O que esperar após a morte: Um eterno frio no limbo do esquecimento, ou uma luz envolvente e acolhedora? Talvez nada disso. Pelo menos é assim que Necrobarista nos apresenta a primeira etapa do pós-vida. No chamado Terminal, as almas chegam após morrerem, seja por doença, idade, acidentes ou assassinato. Tratando a morte como um estado transitório, mas ainda assim permanente, Necrobarista apresenta uma visão mais confortável desta transição.
Trazendo um estilo de narrativa semelhante a uma visual novel, mas muito mais impactante, Necrobarista esbanja charme e originalidade. Por isso, puxe uma cadeira e sente-se em uma mesa do Terminal, enquanto espera as suas últimas vinte e quatro horas passarem para seguir em frente.
Uma xícara de café e um último cigarro
A história de Necrobarista é cheia de personagens que transitam pelo Terminal. Mesmo numerosos, estes não passam de vultos, sendo apenas os realmente importantes para a história apresentados e detalhados. Assim sendo, conhecemos nossos protagonistas e funcionários do café: necromante Maddy; seu companheiro, tutor e antigo chefe Chay; e a jovem energética Ashley, adotada pelo casal.

Tudo parece estar em ordem no café, mas sua verdade acaba sendo revelada com a vinda de Kishan. O jovem “hipster normie”, que acabou de chegar ao Terminal, acaba tendo de passar suas últimas 24 horas junto deste grupo, aprendendo sobre como as coisas funcionam nesse limiar entre a vida e a morte, sobre as vantagens de estar morto, as regras que regem seu novo estado e o que esperar do outro lado. Além, é claro, sobre uma forma de “escapar” do destino de seguir em frente.
Para apresentar as regras tanto para Kishan, quanto para manter os funcionários do Terminal na linha, temos Ned. É um misterioso personagem que age em função do Conselho da Morte. O nome parece de grupo de vilão, mas é o Conselho quem mantém a ordem e as regras no mundo de Necrobarista. No passado, Chey acabou sendo conivente demais com algumas pessoas e desequilibrou as horas do café, e Ned é o responsável pela cobrança. É um plot simples se olharmos por cima, mas Necrobarista consegue transmitir muito bem sua mensagem em seus dez capítulos.
Por baixo das cobertas, Necrobarista traz uma maneira diferente de ver a morte. Através de sua narrativa utilizando apenas imagens, textos e transições de curtas animações, vamos acompanhando essa história interativa, mostrando como Kishan tenta entender e processar o fato de ter de seguir em frente, de Ned e seu passado, além de Maddy e Chay tentando conciliar sua profissão, vida pessoal e a pequena Ashley.

Em grande parte da experiência, Necrobarista me lembrou de um curta chamado Death Billiards. O jogo traz uma maneira nada ortodoxa de enfrentar esse intervalo entre morte e seguir em frente, tal qual no O.V.A. Além disso, sempre que um capítulo acaba, somos apresentados a três robôs criados por Ashley que servem para quebrar um pouco a rotina e tentar fazer o jogador rir com suas ponderações e conversas.
Após cada capítulo, o jogador pode explorar o Terminal e suas dependências, o que nos permite ver o café inteiro. Isso é, a cada capítulo finalizado, uma nova seção do local se abre. Como o segundo andar, o porão, a parte de fora, a cozinha etc. Há também a possibilidade de explorar outras histórias espalhadas pelo café, mas cada uma delas custa pontos, que podem ser encontrados após os episódios.

À espera do alvorecer
A interação com os capítulos de Necrobarista se resume apenas a observar a história e acompanhá-la. No entanto, em alguns determinados momentos, certas palavras irão aparecer em amarelo. Estas palavras-chave são relacionadas a locais citados na história e aos personagens. Utilizando o botão do mouse ou a tecla enter, o jogador avança pela história principal ou secundária, enquanto caça estas palavras amarelas pelos parágrafos e frases.
Cada palavra irá render um ponto que pode ser gasto nas histórias secundárias espalhadas pelo Terminal. Para acessá-las, os jogadores devem interagir com determinados objetos do cenário, como uma mesa de bilhar, um saco de grãos, uma cafeteira e por aí vai. Tanto as histórias secundárias quanto as principais são anunciadas da mesma maneira, quando uma luz azul irá emanar do objeto e um som peculiar poderá ser ouvido.

As partes que realmente chamam a atenção são a gráfica e a sonora. Em termos visuais, jogar Necrobarista é como jogar um mangá por assim dizer. Você não faz escolhas, não interage, apenas acompanha o desenrolar da história e depois pode seguir em frente ou ler os apêndices entre os capítulos. O tom da narrativa está sempre mudando e as personagens são bem escritas, fazendo com que os espectadores passem a realmente se importar com o que acontecerá a eles ou não.
Tudo isso é coroado pela bela trilha sonora, que embala o ritmo da narrativa e da aventura. Essa é uma daquelas trilhas sonoras que podemos colocar a qualquer momento do dia para relaxar e poder aproveitar o tempo para refletir. Já o estilo de arte lembra muito algo saído direto das mãos de Atsushi Okubo, com um estilo bem marcante de roupas. Chey, mesmo se tivesse cabelo branco e um parafuso na cabeça, poderia se passar por Dr. Stein de Soul-Eater.

Necrobarista é um jogo para um nicho exigente, que ama escutar o vídeo Lo-Fi da jovem estudante, enquanto desenha, cria ou lê e se entope de cafeína. Claro que o jogo é bem parado e é basicamente leitura, mas é uma boa leitura, com personagens marcantes, uma ótima trilha sonora e uma mensagem que pode ser mais importante do que pensamos.