“Pode-se dizer que a seleção natural realiza seu escrutínio dia a dia, hora a hora, de qualquer variação; rejeitando aquelas que são ruins e preservando e fazendo prosperar todas as que são boas; trabalhando onde e quando surgir a oportunidade na melhora de cada ser orgânico em relação a suas condições orgânicas e inorgânicas de vida.”
Charles Darwin
Espécies se acumulam ao redor de um lago límpido no meio de uma savana. Variações de herbívoros residentes próximos ao local aglomeram-se para aproveitar dos resultados da última estação chuvosa, podendo sorver tranquilamente dos frutos da natureza e da água fresca, combatendo o calor ferrenho do meio-dia.
A paisagem é calma e aconchegante. O silêncio impera. Ao fundo, espreita uma alcateia de carnívoros aproximando-se lentamente, buscando não alertar aos outros. De um instante a outro, a visão se altera. A calmaria dos herbívoros é substituída pelo banho de sangue e a correria. Tumulto, agressividade, desespero, alimentação. Essa é a vida na natureza.
Evolution é a adaptação do jogo de tabuleiro homônimo lançado pela North Star Games em 2014. A versão digital, em uma raridade, é desenvolvida pela própria North Star, em sua subdivisão North Star Digital Studios e publicada pela mesma. Esta comunhão de forças pode ser muito bem percebida, como vou descrever para vocês.
Do the evolution!
A vida não é fácil nas selvas africanas. Os grandes pontos de encontro dos rolézinhos animalescos são os lagos e poços de águas frescas – e é lá mesmo que o bicho pega (com o perdão do trocadalho do carilho), neste ambiente agressivo e de crescimento que ocorre a maravilha da evolução das espécies.
Em uma bela transcrição de como funciona o jogo de tabuleiro, Evolution trabalha em turnos, permitindo que você escolha seus alimentos dentre o montante presente. Como vimos nos documentários que todos nós assistimos em algum momento de nossas vidas, o objetivo de uma comunidade é crescer e fortalecer seus membros. Assim o jogo nos propõe.
Iniciamos em cada uma das partidas com um herbívoro pequeno, a base padrão, com três espaços para upgrades. A cada turno recebemos um conjunto de cartas com características evolutivas, desde aprender a cooperar com outros da mesma espécie até ter pescoços mais longos ou a capacidade de forragear, procurando mais comida entre galhos e folhas no chão.
Com o início de mais uma rodada, escolhemos uma das cartas para definir quantos vegetais vamos colocar disponíveis para o todo, como também escolhem cada um dos outros jogadores. Essa soma que define a quantidade de alimentos para os animais herbívoros, o que acaba por ser responsável pela sobrevivência ou morte destas espécies. Uma vez posta a comida no lago, chega a hora da evolução começar.
Considerando a variabilidade da natureza, existem algumas opções sobre como usar nossas cartinhas de evolução. Como disse anteriormente, existem três espaços para novas características, mas, além disso, ainda podemos gastar uma carta, seja para aumentar o tamanho do animal, tornando-o mais resistente a predadores, seja também para aumentar a população, porém necessitando de mais alimento. O balanceamento entre o melhoramento das características com o tamanho e a quantidade são essenciais para garantir a sobrevivência, enquanto gera mais pontos para o jogador.
Falando em predadores, chega a reviravolta na vida pacífica de Evolution. Uma das cartas traz a opção de tornar seu animal herbívoro em um carnívoro, deixando de se alimentar do que foi colocado no lago no início do turno e passando a comer os outros animais do mapa. Aí que a brincadeira começa de verdade.
Se quando está com um herbívoro é necessário contar com o que o campo te oferece, quando um carnívoro entra no jogo a corrida se volta para ser maior e mais agressiva que os vizinhos. A alimentação dos carnívoros consiste em remover um contador de população de um herbívoro escolhido que seja de um tamanho menor que o seu. Atentem-se que não citei se precisa ser um animal do adversário ou seu.
Para garantir sua sobrevivência como um “pacífico” herbívoro, você terá que se utilizar de todas as ferramentas, seja aumentar o tamanho da sua espécie, trabalhar em manadas, aprender a viver acima das árvores ou até desenvolver carapaças. O que fizer os malditos carnívoros sumirem.
Deve ser dito aqui que os conceitos científicos por trás das mecânicas do jogo são absolutamente coerentes e não agridem em nada o que deveria ser ensinado nas escolas por este mundão afora. Neste ponto, com certeza, os desenvolvedores ganham uma estrelinha no caderno.
Passarinho digivolve para Passaralho!
A vida na selva definitivamente não é nada fácil. Ainda bem que, para facilitar a nossa vida, podemos aprender desde pequenos, já que Evolution oferece uma campanha de 24 níveis. Isso oferece uma curva de aprendizado bem generosa, apesar de algumas amarras de tutoriais um pouco fortes.
Os visuais do jogo são muito bem feitos, com ilustrações muito detalhadas, realistas e compatíveis com o ponto no qual estão sendo usados. O único ponto é que todas essas ilustrações ridiculamente bem trabalhadas são do jogo de tabuleiro, então ponto para eles, mas não para a versão digital.
Aliás, Evolution é um bom jogo. Também é um bom jogo de tabuleiro. Porém, para a minha pessoinha, este é o grande problema. Evolution: The Video Game se vende como algo novo, como dito pela própria página da Steam. Mas vi uma transcrição absoluta do que vi na mesa sendo exibida na tela. Ipsis litteris.
Não que estejam errados em transcrever absolutamente o que se tem na mesa para o computador. Mas, se vai fazer isso, não se venda como algo totalmente novo e incrível. É bom, e só. A falta da interação e da companhia dos amigos acaba por deixar a experiência monótona relativamente rápido.
Em resumo, Evolution é um bom jogo, mas tal qual uma adaptação do Zack Snyder. Não é nada mais que uma transcrição simples e direta do que é visto em outra mídia – talvez muito melhor por ser a fonte, o produto original. Porém, volto a dizer, um bom jogo.