Iniciar este texto com “comecei jogando Atari” entrega muito a idade. Mas foi assim que tudo começou, durante o Natal de 1986. Como os videogames eram muito caros no Brasil (muito mais do que hoje em dia, acredite), era comum a criançada começar na geração passada. Afinal, o Nintendinho já havia sido lançado um ano antes. E olha que levei tempo pra sair do Atari, pulando para o Master System só em 1989 graças ao lançamento brasileiro pela Tectoy.
No Atari eu pude jogar os games da Namcot (como era chamada antigamente) que faziam sucesso nos fliperamas, como Dig Dug, Galaxian e Pac-Man. Levou um tempo para meus pais me acompanharem nos arcades, onde tive a oportunidade de conhecer Galaga e Xevious. Mas foi só com o surgimento dos emuladores que consegui jogar os outros games da desenvolvedora japonesa. Eis que agora, mais de três décadas depois, somos agraciados com o lançamento da coleção Namco Museum Archives, dividida em dois volumes que totalizam 22 jogos – dois deles inéditos, criados exclusivamente para a coleção.
Volume 1 e a reimaginação de Pac-Man
Começando por Namco Museum Archives Vol 1, esta coleção inclui os jogos Galaxian, Xevious, Mappy, Dragon Buster, Pac-Man, Pac-Man Championship Edition, Dig-Dug, The Tower of Druaga, Sky Kid, Dragon Spirit: The New Legend e Splatterhouse: Wanpaku Graffiti. A interface da emulação é bastante amistosa, seguindo o exemplo do NES e SNES Classic Edition. Até a trilha de fundo lembra a dos mini consoles da Nintendo, com música 8-bit que gruda na cabeça.
A navegação entre os jogos ocorre horizontalmente, inclusive apresentando um trecho de gameplay de cada um. Lembra bastante o RetroPie, para quem está familiarizado com a customização do Raspberry Pi. Ao selecionar o game, você acessa uma segunda tela que traz uma breve descrição do jogo e uma opção para visualizar o mapeamento do controle – alguns bem simples, outros com opção de “fogo rápido” (turbo).
Todos os jogos contam com opção para salvar/carregar a qualquer momento (4 slots por título) e a função rebobinar, que permite desfazer os erros do jogador. Mas ao invés de fazer isso em tempo real ou mostrar mini telas que representam segundos (como nos jogos de NES e SNES do Nintendo Switch Online), aqui você volta no tempo às cegas. Este recurso pode ser usado várias vezes, mas você nunca sabe exatamente em que ponto voltará, muitas vezes não te ajudando como deveria.
Quanto aos jogos, são todos bem simples mas muito importantes para a evolução dos videogames. Galaxian (1984) é um concorrente de Space Invaders, com ideias próprias e mais difícil. Pac-Man (1984) dispensa apresentações. Já Pac-Man Championship Edition é um novo jogo, uma reimaginação 8-bit inspirada de leve na versão DX+, com o mesmo ritmo frenético mas com tela na proporção 4:3.
Xevious (1984) é um dos primeiros jogos de navinha com movimentação na vertical, com tiros e torpedos para atingir alvos terrestres, além de bases inimigas que funcionam como chefões. Mappy (1984) é um jogo de gato e rato em que você é o rato e, para passar de fase, precisar pegar todos os queijos da fase – inclusive usando itens para criar distrações ou atrapalhar seus adversários.
Dig Dug (1985), um dos meus favoritos, é um jogo de escavação em que o personagem usa um arpão para inflar e explodir os inimigos. É o primeiro jogo a fazer a música seguir a movimentação do personagem. The Tower of Druaga (1985) é um jogo de ação com labirintos, inimigos e chaves para encontrar e abrir portas para subir os níveis da torre. Sky Kid (1986) é um game infantil de avião com missões e área de pouso ao final de cada fase. Dragon Buster (1987) é um jogo de aventura em que você escolhe caminhos e enfrenta vários chefes até chegar no dragão. Ao vencê-lo, começa uma nova rodada com mais fases e chefes.
