Enquanto explorava o mapa, o radar de meu Karakuri apontava a direção do alvo de minha missão. O Presa-Régia precisa ser abatido, pelo bem da vila de Minato e para a minha própria segurança. Há coisas que não devem ser deixadas andando por aí em Wild Hearts e esta é uma delas.
Eu corria sobre as vinhas criadas pelo monstro, pulando e escalando enquanto me aproximava mais do suposto Também usava outros Karakuri, para alcançar lugares mais altos e até mesmo para criar uma tirolesa que me permita atravessar grandes distâncias. Tudo para chegar logo, afinal de contas, as missões tinham apenas 60 minutos. E vai saber quanta canseira eu tomaria do “porquinho”.
Acabou que ele não é um porco pequeno ou de tamanho mediano, como o Roeflor que encarei na última missão principal. Aquilo é o maior javali que eu já encarei na minha carreira dos games e olha que eu já tenho alguns Monster Hunter em meu currículo.
A empolgação e toda a vontade que existia de lutar morreram na primeira encarada. Assim como eu morreria em breve para aquilo. Seria inevitável. No entanto, puxo a espada e encaro ele de volta. Oras, se você está na lama, tem que abraçar o javali…digo, o porco. O combate ia começar e, meus caros leitores, isso será uma das histórias lendárias que carregarei comigo pela experiência que tive com Wild Hearts.
O que diferencia Wild Hearts dos demais
Este é um pequeno exemplo que me vem na mente do que o título oferece, já que tudo o que vi nele é muito maior do que eu esperava. Não desmerecendo a Electronic Arts e a Omega Force, mas fazer um “clone” de Monster Hunter da Capcom não deve ser uma tarefa fácil. No entanto, eles conseguem replicar a fórmula e adicionam camadas que vão surpreender até quem chega cético na caçada.
A maior delas é a inclusão dos Karakuri, ferramentas que misturam o rústico com o tecnológico e te ajudam de diversas maneiras. Você pode construir alguns bloquinhos e escalar por eles, tomando um impulso bacana para subir em locais de difícil acesso. Também dá para construir torres com radar, portões de defesa contra monstros, um pirocóptero e até mesmo um baita de um marretão para macetar as criaturas.
Esse diferencial de Wild Hearts vem muito bem a calhar, principalmente para te livrar de alguns sufocos que passa durante o combate e a exploração. O ambiente não é agradável para a presença humana e a Omega Force deixa isso claríssimo. Tudo que te vê, vai tentar te matar. E você precisa de um trunfo ou dois para sobreviver aos perigos que o território apresenta.
O carisma dos personagens secundários também é outro ponto positivo, já que muitos games nem te convencem que aquelas pessoas são importantes e merecem uma atenção sua. Seja passando tarefas, explicando como as coisas funcionam por lá ou até mesmo te ajudando na forja, eu me surpreendi positivamente com a hospitalidade da maioria das pessoas que atravessam pelo seu caminho – mas não todos, o que também é bom para a trama geral.
Já durante os combates, você tem três opções de movimentos ofensivos, um de escapatória e combinações que podem trazer os Karakuri para as horas decisivas. Conforme você avança, novos equipamentos e até a tecnologia tem novas aplicações que permitem que sempre vá avançando na jogabilidade. A forma como você mata um kemono não é a mesma que você deve encarar a próxima ameaça. E ter novos recursos também te auxiliará nessa tarefa, então leve isso em consideração.
A palavra-chave que te dará vantagem em Wild Hearts é “evolução”. Se aprimorar, conquistar equipamentos mais poderosos e encontrar novas ferramentas para suprir suas necessidades. Estudar fraquezas e forças, montar um plano baseado nos movimentos e golpes que o monstro usa. Tudo isso exerce um papel fundamental para que possa desenvolver as missões com mais chances de sucesso.
Voltando a citar Monster Hunter aqui no review, já adianto que é impossível não comparar ambas as experiências, mas notei que o título da EA é muito mais complexo para você vencer os desafios. Baseado no que vivenciei em MH Rise e no que estive jogando nestes dias com o último lançamento, não dá para chegar às cegas e ter uma chance de vencer. Se não for um jogador exímio, daqueles que mal morrem em Dark Souls e Elden Ring, se prepare para ficar angustiado algumas vezes.
Isso não é necessariamente ruim, para ser bem sincero com vocês. Eu curti o ritmo dos combates, a forma como tive de aprender na marra a confrontar algumas das criaturas e até mesmo a destruição do cenário enquanto lutam ou ele foge. São criaturas virtualmente impressionantes, de uma imponência sem igual. Nada mais justo do que entregarem um confronto que seja memorável em contrapartida.
Um caminho torturante
O que acaba estragando a experiência de Wild Hearts são os fatores que cercam tudo isso e tornam muito do gameplay em ações repetitivas. Vamos colocar da seguinte forma, você morreu duas vezes para um mesmo kemono e aprendeu a enfrentá-lo de forma digna. Poxa, muito legal isso. No entanto, para conseguir uma arma melhor ou uma parte de armadura baseada nele, esteja pronto para fazer isso de novo ao menos por mais 3 ou 4 vezes. No mínimo, diga-se de passagem.
