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The Bookwalker: Thief of Tales é um daqueles jogos indie que chegam para fazer sua cabeça explodir pela genialidade em criar um mundinho próprio e tratar uma temática antiga como algo diferente. A desenvolvedora Do My Best mostrou como transportar de maneira brilhante a ideia de que os livros podem proporcionar muitas aventuras e novos mundos.

Agora o desafio é da tinyBuild, responsável pelo lançamento e distribuição, em divulgar um título complexo de ser compreendido por misturar mecânicas e quebrar as barreiras que os gêneros insistem em impor às classificações dos jogos.

Era uma vez…

Antes de falarmos do jogo, eu gostaria de parabenizar a criatividade e coragem dos desenvolvedores em criar um universo novo e único para The Bookwalker: Thief of Tales sem se preocuparem em justificar todas as escolhas feitas para que a história se desenvolva por conta própria e conforme interpretação do jogador.

The Bookwalker: Thief of Tales
Uma aventura de assalto, com muito estilo artístico

No papel de Etienne Quist, acompanhamos tudo pela perspectiva de um escritor que sofre de bloqueio criativo por cumprir uma pena de 30 anos de uma lei executada por uma força policial que regula a atuação dos autores literários. Vivendo de maneira simples e sofrida, por conta deste crime que não é explicado ao longo do jogo, você aceita missões oferecidas por um estranho contratante para entrar (literalmente) em livros e roubar artefatos que aparecem em histórias, tudo com a intenção de diminuir sua pena para voltar a escrever.

Ao recebermos maletas, sempre com um livro em destaque, algumas informações sobre os autores e um espaço para colocar os itens que roubarmos, somos transportados para mundos fantásticos que vão de lendas arturianas à mitologia nórdica, passando por contos que tratam da industrialização e viagem espacial, visitando os mais diversos tipos de cenários para roubar itens famosos como, por exemplo, o elixir da vida e o martelo de Thor.

Se passando por mais de sete histórias diferentes, conhecemos mais sobre este mundinho, que de alguma maneira criam um fio condutor sobre esta realidade alternativa, o fascínio por artefatos, o fim da televisão, a influência da internet e uma grande guerra, além de outras pessoas com a mesma habilidade que a sua em mergulhar nas obras literárias.

The Bookwalker: Thief of Tales
O mundo de Etienne flerta com a nossa realidade, que evolui a cada novo livro

Acompanhado de Roderick, uma gaiola enigmática e falante, a história evolui num formato parecido com Disco Elysium e Divinity Original Sin, com muitos diálogos, textos e decisões para serem tomadas, construindo uma narrativa que proporciona ao jogador subverter outras obras literárias.

O grande destaque de The Bookwalker: Thief of Tales está em seu roteiro e a maneira como todas as histórias são contadas, pois você poderá interferir em acontecimentos já escritos originalmente, como normalmente você será questionado por Roderick, oferecendo uma camada extra de possibilidade, curiosidade e exploração ao jogo, além de causar caminhos diferentes para a conclusão daquele livro e capítulo da história principal.

Saindo um pouco do jogo e indo para o potencial reflexivo que os desenvolvedores criaram, não sei se propositalmente, mas o Etienne Quist do jogo parece ser uma alegoria para o filósofo Étienne de la Boétie, por trazer com o gameplay algumas temáticas que flertam com questõs sobre emancipação, livre-arbítrio e opressão.

The Bookwalker: Thief of Tales
Excelentes ideias e muita criatividade na construção de mundos

Através dos deste filósofo, além de muitos outros pensadores ou até mesmo visão de mundo, podemos reconhecer muitas temáticas através da excelente escrita deste jogo, tendo um peso maior no teor humanista e libertário oferecendo diversas interpretações sobre os acontecimentos e decisões. Infelizmente para aquele gamer que acha que joguinhos não falam de política, sinto informar que esse aqui vai muito além!

Viva uma nova aventura a cada livro

The Bookwalker: Thief of Tales oferece uma jogabilidade criativa, mesclando momentos de visão em primeira pessoa, quando estamos controlando Etienne em seu mundo real, mudando para visão isométrica quando viajamos para dentro dos livros. Essa alternância de câmeras cria uma perspectiva diferente sobre acontecimentos e separa muito bem as histórias que estamos acompanhando.

Quase como um adventure game com elementos de point and click, você buscará pelos artefatos que precisa roubar cumprindo pequenas missões, num trilho um tanto quanto linear de acontecimentos. Além do apoio de Roderick também temos a habilidade do protagonista em voltar para o mundo real em busca de um item que possa ajudar na exploração, no entanto essa mecânica faz com que o crafting de gazua, pé de cabra e alicate, dentro de cada livro, perca um pouco o sentido. Afinal não era mais fácil transportar do seu apartamento para ou entre as histórias que visitamos?

The Bookwalker: Thief of Tales
O peso do livre-arbítrio de Etienne contrapondo o conhecimento de Roderick

A movimentação pelos cenários é um pouco travada, ainda mais sem apoio do mouse, exigindo paciência para interagir com elementos ou clicar nos objetos corretos. Nada que atrapalhe na experiência, mas ao lado do combate por turno, que muitas vezes não acrescenta na história e só serve como um desafio pontual, pode deixar o jogo um tanto quanto lento para os que esperam evoluir rapidamente durante as sete horsa de jogo.

Oposto ao combate monótono, as habilidades de Etienne e a mecânica de absorção de tinta são agradáveis e fazem você pensar ao escolher as ações do ladrão, evitando ser derrotado e coletando o máximo de tinta possível para facilitar sua vida, que serve como barra de energia para executar seus golpes.

Como se um autor tivesse o poder de “apagar” as palavras para derrrotar seus inimigos ou “escrever” o sucesso do seu personagem, o absorver de tinta durante o combate surge quase como uma metalinguagem dessa profissão.

The Bookwalker: Thief of Tales
Impossível não se encantar com o visual e conceitos de cada história

Ainda acredito que o ponto forte desse jogo é a narrativa, mas mesmo com as limitações de movimentação e o estilo de combate que poderia ser mais dinâmico ou rápido, The Bookwalker: Thief of Tales brilha menos no gameplay sem deixar de ser competente em sua proposta.

Cativante, criativo e inteligente

The Bookwalker: Thief of Tales entrega uma experiência narrativa brilhante, transportando o jogador para mundos mágicos belíssimos, representados magistralmente por uma bela direção de arte, muito caprichada e detalhista. Isso favorece o level design bem construído para ficarmos intrigados e motivados em explorar os cenários em busca de mais informações.

Quase como um RPG clássico, com momentos narrados e pausas para discussões sobre as escolhas, podendo controlar o destino daqueles personagens, a maneira como os desenvolvedores contam essa história é realmente muito interessante, com mundos bem construídos e propostas criativas para criar uma experiência imersiva e cativante.