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Desde a queda e o desaparecimento da Telltale, a Dontnod assumiu seu posto de “principal criadora de jogos focados em narrativa”. Os dois Life is Strange lançados até aqui já deixaram bem claro a que veio esse estúdio francês que era um tanto desconhecido há alguns anos: trazer histórias interativas e profundas, com personagens fortes e sempre abordando críticas sociais que estejam em evidência.

Seus dois lançamentos de 2020, Tell Me Why e Twin Mirror, passaram bem despercebidos pelo público e não tiveram metade do apelo que qualquer Life is Strange teve. Porém, diferente de Tell Me Why, Twin Mirror é apenas uma história de investigação clichê e pouco imersiva, com personagens sem carisma e nenhuma crítica social realmente impactante. Infelizmente, temos aqui o jogo mais fraco da Dontnod até o momento.

Fantasmas do passado

O protagonista da vez é Samuel Higgs, um jornalista que vivia na pacata e isolada cidadezinha montanhosa de Basswood. Após sofrer uma série de decepções e reviravoltas em sua vida, Sam deixa a cidade sem nenhuma intenção de retornar algum dia, mas dois anos depois se vê obrigado a encarar seu passado após receber a notícia de que seu melhor amigo havia morrido em um acidente de carro.

Um Sam antissocial e amargurado retorna para Basswood e já é recepcionado com uma bomba nas mãos: a filha de seu falecido amigo acredita que seu pai foi assassinado e deixa sob sua responsabilidade a missão de investigar sua morte. Não tendo muita escolha, Sam acaba cedendo e precisará cooperar com pessoas que ele gostaria muito de esquecer, como sua ex-namorada, Anna – que estava namorando o seu falecido amigo!

No palácio mental, Sam pode colocar as ideias no lugar.

É a partir desse mistério que a história de Twin Mirror começa. Aqui não temos a habilidade de voltar no tempo ou usar telecinese, mas o jogo conta com suas próprias mecânicas que não são lá tão inovadoras. Sam pode usar o que ele chama de palácio mental, um momento onde o tempo “congela” para que ele possa analisar friamente toda a situação e decidir seus próximos passos – mas tudo dentro da sua cabeça.

Além disso, ele conta com a constante companhia de um homem que claramente só existe na sua mente, mas sua identidade segue sendo um mistério até o final do jogo. Para ser sincero, eu esperava algo muito mais elaborado se tratando desse personagem e até mesmo do passado de Sam, mas quando a resposta veio foi algo tão banal e sem graça que não consegui não ficar decepcionado.

O jogo se resume em Sam tendo que solucionar esse mistério e lidar com as pessoas ao seu redor ao mesmo tempo que lida consigo mesmo e suas duas metades: seu lado analítico contra seu lado social (que é representado pelo homem imaginário). As principais escolhas do jogo sempre trazem duas possibilidades baseadas nesses dois lados, mas no geral pouco importa o que você escolhe – apenas a última escolha é importante, pois é ela que define o final que você vai tirar.

Crise de identidade

A campanha dura entre quatro e cinco horas, mas tem um detalhe: a princípio o jogo seria episódico, no mesmo estilo de Life is Strange, mas a Dontnod acabou voltando atrás e lançou a experiência completa de uma vez só. Isso é ótimo, afinal ninguém merece esperar intervalos de três a quatro meses para continuar uma história, mas ao mesmo tempo foi ruim para Twin Mirror, pois o jogo ficou curto demais e a impressão que dá é que muitas coisas foram feitas às pressas.

Esse Sam precisa fazer uma terapia com urgência.

Por outro lado, uma campanha mais curta é melhor para quem buscar ver todos os finais ou até mesmo testar os resultados das escolhas que não fez na jogada anterior. Novamente reforço que, no geral, as escolhas são praticamente ilustrativas e não trazem peso real para a história. Existem cinco finais diferentes (que na prática são apenas dois com leves alterações) e todos são decididos dentro das três sequências finais do jogo, então tudo que se passa antes disso é apenas uma preparação para o grande clímax do enredo.

Todos os personagens são muito rasos e em nenhum momento você consegue se importar com eles, muito menos se interessar pela causa da morte do amigo de Sam. Os gráficos ainda aparentam estar levemente melhores que os de Life is Strange 2, mas a falta de realismo pesa muito aqui. Nenhum personagem possui expressões faciais convincentes (a maioria fica com a mesma cara o tempo inteiro) e a expressão corporal deles é simplesmente bizarra, com gestos bruscos e exagerados que muitas vezes não casam com o tom da conversa.

O jogo já não tem muitos escapes para bugs, afinal não estamos falando de um título de ação com uma grande diversidade de mecânicas e movimentos, mas ainda assim ele possui alguns errinhos que tornam a experiência ainda mais tosca (e por vezes cômica). O maior deles é a dificuldade que os personagens têm de segurar objetos: é extremamente comum eles estarem segurando alguma coisa que está flutuando magicamente ou afundando na mão deles. Isso acontece principalmente com celulares, então apenas observe quantas vezes acontece alguma bruxaria sempre que alguém está segurando um celular.

Pausa na investigação para jogar um clássico.

É nessas horas que a gente pensa “A história deve carregar o jogo nas costas, não é?”, mas não, infelizmente não é o caso. O fato de você não se apegar aos personagens já compromete uns 50% do seu interesse pelo jogo, mas o enredo é clichê, previsível e muito decepcionante, ao ponto de você chegar no final e se perguntar “É só isso? Acabou?”. Eu mesmo consegui desvendar quem era o verdadeiro vilão da história já nas primeiras sequências do jogo, quando a investigação ainda estava começando, então quem tiver o olhar mais apurado provavelmente terá uma experiência ainda menos empolgante.

Ao menos, a boa notícia é que não estão cobrando preço cheio por ele, então os amantes de jogos de investigação não precisarão desembolsar uma fortuna para jogá-lo. Ainda assim, é recomendado esperar uma boa promoção ou até mesmo deixá-lo passar, pois no final será uma experiência tão esquecível que não vai fazer tanta diferença.

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