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Review – Bramble: The Mountain King
Uma descida perturbadora aos porões dos contos de fada e os mitos nórdicos

A Idade Média não é chamada de Idade das Trevas por acaso… com quase zero conhecimento científico, doenças levando pessoas sem explicação e crendices assaltando o cotidiano, a sociedade desenvolveu um folclore de puro horror. Esqueça as versões adocicadas de Grimm que chegaram até você pela Disney. O coração das trevas guarda pesadelos devastadores e Bramble: The Mountain King não tem o menor pudor de escancarar a porta desse porão.
Sem medo de estar exagerando, a obra da Dimfrost Studio é possivelmente o título mais perturbador, mais pesado e incômodo que já experimentei, uma jornada de agonia e sofrimento pelo lado mais sombrio dos contos de fada. É Limbo em três dimensões, é Little Nightmares elevado ao cubo, uma experiência que me deu intenso alívio de emergir do outro lado, são, mas não intacto.
Era uma vez duas crianças…
Olle acorda no meio da noite em sua casa e percebe que sua irmã mais velha não está na cama. Movido pela curiosidade, o pequeno e inocente Olle pula a janela e se embrenha na floresta próxima, onde encontra a menina desaparecida e uma estranha pedra brilhante, que parece ter propriedades mágicas. É o gatilho para essa dupla atravessar a barreira que separa o mundo físico do mundo oculto de Bramble: The Mountain King.

A viagem se inicia de forma pueril e mágica. Somos brindados com cores exuberantes e cenários convidativos, uma dádiva concedida pelo bom uso do motor gráfico e pela dedicação de seus artífices, que lotaram cada mapa com miríades de detalhes. O resultado é um jogo tão belo que era impossível não parar e capturar uma nova tela a cada cinco minutos. Tanta beleza também exige processamento gráfico, mas minha obsoleta RTX 2060 deu conta do recado, sem nenhuma perda perceptível de performance.
Esse colírio para os olhos é complementado com situações inusitadas e personagens fofos pelo caminho. Tudo é festa e alegria, até a página 2. Daí pra frente, Bramble: The Mountain King vai puxar o jogador pela perna e arrastar para a escuridão, indiferente a seus gritos.
Proibido para menores
Não é spoiler: o jogo apresenta um alerta de temas fortes logo na sua abertura. A Dimfrost Studio não brinca em serviço, então prepare-se para ver violência extrema e gráfica, fartas quantidades de sangue e carne exposta, brutalidade contra animais, brutalidade contra crianças (inclusive bebês), suicídio, genocídio e horror psicológico de todos os tipos. Não é um título para qualquer um, exige estômago e um bom banho depois de determinadas sequências.

Vi e fiz coisas que não devem ser mencionadas. Em respeito aos desavisados, as piores fotografias não serão publicadas. Descubra por sua conta e risco jogando Bramble: The Mountain King.
Entendo que essa seja justamente a proposta do jogo: chocar. Felizmente, não é o choque pelo choque, não existe uma gratuidade no que é exibido ou um prazer sádico nesses segmentos (que são quase a totalidade do jogo). A desenvolvedora amarra tudo isso em uma mensagem brutal, mas necessária.
Esse é um resgate histórico de contos e mitos nórdicos em sua versão original, sem séculos de suavização adquirida em outras adaptações. Essas eram histórias criadas para assustar, para impor o medo nas crianças para que elas se comportassem ou para perpetuar a sensação de insegurança de uma realidade oprimida e sufocante, sem perspectiva de melhora.

Ao mesmo tempo, o título toca em conceitos de paganismo e religiões primitivas, ainda que sem emitir juízo de valor. Ora as bruxas aparecem como abominações, ora aparecem como vítimas, ora como salvadoras e o nosso já não tão inocente assim Olle terá que realizar um ritual ou dois para seguir seu caminho. Curiosamente, o jogo se apropria da iconografia estabelecida pelo fenômeno cultural Blair Witch como easter-egg.
Aqui e ali, Bramble: The Mountain King nos oferece momentos para respirar. Uma mão amiga pode ser estendida onde menos se espera. Porém, esses instantes fugazes de luz apenas acentuam os horrores que Olle irá ter que enfrentar nessa terra amaldiçoada.
Bramble: The Mountain King quer te matar
De todos os monstros horrendos que irão perseguir Olle, o mais persistente é o ângulo de câmera. É fácil entender que o uso de uma câmera fixa, muitas vezes em posições inconvenientes, seja uma escolha tanto para aumentar o medo quanto para não precisar criar um ambiente 3D em 360º. É um recurso que foi utilizado com sucesso por dezenas de jogos de terror anteriormente. Entretanto, os controles de movimento não são implementados corretamente para acompanhar esses ângulos.

