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Imagine que você, um jovem verde e sem nenhuma experiência no mercado de trabalho, consiga um estágio na maior empresa do pedaço. Só que tem um porém: você não vai ganhar um centavo, mas ao menos terá uma chance de ser efetivado e trabalhar no lugar mais legal do mundo.

O que você não esperava é que esse emprego dos sonhos logo vira pesadelo, pois para não desagradar seu chefe, você terá que ir até os porões da empresa enfrentar uma legião de monstros que vivem lá. Essa é a premissa maluca de Going Under, um dungeon crawler que tira muito sarro das culturas tóxicas do mercado de trabalho e ainda consegue ser divertido e muito viciante.

É tudo culpa do estagiário

Em Going Under controlamos Jackeline Fiasco (o sobrenome claramente não foi intencional, mas em português contextualizou perfeitamente), a nova estagiária de marketing de uma startup de bebidas chamada Frizzle. Mesmo aceitando trabalhar sem pagamento, seu chefe não está nem um pouco interessado em parar de explorá-la e manda ela limpar os porões do prédio eliminando os monstros que vivem por lá – esses que são ex-funcionários de startups falidas. Sempre sob a promessa de uma efetivação, Jackeline acaba fazendo tudo que mandam e é aqui que começa a nossa jornada de dor e sofrimento no escritório.

Mais marketing e menos assassinatos, por favor.

O humor do jogo é muito ácido e no ponto certo, garantindo boas risadas para aqueles que tem alguma familiaridade com rotina de escritório. Os funcionários da Frizzle são muito caricatos e ainda mais estereotipados, então todos os diálogos são recheados de piadinhas, frases de efeito do mundo corporativo, termos usados em redes sociais e, principalmente, uma boa crítica social focada em toda a exploração que milhões de pessoas sofrem no ambiente de trabalho – só que tudo tratado com muita leveza.

Ainda que os personagens não sejam muito expressivos, o visual de desenho animado foi um fator decisivo na construção da personalidade deste título. Tudo é extremamente colorido, não só os cenários como também os personagens, com cores quentes e muito saturadas. Esse show de cores ajuda a amenizar um pouco as críticas abordadas e a enfatizar todo o seu tom satírico, afinal, estamos vendo ali uma sátira da vida real que infelizmente é a nossa realidade, mas ali parece ser tudo engraçadinho e até divertido.

Aqui podemos explorar o escritório livremente e conversar com nossos colegas de trabalho. Conforme avançamos, esse cenário vai adquirindo cada vez mais uma áurea de safe house, onde é possível pegar sidequests, comprar itens e nos preparar melhor para o que está por vir. Porém, em Going Under nosso trabalho não é no escritório e sim no subsolo.

Por mais jogos que tenham cachorros salsichas.

Dedetizando a firma 

O jogo dispões de três dungeons diferentes para serem desbravadas, cada uma tematizada com um tipo de empresa: trabalhadores terceirizados, um site de namoro e criptomoedas. A única grande diferença é a cor dos cenários e os inimigos, pois o resto é praticamente a mesma coisa. O level design não é nada de outro mundo e segue praticamente o mesmo do início ao fim, então sempre parece que você está explorando a mesma dungeon.

Going Under possui alguns elementos de roguelike, então ao longo da nossa passagem pelas dungeons podemos ir adquirindo perks que desbloqueiam certos benefícios, mas perdemos todos quando morremos. Porém, quanto mais jogamos, mais XP se acumula em cada uma dessas habilidades, chegando em um ponto em que as adquirimos permanentemente e podemos escolher com qual vamos começar.

Toca musiquinha de drift em Tokyo.

As mecânicas são as mais básicas possíveis: bater, rolar (para esquivar) e arremessar coisas, mas tudo é muito travado e é fácil se perder nos controles. Isso me pareceu ser intencional, já que alguns perks podem melhorar certos aspectos disso, mas é bem frustrante não conseguir fazer coisas simples como carregar um ataque ou rolar na hora certa. De tudo isso, o que mais me incomodou é o fato da personagem ser muito lenta, tanto para andar quanto para atacar, o que vai te prejudicar bastante – mas existe um perk que te deixa mais rápido, então tudo faz parte do desafio proposto pelo jogo.

A parte boa é que tudo isso é ofuscado pelo combate, que é um dos pontos mais fortes deste título. Absolutamente qualquer coisa em Going Under pode virar uma arma: vasos, vassouras, computadores, caixas ou qualquer outro item que estiver largado pelo cenário. Não só isso, cada um possui suas próprias características, então além do dano mudar, o ataque em área também muda, alguns são mais pesados que outros e existem aqueles que só podem ser usados à distância.

Graças a essa grande variedade de armas, o jogo exige uma rápida adaptação por parte do jogador, pois elas quebram e não dá para usar a mesma do início ao fim. É claro que, conforme avançamos, os inimigos vão ficando mais fortes, então fazer bom uso das armas é essencial para sobreviver até o final – pois acredite, a dificuldade é um pouquinho amarga e o menor deslize pode custar aquela jogada.

Aquele momento que nem todas as armas do mundo te salvam…

Pode levar um tempo para conseguir concluir essas três dungeons principais, mas uma vez que você conseguir, não tem muito o que fazer depois. Se for colocar na ponta do lápis, o jogo é curto e peca na variedade de dungeons, mas por outro lado, ele também é infinito e foi feito para jogarmos as mesmas dungeons incontáveis vezes. No final, a campanha acaba sendo o suficiente para nos divertimos naquele mundo antes de começar a ficar enjoativo.

Going Under é aquele tipo de jogo que a gente não espera nada, mas no final saímos com um sorrisão no rosto. Apesar dos pesares no level design e nas mecânicas, tudo nele é incrível e mais do que aparenta ser. Garanto para você que essa será uma das melhores experiências não remuneradas da sua vida.

Review – Space Architect

Paulo AlmeidaPaulo Almeida24/11/2024