Existem jogos que entregam tudo de mão beijada o tempo inteiro, durante todo o gameplay, com narrativas simples de serem entendidas. Já outros deixam o jogador descobrir muita coisa por conta própria, deixando a história, que não é tão exposta, nas mãos do gamer.
Existe ainda um terceiro grupo em que absolutamente nada é entregue ao jogador. Quase não existe HUD (informações na tela), não existem textos ou mesmo diálogos. Jogos assim não explicam nada, não apontam para onde você precisa ir. Se alguma mensagem aparecesse em um game desse tipo, acredito que seria “se vira aí”.
Scorn faz parte desse terceiro grupo e esse pode tanto ser o maior ponto positivo do jogo, como aquele atributo que pode desagradar alguns jogadores mais tradicionais. “O jogo não terá pena de você caso perca algo importante nas suas jornadas inquietantes. Tudo tem um motivo e um propósito, você é quem tem de descobrir qual é“, descreve a página do jogo. Então o jogador já entra ciente do que o aguarda.
Acordei, e agora?
A imagem da tela inicial do game (onde você encontra as opções iniciais), já tem a primeira cena renderizada nos gráficos do jogo ao fundo. Um ser, humanoide, nada bonito, acorda, se levanta, tenta andar e cai em um precipício. E é assim que o jogo começa. Você inicia sem entender nada e arrisco dizer que, muito provavelmente, vai terminar o game com o mesmo sentimento.
Como disse antes, Scorn quase não tem HUD. Por muito pouco as informações na tela seriam zero durante todo o jogo e mais pra frente conto onde o HUD entra. Com isso em mente, não existe mapa, bússola, qualquer indicativo, que seja, de direcionamento ou objetivos.
Você percebe o enredo sendo contado através das poucas cutscenes sem diálogos, com alguns acontecimentos, através da linguagem corporal do protagonista, da ambientação bizarra que parece ser viva o tempo todo. Isso é o suficiente para você entender a mensagem do game? Entro nesse assunto mais adiante.
Exploração linear
Diferente do que os desenvolvedores prometem (de acordo com a descrição do jogo), o game, nem de longe, é de mundo aberto. Eu ousaria dizer que a liberdade é quase zero em Scorn.
Este é daqueles títulos que o impede de passar por um trecho por conta de uma pilha de entulho de 30 cm de altura, por exemplo. Não dá para passar por cima, nem pular, e você precisa desviar para onde o game quer exatamente que você vá.
Os diferentes cenários são labirintos, com ambientações vivas que confundem o jogador facilmente, e isso acredito ser proposital. Se você viu algum trailer de Scorn, imagine aquele cenário sendo aquilo por quase o tempo todo que você estiver por lá. Muitas portas e corredores bem parecidos. Se você não tiver uma boa memória para guardar as particularidades dos diferentes ambientes, vai se perder com frequência.
E por falar em portas e corredores, todo o progresso em Scorn depende da solução de quebra-cabeças diferentes espalhados por todo o jogo. Eles são diversificados, intuitivos (uns mais que outros) e esse fator é que vai determinar quanto tempo você levará para terminar o jogo.
Ao interagir com os puzzles, você verá uma das coisas que os desenvolvedores mais se empenharam em fazer bem feito: os movimentos das mãos. Alguns mecanismos precisam que o personagem coloque seus dedos, ou mãos, ou ainda o braço inteiro, para abrir portas, e isso é muito bem feito.
Visuais belos e nojentos
Scorn é um jogo muito bonito. Apesar dos ambientes se repetirem por vezes, existem muitos detalhes espalhados que dão características para aquele lugar e servem como pontos de referências.
O game é bastante violento e, como tem gráficos realistas, pode causar um certo desconforto. Prepare-se para ver muita coisa nojenta como vísceras, muito sangue e tentáculos que parecem estar na carne viva. O visual de Scorn deixaria Ed Boon orgulhoso. Por falar nisso, o game tem os visuais inspirados pelas de obras de H.R. Giger, nada menos que o criador de Alien.
Há combates, claro, mas este não é foco do jogo. Você adquire quatro armas alienígenas, que são equivalentes a uma pistola, espingarda, lança-granada e uma arma de ataque corpo-a-corpo (melee).
Com as armas, é o único momento em que Scorn apresentará seu HUD, mostrando a vida do personagem, além da quantidade de munição. A arma padrão (melee) serve como chave em alguns mecanismos. E também é a base para encaixar as outras armas citadas em uma animação muito bem feita e que leva um certo tempo, o deixando vulnerável a qualquer ameaça.
Existem consoles espalhados pelo jogo, em que você pode recarregar o recipiente para recuperar sua vida, bem como as diferentes munições das armas de fogo. Nesse quesito, tudo é muito contado, trazendo aquele ar de survivor horror ao jogo. Só não espere nada mirabolante dos combates: eles são lentos, tanto para mudar a arma, atirar, até se movimentar para desviar dos ataques.
Scorn é o jogo mais diferente de 2022
Scorn é um jogo muito diferente, em todos os sentidos. O último jogo que me fez sentir o que senti foi Inside, que considero um dos maiores jogos de todos os tempos. Narrativas interpretativas tem um gosto especial e sempre são experiências diferentes.
E não estou falando de algo no nível dos jogos da FromSoftware, como Dark Souls e Elden Ring, em como eles contam suas histórias. Scorn vai muito além disso e, como disse antes, esse é um fator que pode colocar o game lá em cima quanto lá embaixo.
Algo que me intrigou é o quão bem otimizado e leve o game é. A Ebb Software recomenda uma RTX 2070 e Ryzen 5 3600x, mas no meu PC com uma RTX 2060 e um Ryzen 5 2600x, o jogo rodou com qualidade máxima em 1080p com muita facilidade. O que me leva a indagar o motivo do jogo não ter sido desenvolvido também para Xbox One, já que o jogo nem faz uso do rápido carregamento de nova geração. Para mim, o Xbox One, principalmente o Xbox One X, conseguiria rodar Scorn sem dificuldades.
Scorn é uma experiência única. Ele entrega um bom nível de exploração, desafios em forma de puzzles e combates, é muito intrigante, belo e acessível por ser leve no PC e fazer parte do Xbox Game Pass já no lançamento.