retirada da área de contêiners do dirigível, local onde a mecânica de plataforma do jogo funcionava de maneira detestável, e agora é uma grande arena de luta e violência que desafia e recompensa o jogador caso ele consiga aguentar até o final.
As batalhas continuam a seguir o mesmo estilo. Cada inimigo de Ninja Gaiden possui uma artimanha para ser derrotado: uma vez que a tenha descoberto, tudo fica mais simples. Sigma possui a adição de novos inimigos como os insuportáveis peixes fantasma, gatos humanoides e as motocicletas que são detestáveis também, além de inserir os capítulos de Rachel, a caçadora de demônios, algo que eu pessoalmente acho totalmente exaustivo, repetitivo e raso como uma piscina para mosquitos. Não porque a ideia da personagem seja ruim, mas sim por que a mesma é uma boneca que anda e com a personalidade de uma porta.
Os bosses continuam o mesmo padrão repetitivo de combate. Assim como é de se esperar, não tenha expectativa que as inúmeras armas e ninjutsus que Ryu carrega consigo tenham alguma influência no combate real. Os bosses de Ninja Gaiden e Sigma possuem combates genéricos e sem mecânicas avançadas de vantagem e desvantagem contra determinados equipamentos, levando em consideração a capacidade de observar padrões e prever diferenciações nestes padrões.
No entanto, admito que a última luta é realmente muito mais em Sigma do que em sua forma original, transformando a mesma em um combate simples de bosses menos interessantes como Gamov, do que a verdadeira batalha que coloca toda sua habilidade em teste no final. É inferior ao original, mas ainda assim um título interessante para os poucos acostumados com a série, com gráficos que já eram impressionantes para a época ficando ainda mais belos no Playstation 4 Pro.
Ninja Gaiden Sigma 2
Aqui é onde a série realmente deu seu primeira escorregada rumo a “nhaca” de Ninja Gaiden 3. Ninja Gaiden Sigma 2 traz Ryu Hayabusa lutando contra uma ameaça demoníaca ainda maior desta vez. O clã ninja das Aranhas Negras ataca a vila Hayabusa enquanto Ryu resgata uma jovem agente da CIA em Tokyo. Ao chegar na vila, Ryu se depara com seu pai lutando contra o líder do clã rival, Genshin, que se aliou à Rainha do Sangue Carmesim e demônios Elizébet.
Durante o ataque, ambos conseguem por as mãos no artefato conhecido como Estátua Demoníaca, que abre os portões entre o mundo humano e o dos demônios. Agora Ryu deve partir em buscar de impedir uma invasão em grande escala de inúmeros seres demoníacos na terra, lutando contra inimigos novos, antigos e até mesmo a própria Estátua da Liberdade. Uma verdadeira amálgama de ideias.
Jogar Ninja Gaiden Sigma 2 foi uma experiência bem difícil de se ir até o fim, pois o Ninja Gaiden 2 original junto de Splatterhouse foram meus primeiros jogos do Xbox 360. Sigma, por sua vez, é a versão mais fácil de qualquer jogo da série e a mais censurada por sua vez também. Não espere grandes manchas de sangue aqui como em Ninja Gaiden Sigma ou Ninja Gaiden 3: aqui o sangue é bem escasso, a dificuldade é mínima, os itens abundantes e a censura é grande.
Assim como Black, Ninja Gaiden 2 era ridiculamente punitivo, enquanto Sigma 2 adiciona um pouco e retira muito. A grande mudança, como dito anteriormente, é a falta de sangue, e não vou defender gore, afinal este não é o objetivo. Mas em sua versão “vanilla” o sangue era um feedback visual de que o dano causado era legítimo e que você estava indo para algum lugar, assim como os membros decepados e sangue esguichando. Já em Sigma membros decepados desaparecem, e no lugar do sangue esguichar, temos uma fumaça roxa.
Vamos ao que realmente importa: o feeling do game. Diferente de Ninja Gaiden Sigma, Ninja Gaiden Sigma 2 tem seu número de combates realmente diminuído, tanto em número quanto em dificuldade. Áreas que antes eram desafiadoras com vários inimigos agora têm seu número diminuído e se tornam um passeio em linha reta. Claro que os inimigos ainda podem te matar e vão, caso você dê a oportunidade, mas no geral é como jogar o original em easy ou até mesmo very easy.
Outra vez temos a adição de outros episódios que não controlamos Ryu, desta vez com mais personagens, sendo elas Rachel, Ayane e Momiji. Mais uma vez as mesmas estão aqui apenas para mostrar sua coxas e seios, porque importância e relevância não existem, e apenas nos lembram como queríamos estar jogando com Ryu. As adições e tweaks trabalham em desfavor de Ninja Gaiden Sigma 2, retirando os inimigos e encontros que faziam o jogador se sentir um verdadeiro Ninja, em favor de fan-service e peixes fantasmas, mais uma vez.
