O sexto jogo da franquia Star Ocean chega no finzinho de 2022 para mostrar que a “série B” dos títulos da Square Enix ainda pode surpreender positivamente. The Divine Force, desenvolvido pela tri-Ace, resgata estilos já conhecidos para a jogabilidade e aposta numa narrativa mais robusta.
Quase como um mix entre Final Fantasy e Star Trek, prepare-se para se deparar com boas influências de fantasia medieval e ficção científica que estão aos montes em jogos, filmes e séries, numa história interessante e cativante.
Indo até aonde nenhum outro jogo jamais esteve
Não tem como começar sem ser pela incrível história de Star Ocean: The Divine Force, muito menos sem ser com uma referência ao seriado criado por Gene Roddenberry, isso sem contar a fortíssima influência de “Eram os Deuses Astronautas?”, livro escrito por Erich von Daniken.
Somos apresentados aos personagens Laeticia Aucerius e Albaird Bergholm, que vivem num planeta chamado Aster IV, e têm suas vidas mudadas ao encontrarem uma nave espacial mercante caída após ter sido abatida, com seu misterioso tripulante, chamado Raymond Lawrence, um estranho robô chamado D.U.M.A e outros membros dessa equipe que veio das estrelas.
Esse início simples evolui para intrigas entre realezas, uma doença que assola o planeta, passa por uma guerra contra o império local, nos apresenta à tecnologias extraterrestres e termina nos levando para batalhas e viagens interplanetárias, quase como se pudéssemos vislumbrar uma boa space opera.
Explorando desde civilizações subdesenvolvidas, num estilo que lembra muito uma fantasia medieval, ao super desenvolvimento de uma Federação Galáctica, ao melhor estilo de Star Trek, os desenvolvedores acertaram no tom e velocidade em que a história se desenvolve. Começamos com Laeticia, Albaird e Raymond para fecharmos o primeiro capítulo com praticamente todos os personagens jogáveis disponíveis.
Com a ajuda de uma androide, um semiomancer, algo próximo do que seria um Mago com conhecimentos de engenharia, uma iatrimancer, quase como uma sacerdotisa, além de uma heremita, um guerreiro, outro cavaleiro e uma militar, participarem de uma trama que se desenvolve no planeta de Laeticia, porém com grande influência de forças extraterrestres e uma intriga política entre civilizações interplanetárias.
Infelizmente não tem como comentar mais sobre a história sem spoilers ou até mesmo trazer detalhes sobre personagens que causarão as viradas e surpresas que você terá na primeira parte da história. Todo um primeiro e longo arco é construído para nos levar por mais três capítulos que mostrarão como “pequenos” atos podem gerar fortes respostas aos interesses de alguns, dentro de um universo muito maior que a ganância de outros.
Nostalgia dos antigos RPG japoneses
Na contramão da narrativa muito bem construída e com o excelente trabalho no desenvolvimento dos personagens, dando profundidade para todos aqueles que aparecem e integram o time de heróis, infelizmente a construção deste mundo não acompanhou o mesmo esforço ou a geração em que o jogo se encontra.
Quase como se estivesse jogando um título do PS2, porém portado diretamente e sem modificações para o PS4, temos uma proposta de mundo aberto e grandioso ao mesmo tempo em que é vazio e desinteressante. Lembra aquelas pequenas sessões de mapas dos RPG do PSOne? Agora aumente para áreas imensas, mas que não oferecem nada para ser explorado e com uma trilha pontuada com alguns poucos grupos de inimigos para serem combatidos.
Junte este mundo grande e vazio, na mesma pegada das críticas que Pokémon Arceus recebeu pela falta de conteúdo, ao design bizarro dos personagens. Quase como um CG da primeira geração que passou a utilizar polígonos, todos parecem de borracha e com expressões vazias. Isso sem contar os movimentos limitados e repetitivos durante diálogos.
Como se não bastasse, seu bestiário será preenchido com criaturas estranhas e outros minions que seguem os vilões desta história, mas que não possuem muito critério para estarem ou aparecerem nos diversos tipos de cenários. Você verá um guerreiro do exército imperial no alto de uma montanha nevada, no deserto ou numa floresta tropical.