O grinding é extremamente lento e isso acabará desmotivando muita gente. Eu sei e entendo o público que tenha um tempo livre maior do que os demais. No entanto, cada combate destes dura cerca de 30 minutos, isso se você não morrer ou encarar grandes dificuldades. Saber que precisa de aproximadamente 2h para conseguir aquela parte de braço do equipamento que aumenta só 1 ponto de defesa não soa tão atrativo com o passar do tempo. Ao menos quando você não tem o dia inteiro para completar cada uma das ações necessárias e ainda tenta manter a sua hype.
Outro ponto que me deixou mais distante da diversão é o tamanho do mapa x capacidade de locomoção do personagem. Sendo bem sincero, o herói ou heroína principal tem uma lentidão extrema. Você pode correr, mas nunca será o suficiente para chegar em determinados pontos de forma mais ágil. Dá para criar acampamentos para Viagem Rápida, mas quando você precisa reunir itens ou buscar bichos menores o ideal é seguir a pé. Depois de determinado trecho você conquista um “veículo” motorizado, mas até chegar nele é possível que sua paciência já tenha se encerrado.
E falando das torturas de Wild Hearts, inicialmente eu passei por uma situação bem chata que foi o áudio saindo completamente da sincronização com o que estava rolando na tela e uma aceleração instantânea de todos os diálogos de uma determinada cutscene. Tivemos uma atualização recentemente que pode ter corrigido este problema, admito que não voltou a se repetir. No entanto, foi bastante incômodo e eu não sei até agora o que rolou naquele trecho – serei obrigado a ver no YouTube.
Outro ponto é a utilização de algumas armas que são completamente inviáveis no modo single player. Eu entendo que queiram incentivar o online, mas deixar determinados equipamentos impraticáveis foi extremamente chato. Arco e flecha exige um tempo de preparo, este que se você estiver isolado de frente para a criatura não vai existir. Espadas e o guarda-chuva com lâminas são opções mais viáveis, já que até o martelo te deixa na desvantagem inicialmente.
Em quesito de sua performance, Wild Hearts é um game que chegou pela linha EA Originals e foi desenvolvido pela Omega Force. Caso isso não signifique nada para você, vamos resumir – a Electronic Arts cedeu uma parte do orçamento para ele ser produzido, mas não é a mesma faixa que um Star Wars Jedi ou FIFA receberia por exemplo. Já a dev, seus problemas com os últimos musou mostraram que eles estão um passo atrás quando se trata de desempenho nas atuais plataformas.
Ainda que surpreendam e tragam algo que realmente tem uma boa aparência e gameplay agradável, as falhas e glitches durante os combates, além de curtos períodos de lentidão, podem botar toda a sua experiência a perder. O carregamento do título é também um dos mais lentos que já vi no PlayStation 5, mostrando que realmente falou um pouco mais de testes e melhorias para que ele funcionasse bem no console da Sony.
Ainda ouviremos falar desse game no futuro
Posso ter trazido críticas duras baseado na experiência que tive com Wild Hearts, mas vou ser bem sincero com vocês: ele mais te encanta do que o contrário. Se considerarmos que a Omega Force trabalhava majoritariamente com musou e passou para o gênero de “caça aos monstros” qual não tinha know how e fez isso de uma forma sólida me soou muito ambicioso para o futuro do estúdio.
Eu tenho a certeza que essa será uma das franquias que ouviremos falar mais vezes daqui em diante – seja pelo suporte que eles podem oferecer, pelas melhorias que poderão vir em uma provável sequência ou quem sabe até mesmo pelos mistérios que este mundo reserva e os fãs descobrirão com o passar do tempo. Ouso dizer que, pelo que vi, Monster Hunter terá um concorrente forte daqui em diante. Este me parece o primeiro passo de algo maior que está para ser revelado.
Ainda que existam problemas, cada encontro com uma criatura é um momento único. É onde você só terá o impulso de fugir enquanto sua mão clama pela batalha. Poderia inventar ainda mais coisas, porém não adianta, o momento que ele brilha é esse. Quando um kemono inédito aparece e você não tem nenhuma informação sobre ele, apenas um torcicolo de tanto olhar para cima e a coragem.
E vamos ser honestos, ainda que ele não entregue o que prometeu nos demais fatores, dá sim para se divertir e aproveitar o que Wild Hearts tem a oferecer. Não vamos falar aqui que será o “Game of the Year 2023”, mas também passa longe de ser uma vergonha da indústria dos jogos eletrônicos. Acredito fielmente que, se der uma chance, ele vai te dar mais razões para gostar daquilo do que o contrário.
Não é nada que a Omega Force ou até mesmo a Electronic Arts não consigam resolver com uma atualização no futuro ou trazer mais conteúdo para ajudar a expandir ainda mais a base de jogadores. Considerando que eles andam buscando o feedback do público para continuar aprimorando as coisas, suponho que eles não deixem isso seguir sem intervir de forma positiva.