Dragon Spirit: The New Legend (1990) é o sucessor espiritual de Xevious, com um dragão no lugar da navinha. Além do visual mais bonito, o jogo introduz power ups com tiros diferentes, barra de energia e chefões. Por fim temos Splatterhouse: Wanpaku Graffiti (1989), o único jogo japonês do Vol 1 e inédito no ocidente, sendo uma versão cartunesca e humorada da franquia demoníaca da Namco. Um game de plataforma desafiador, mas que compensa pelos confrontos com chefões nada convencionais. Rola até referência a “Thriller”, de Michael Jackson, logo no primeiro chefe.
Volume 2 e o inédito Gaplus
O segundo volume inclui Galaga, Battle City, Pac-Land, Dig Dug II, Super Xevious, Mappy-Land, Legacy of the Wizard, Rolling Thunder, Dragon Buster II, Mendel Palace e Gaplus. A interface de seleção de jogos segue a mesma do Volume 1, apenas com uma leve diferença na trilha sonora de fundo.
Galaga (1985) é uma versão evoluída de Galaxian, com inimigos que se deslocam mais pela tela. Battle City (1985) é um jogo de tanques em que você deve derrotar os adversários e defender a bandeira da sua base. Pac-Land (1985) é o primeiro Pac-Man de plataforma e, bem, é uma porcaria. A movimentação ocorre usando botões e você pula usando o analógico. Tudo errado! Já Dig Dug II (1986) migra da caverna pra uma ilha que muda de formato a cada fase. O “Dig” deixa de fazer sentido com a nova perspectiva e, bem, não é tão legal quanto o primeiro game.
Super Xevious (1986) é outro game japonês que chega pela primeira vez ao ocidente. Não é muito diferente do primeiro, mas vale pela curiosidade. Mappy-Land (1986) segue a base do game original, adicionando fases temáticas bem coloridas e mais itens para usar. Legacy of the Wizard (1987) é um importante RPG de ação não-linear que serviu de base para o conceito de mundo aberto que conhecemos hoje em dia, inclusive combinando elementos de gameplay que depois se tornaria o gênero “Metroidvania”.
Rolling Thunder (1989) é um divertido e desafiador side-scrolling shooter no qual você encara diversos inimigos a rodo. Você se esconde em portas e, da mesma maneira, recupera munição para avançar pelas fases. Dragon Buster II (1989) é mais um jogo japonês chegando pela primeira vez ao ocidente, e bem diferente do primeiro jogo. O RPG de ação possui visão isométrica, com o cenário sendo revelado aos poucos durante a exploração, e o gameplay permite ricochetear suas flechas usando as paredes. Bastante ousado para sua época e com boa duração.
Mendel Palace (1989) é um jogo de ação e quebra-cabeça em que você aciona painéis pelo chão para usar power-ups e empurrar os oponentes para fora da arena. Um clássico da Game Freak, desenvolvedora japonesa mais conhecida pelos jogos da franquia Pokémon. A lista termina com Gaplus, criado exclusivamente para o Namco Museum Archives Vol 2, sendo uma sequência 8-bit de Galaga. É bem mais rápido, com maior variedade de inimigos e tipos de disparo para somar às naves de suporte.
Namco Museum Archives Vol 1 & 2 é uma boa pedida para os fãs de retro gaming, que jogaram alguns destes clássicos na época. Sendo sincero não é todo game que presta, ainda mais pelo fato de não termos aqui as melhores versões de cada título – são todos port da versão de NES – mas a inclusão dos dois novos games, Pac-Man Championship Edition e Gaplus, já valem o investimento. Só ficou faltando os manuais digitalizados de cada game, para ensinar como jogar. Mendel Palace é um destes que, de cara, não dá pra entender como funciona. Fora isso, a B.B. Studio e a M2 estão de parabéns!