Prepare-se para abrir o mapa e não conseguir utilizar a viagem rápida, mesmo já tendo visitado o local, tudo para correr por mais de um quilômetro numa planície vazia, mesmo que bonita, para presenciar apenas um diálogo. Como disse, o principal ponto neste jogo é a história, inclusive fazendo escolhas bizarras para que ela se desenvolva.
A parte boa de termos um pseudo mundo aberto, repleto de paredes invisíveis e sem conteúdo interessante para explorar, é utilizarmos o D.U.M.A com sua função de jetpack para agilizarmos a movimentação e voarmos por alguns metros.
Combate livre que tenta ser complexo
Já que falamos do robô/drone D.U.M.A, podemos sair da jogabilidade pelo mundo para o combate. A nostalgia pelos jogos de PS2, principalmente o estilo que ficou famoso na série Tales of e há anos vem sendo usado como ponte para mesclar o estilo de RPG japoneses aos ocidentais, também aparece no combate rápido e livre.
Você poderá se movimentar livremente e utilizar seus pontos de ação (AP) para executar seus ataques. Prepare-se para investir muito tempo para configurar suas habilidades ativas, passivas, ataques especiais e golpes normais, num menu completíssimo. Esta etapa é fundamental para você conseguir se sair bem nos combates.
Some à fluidez do combate e a complexidade em gerenciar sua equipe, com até quatro personagens, inclusive com a customização de equipamentos, para que o D.U.M.A traga ainda mais velocidade e liberdade à movimentação. Você poderá utilizá-lo como escudo para seus personagens ou como jetpack para um “dash” especial, que colocará você próximo ao inimigo e ainda terá a chance de paralisá-lo ao surpreendê-lo pelo seu “lado cedo” (blindside).
Os problemas com o combate são dois, pois você poderá ignorar toda a complexidade e equipar apenas um tipo de ataque para esmagar seu botão sem pensar muito até seu inimigo ser derrotado. Além disso, o lock-on nos inimigos não é preciso o que complica o uso do D.U.M.A para acertar quem você realmente quer, principalmente quando existem muitos inimigos em tela.
Falando nisso, infelizmente o jogo possui sérias limitações e seus inimigos possuem movimentação e comportamento bem previsíveis, fazendo com que muitas vezes algum NPC aliado ou até mesmo a IA da sua party seja o suficiente vencer os combates apenas com seu apoio ao curar todos os personagens.
Desproporcionalmente, em Star Ocean: The Divine Force nós temos uma dificuldade surreal e desbalanceada por conta dos chefões. Muitos aparecem em sequência de acontecimentos que não nos permite nos prepararmos previamente ou sem intervalos que possibilitem o grind para aumentarmos nosso level. Mesmo jogando no modo “Earth”, que seria o fácil, ter que enfrentar o mesmo chefe três vezes seguidas e acompanhado de diversos inimigos não será algo fácil.
Cativante, viciante e problemático
Ao deixarmos todos esses problemas, que tornam apenas o jogo mais difícil de se apreciado e não impedem o prazer de jogá-lo, podemos simplificar ao máximo o looping de combate ou exploração para que ele ganhe nossa atenção pela história que se propõe em contar.
Além disso temos muitas opções de evolução dos personagens, que se apresentam de maneira cativante e fazem com que o jogador se importe com sua progressão e participação na história. Some o fator de excelente escolhas para o design dos personagens, que misturam futurismo, steampunk, medieval e fantasia, mesmo com suas expressões de borracha.
Num geral, Star Ocean: The Divine Force é um jogo bonito e que consegue entregar uma boa experiência que se desenrolará por mais de 40 horas de jogatina. A questão é se queremos perfeição ou apenas um jogo satisfatório, pois esta franquia provou estar no banco sempre aguardando a ausência de Final Fantasy ou Dragon Quest para aparecer e trazer algo “diferente”.
Mesmo que signifique apresentar algumas limitações, seja no visual ou a falta de trabalho na trilha sonora, ou até mesmo com estilos de gameplay mais datados para uma geração que brilha com Elden Ring ou God of War, mas que merece atenção pela qualidade narrativa que possui.
Quem sabe talvez um dia tenhamos esse jogo adaptado em anime, assim como Tales of resolveu fazer com seus melhores títulos, para acompanharmos Laeticia e Raymond saírem de Aster IV para combater os Vyrians e a Federação, descobrindo que “forças divinas” podem não ser boas ou sagradas.