Alguns bosses retornam nesta versão numa tacada de mestre, como a volta de Marbus e o Dragão Negro que acompanha Quetzalcoatl. No entanto, a retirada dos Ninjas Aranhas Demônios como inimigos comuns após a primeira luta de boss deles acaba abaixando bastante a diversidade de combates. Diversidade esta que mais uma vez não tira vantagem das ferramentas proporcionadas pelo jogo, sendo impossível mestrar uma arma direto até o final, já que o upgrade das mesmas é “capado” até o fim do jogo, por assim dizer.
Genshin, que deveria ser o Akuma Ninja Gaiden ou Doku de Ninja Gaiden Sigma 2, é uma piada, tendo seus specs diminuídos, sendo possível combar infinitamente o mesmo em um Izuna Vortex e finalizá-lo com um Izuna Drop. No fim do dia, Ninja Gaiden Sigma 2 é uma excelente porta de entrada para a série e não irá fazer o jogador querer estraçalhar o controle em setecentos pedaços. Mas para aquele afim de um desafio totalmente punitivo e masoquista, recomendo Ninja Gaiden 2.
Ninja Gaiden 3: Razor’s Edge
Aqui estamos nós, no título que pegou o dragão pelo colarinho e lançou-o rumo ao esquecimento, caindo de cabeça na sarjeta e indo parar ao lado de Gex de PS1. Seguindo o passo dos games da geração, Ninja Gaiden 3: Razor’s Edge deixa gameplay de lado e foca imensamente em narrativa. Aqui Ryu é procurado pelo governo japonês e é convencido por eles a agir contra uma organização chamada LOA, ou League of Alchemists.
Enquanto luta com o líder deles, o mesmo amaldiçoa Ryu com uma magia chamada Aperto da Morte, fazendo com que a Lâmina do Dragão se funda com o braço de Ryu. A maldição fará com que o corpo de Ryu seja corrompido pela fúria e rancor daqueles mortos pela lâmina da espada, implementando um novo sistema de fases no jogo, no qual Ryu entra em um universo dentro da maldição e precisa matar novamente aqueles que já havia matado no passado e presente.
No quesito gameplay e combate, Ninja Gaiden 3: Razor’s Edge é mais desafiador, mas em parte mais arrastado, seguindo a filosofia de batalhas estilo God of War e DMC, onde certas áreas receberão ondas atrás de ondas de inimigos, diferente dos títulos anteriores onde cada área já possui um número finito de inimigos. No entanto, o combate está mais punitivo, retirando as janelas de invencibilidade garantidas através do essence charge. Então é uma versão revitalizada de Black, mas com visão diferente e mais voltada para a época que fora lançado.
Como dito anteriormente, o grande diferencial do terceiro título é seu foco em história e uso de quick time events. A história tenta fazer com que o jogador tenha essa introspecção de que Ryu é uma máquina assassina, que já ceifou inúmeras vidas, sejam elas humanas ou demoníacas. Acho que é uma visão interessante para um game do gênero, como Neverdead foi com sua narrativa na época. Mas aqui acaba entrando em conflito com jogos anteriores e a maneira como foi enxertado acaba fazendo com que a história fique um pouco fraca.
A presença de armadilhas e quick time events acaba tornando o jogo um pouco repetitivo e cansativo, ao invés de desafiador, como inimigos com bazucas do outro lado de paredes de correr, inimigos escondidos em locais muito difíceis de se esquivar. Os bosses também usam e abusam dessa mecânica de QTE, o que os torna suscetíveis a derrotas absolutas através do button mashing, o que tira muito do desafio de sofrer uma reviravolta.
Ninja Gaiden e o ano de 2021
Este foi um “catadão” básico e uma análise por cima do que esperar de cada título, mas como a coleção se sai nos dias atuais? Bom, Ninja Gaiden Sigma e Sigma 2, mesmo sendo versões mais fáceis de seus respectivos jogos, ainda apresentam desafios que vão fazer o jogador ralar. Caso o jogador dê abertura, uma bomba, um agarrão, ou até mesmo um agarrão suicida o espera, e mesmo em números menores os inimigos irão combar Ryu e reduzir a sua vida a zero.
O jogo roda a 60 FPS liso no PS4 Pro, o que torna Ninja Gaiden Sigma 2 bem melhor, evitando que batalhas contra os lobisomens, por exemplo, tenham novamente as quedas abismais de FPS do passado. Os games trazem todos o Hero Mode, implementando originalmente em Ninja Gaiden 3, que permite que Ryu desvie e defenda-se sozinho de projéteis e tenha ninpos infinitos quando com pouca vida. Uma boa alternativa para jogadores mais casuais, afinal nem todo mundo precisa ser sadicamente masoquista como aquele que vos escreve.
Os capítulos extras em que Ryu não está presente acabam sendo mais como fillers do que algo realmente importante para a história, podendo ter ficado como um modo extra opcional, dando foco apenas a missão do mestre dragão. Ninja Gaiden: Master Collection, é uma excelente entrada da série nos tempos atuais, mesmo que eu gostasse que fossem os originais? No entanto, entendo que a série Sigma e Razor’s Edge também tem seus charmes trazendo conteúdo adicional e combates mais equilibrados em muitas vezes, mas ainda assim alguns bem fracos e até mesmo deixando a evolução do jogador de lado.