Apesar de encontros assustadores e complexos contra criaturas gigantescas, a principal causa de minha morte foi ir na direção errada. O ângulo da câmera dá a entender que o botão direcional vai trazer o personagem para o caminho certo, mas na verdade o empurra para a morte. Pulos precisos foram errados diversas e diversas vezes por essa falha. É impossível se acostumar ou entender a lógica utilizada, levando a afogamentos, quedas em abismo, desmembramentos e todo tipo de mutilação horrível e desagradável.
Levando-se em consideração que praticamente tudo nesse mundo deseja a morte de Olle, a travessia só se torna mais exaustiva com esse problema. Em sua defesa, a Dimfrost Studio foi bastante generosa com seus checkpoints, colocando pontos de salvamento até mesmo entre as fases de luta contra chefes.
Com um ajuste mais preciso e consistente nos controles, Bramble: The Mountain King poderia ser considerado muito mais fácil do que ele está agora. Certamente, minhas 7 horas e meia na aventura poderiam ter sido reduzidas para 6 horas.

O Horror, o Horror…
Para cada entidade encontrada nessa odisseia de dor, o jogo nos oferece detalhes de sua origem, trágica em sua maioria. É um ciclo de violência infindável, em que vítimas se tornam os próximos algozes. Nem mesmo Olle escapa dessa sina, em um momento que julgo controverso. Com as mãos agora também ensanguentadas, nosso protagonista jamais será o mesmo.
Em contrapartida, existem forças em andamento no jogo que são inerentemente malignas, assim como criaturas que são a mais pura bondade e gratidão.

Para complementar essa experiência, a Dimfrost Studio entrega uma trilha sonora de cair o queixo, formada basicamente por músicas clássicas e folclóricas, com o ocasional vocal feérico. É uma lástima que esse material não esteja disponível fora do jogo.
Bramble: The Mountain King angustia até sua épica conclusão. É um título que eu desejava completar com ardor, não necessariamente para ver o destino de Olle e sua irmã, mas para me libertar de suas amarras. Arrasto-me sem forças para longe dele e agradeço por ter nascido no século XX.
Prós
- Atmosfera extremamente perturbadora
- Trilha sonora impactante
- Gráficos belíssimos
- Culturalmente importante
Contras
- Movimentação quebrada
- Temas pesadíssimos
Nintendo
Review – Born of Bread
Encarne um protagonista feito de pão e salve o mundo das garras do caos

Já houve uma época em que a internet surtou com um jogo em que controlávamos um pão de forma, então acredito que Born of Bread tem potencial de sobra para se tornar um dos títulos favoritos do ano para os amantes de pães. O indie da WildArts Studio tem fortes inspirações em Paper Mario, tanto no visual quanto no gameplay, mas consegue ser autêntico o suficiente para ganhar nossa simpatia de imediato.
Misturando elementos de aventura com RPG, Born of Bread nos coloca em uma jornada repleta de fantasia, personagens carismáticos e um humor bem leve, daqueles que nos tiram umas risadinhas naturalmente. Não é aquele tipo de jogo que chama a atenção logo de cara, mas quanto mais nos aprofundamos naquele mundinho, mais apaixonante ele se torna.
O pãozinho da profecia
O jogo começa quando um grupo de arqueólogos acaba libertando um mal há muito emprisionado, trazendo de volta à vida diversas criaturas sedentas por caos. Ao mesmo tempo, o padeiro real de um certo reino acidentalmente cria um golem de pão após fazer uma receita mágica, trazendo nosso protagonista Loaf para a história. Após serem derrotados por essas figuras misteriosas, a dupla se vê forçada a partir em uma jornada para salvar seu lar e cumprir uma profecia de milhares de anos.

Apesar das grandes semelhanças com Paper Mario, ainda acho que Born of Bread se assemelha muito mais a Super Mario RPG. A história é repleta de diálogos bobos, mas muito bem-humorados, além de contar com personagens cheios de personalidade. É muito divertido acompanhar as interações entre eles – o que pode até surpreender em determinados momentos, já que o jogo também aborda alguns temas mais adultos nas suas entrelinhas.
O visual é inegavelmente semelhante aos jogos do Mario de papel, trazendo um 2.5D que mistura cenários tridimensionais com personagens 2D. Todos os mapas contam com uma profundidade que nos permite explorar diferentes planos, enquanto seus elementos são 3D. Apenas os seres-vivos desse mundo são “feitos de papel”, o que traz um certo charme para o estilo artístico do jogo.

Jogar Born of Bread é como assistir a uma animação interativa, pois ele tem todos os requisitos necessários para nos cativar rapidamente: cores vivas, elementos desenhados a mão, personagens estereotipados e muita descontração. A trilha musical também não fica atrás, coroando esse conjunto com faixas envolventes e dignas de uma clássica história de jornada do herói.
Tudo no seu tempo
Apesar da franquia Paper Mario também contar com um combate estratégico em turnos, as mecânicas vistas em Born of Bread acabam ficando mais próximas de Super Mario RPG, novamente. As batalhas seguem o padrão clássico dos RPGs de turno, mas com algumas diferenças relevantes que tornam o jogo mais original.
Aqui, todo tipo de ataque ou arma possui um timing diferente. Ao acertarmos esse tempo, o golpe sai mais forte e somos recompensados recuperando alguns pontos de ação. Da mesma forma, é possível acertar um timing para se proteger de um ataque inimigo e coisas do gênero. A diferença é que toda variação de ação ofensiva traz um pequeno minigame diferente, que em sua maioria envolve apertar o botão no momento exato ou macetá-lo até encher uma barrinha de poder.

Essas mudanças na dinâmica dos golpes deixa o combate bem mais envolvente e menos automático. Arrisco até a dizer que essa mecânica é até melhor do que a vista em Super Mario RPG, pois lá o timing consiste mais na base da adivinhação e “tentativa e erro”. Aqui, temos total noção do que é necessário fazer para acertar o tempo, bastando apenas se acostumar aos diferentes minigames e Quick Time Events.
Outra particularidade bem interessante desse combate é a possibilidade de fazer streams das batalhas. Aqui, o jogo simula uma live em que espectadores fictícios começarão a comentar seu desempenho e pedir alguns movimentos específicos. Ao satisfazê-los, podemos ganhar alguns bônus no final do confronto, então acaba sendo uma ideia criativa para tornar as batalhas menos repetitivas e mais instigantes.

As habilidades que desbloqueamos em combate também nos serão úteis durante a exploração, pois existem diversos caminhos e áreas que estarão bloqueados de início. Bebendo um pouco da fonte dos metroidvanias, Born of Bread tem sua parcela de backtracking e incentiva os jogadores a revisitar mapas antigos para encontrar itens que ficaram para trás. Nem sempre é recompensador se preocupar com isso, mas é uma boa desculpa para quem quer fazer sua experiência render ainda mais.
Minha única crítica realmente relevante é que o jogo inevitavelmente pode se tornar enjoativo com o tempo, algo que acontece até com Paper Mario, devido à rotina de diálogos, exploração e combate. A campanha não foge muito disso, mas também não falha em nos divertir do início ao fim – ainda que em menor escala mais perto do final. Born of Bread definitivamente é uma das maiores surpresas do ano e mais um título de destaque em meio a um mar de excelentes indies que foram lançados nos últimos meses.
Nintendo
Review – The King of Fighters XIII: Global Match
A SNK trouxe The King of Fighters XIII: Global Match como uma boa mistura entre arcade e modernidade

Enquanto Mortal Kombat e Street Fighter continuam buscando o futuro, The King of Fighters XIII pega suas experiências passadas com carinho para trazer novas sensações ao público que sente falta de um bom e velho jogo de luta arcade 2D.
Na versão “Global Match”, a SNK trouxe como novidades o rollback netcode, expandiu os recursos vistos no lobby e ainda introduziu o modo espectador. E mesmo que você não curta o ambiente online e nem queira investir na carreira de pro player para disputar a EVO, ainda vale os bons tempos de fliperama que ele inspira de volta.

A evolução em The King of Fighters XIII
Para começar, sendo bem honesto com vocês, há muitos anos que meus dedos não ficavam com calo em um jogo de luta. E foi exatamente isso o que ocorreu enquanto testava o novo The King of Fighters XIII: Global Match. A experiência me fez retornar para antes dos anos 2000, quando esse estilo reinava nos consoles e arcades.
É impossível não querer disputar uma partida com cada pessoa que vai te visitar, assim como não vejo a menor chance de escolher um modo que não seja o 3v3 clássico. Há diversas outras opções, como o Time Attack, Survival e até uma galeria para você poder ver todas as artes e filmes disponíveis. Porém, a alegria só vem quando o oponente é derrubado no chão com muito suor.

O elenco é fantástico, assim como a adaptação do seu gameplay para os consoles mais modernos. Apesar de chegar para o PlayStation 4 e Nintendo Switch, eu testei no PS5 e não tenho nada do que reclamar. Os comandos respondem adequadamente, são muito velozes e recria com exatidão a época onde este tipo de experiência era o que mais importava para uma desenvolvedora.
Não estou reclamando dos capítulos mais recentes da SNK, caros leitores. Só queria deixar claro que The King of Fighters XIII: Global Match é a escolha ideal para quem está buscando um bom jogo arcade e sem um apelo gráfico ultra-realista – priorizando o que temos de melhor nos movimentos dos personagens e no rico elenco.

A luta como você esperava
Eu me aventurei bastante por todos os modos e parece que fui transportado diretamente para a época onde jogava Street Fighter Alpha 3, no meu primeiro PlayStation. A grande diferença é que, além dos recursos inéditos que a nova geração pode proporcionar, também temos um número de lutadores bem maior.
Além dos grupos que podem ser selecionados em The King of Fighters XIII: Global Match, também dá para desbloquear alguns lutadores secretos conforme avança nos outros modos. Sim, você não precisará pagar nem R$1 a mais ou esperar por Passes de Temporada. Está tudo lá, dependendo apenas da sua habilidade.
Ele pode não ser o favorito de todos, como é o caso de KOF ’98, mas consegue reunir todos os aspectos positivos da franquia para trazer um gameplay consistente, gráficos aprimorados, cenários belissimos e até mesmo certos ganchos da história que farão o público desejar finalizar o quanto antes. Caso ele esteja em seu radar, não precisa pensar duas vezes e pode investir sem medo de ser feliz.

Imagine como se Guitar Hero se encontrasse com Overcooked e desse origem ao jogo de ritmo mais caótico que já existiu. Super Crazy Rhythm Castle é exatamente este título e chegou aos consoles no finzinho de 2023 para divertir as festas de fim de ano.
Desenvolvido pela Second Impact Games, o lançamento publicado pela Konami aposta na mistura de gêneros e jogabilidade simples, com muita música e cores, para uma aventura que chega após 10 anos de trabalho.

Sem muito sentido para a história, que acaba divertindo pela loucura, nós embarcamos numa aventura por um castelo musical em que o enlouquecido Rei Ferdinand nos espera, pronto para defender sua coroa e acabar com seu dia. Para deter os planos desse maléfico tirano, manter o ritmo dos nossos personagens e salvar diversos NPCs das garras da crueldade, os jogadores precisarão superar os desafios perversos em desafios ritmicos para vencer o Rei no próprio jogo dele.
Realize combos sem perder o Rhythm
Seja jogando sozinho ou com ajuda dos amigos, você utilizará um elenco de personagens malucos em salas com atividades ainda mais insanas para tentar alcançar até três estrelas em cada partida, para avançar até a derradeira batalha contra o malvado Rei. Por mais maluquice que seja, o trabalho da desenvolvedora britânica esbanja carisma e estilo, com muita cor e cuidado ao trabalhar o som e o visual.

Com mais de 30 faixas para você conhecer e desbloquear, cada música oferece a opção de ser jogada com três ou quatro teclas, de acordo com a dificuldade que você desejar, além de estar dentro de um mundinho próprio. Como assim? Imagine a ambientação criada em Psyconauts, mas para apenas uma sala, com atividades tematizadas e a música para ser jogada.
Isso mesmo! Você pode jogar a música, ao melhor estilo Guitar Hero, ou se preocupar em realizar as atividades e ações que a sala impõe, quase como tentativa de atrapalhar o seu desempenho rítmico. Quando isso acontece na companhia de até outros 03 jogadores, Super Crazy Rhythm Castle é um jogo fácil e divertido, porém contar com um NPC no modo single player tornou-se algo realmente desafiador para conquistar a avaliação máxima de três estrelas.
Caos multitarefa
A diversão neste novo jogo da Konami está além da música e ritmo, pois não sabemos o que vamos encontrar em cada andar do castelo, muito menos no desafio temático proposto. Enfrentar uma berinjela gigante que ataca como DJ, jogar como cachorro para coletar ouro, tentar prever qual tecla apertar num pequeno espaço de tempo, limpar a tela para facilitar o jogo, entre outras atividades que precisarão ser intercaladas, sempre mantendo o ritmo e dando sequência ao combo.

O jogo é relativamente curto, já que você pode ficar rejogando apenas as músicas no Music Lab, porém vai oferecer boas risadas com os absurdos e uma trilha sonora agradável, que consegue mesclar muito bem diversos tipos e gêneros musicais.
Esse detalhe ganha ainda mais destaque pelo trabalho da Konami em misturar os temas de Castlevania e Gradius ao catálogo de músicas disponíveis. No fim, Super Crazy Rhythm Castle ocupa um lugar especial por divertir aquela jogatina despretenciosa, principalmente quando você estiver na companhia dos amigos.