Certa vez, a Epic Games, em suas rodadas de jogos gratuitos, ofereceu Remnant: From the Ashes. Pelos vídeos e imagens, o jogo passava um ar de soulslike, gênero que sou absolutamente fissurado e não deixo passar um jogo do tipo. Bom, tentei o título da Gunfire Games e ele me surpreendeu positivamente, e não só a mim, com mais de 85% de aprovação em mais de 40 mil análises na Steam.
Remnant 2 está entre nós e minha expectativa estava lá em cima. Com todos os trailers apresentando as classes, chamadas de arquétipos na franquia, inimigos, cenários, mecânicas, eu não poderia esperar, pelo menos, o que o primeiro jogo entregou. Para a minha alegria (e creio que para muitos outros), o novo game consegue ir além e, no meu caso, excedeu as minhas expectativas.
A história de Remnant 2 é uma continuação de Remnant: From the Ashes, que já não era fácil de entender, então não espere entendimento da lore do jogo logo de cara, vai precisar passar muitas horas, talvez até iniciar um novo jogo depois, para acompanhar melhor os acontecimentos desse universo que conta com nomes complicados de serem decorados.
Mochilas nas costas em um mundo destruído
O cenário inicial é pós-apocalíptico e se passa em um mundo onde restam poucos humanos sobreviventes. Estes se juntaram não só para sobreviverem juntos em pequenos acampamentos, mas também para enfrentarem o mal que assola a Terra e outros mundos. O game começa no mesmo local do jogo anterior, Setor 13, e também conta com alguns rostos conhecidos de Remnant: From the Ashes, embora tenha se passado alguns anos entre os jogos.
Você, um personagem criado sem muitos detalhes, já que Remnant 2 conta com presets de aparência mais limitados (diferente de como acontece nos jogos da FromSoftware), e sua companheira Cass, estão se aventurando pela cidade destruída que mais lembra The Last of Us, quando são surpreendidos por diversos inimigos, e salvos por membros do Setor 13 e levados até o acampamento.
Esse local é o hub do jogo, onde você fará suas compras, melhorará seus equipamentos, conversará com vários NPCs para saber mais da história. Ou seja, é seu refúgio. A história progride logo após um grande cristal vermelho (o mesmo do jogo anterior) ser ativado, artefato que permite a viagem entre mundos, e dois personagens importantes são sugados por ele e você vai atrás para (tentar) salvá-los.
A história se desenrola na forma de cutscenes entre personagens e chefes, com os NPCs no hub e com muitos textos espalhados pelos mundos. Como eu já falei, não é uma história fácil de acompanhar a princípio, mas a Gunfire Games caprichou nos detalhes disponíveis pelos mundos nesse sentido. Se você tiver paciência, é claro. Só para dar um exemplo, um NPC específico falou por mais de 10 minutos explorando cada opção de fala, e ele narra muita coisa importante. Além disso, tem arquivos de textos enormes com muita coisa para se ler, que também são resoluções para puzzles às vezes.
Explorador de mundos aleatórios
Entre o desenrolar da história, você estará explorando os diferentes mundos gerados de forma aleatória em Remnant 2, como já era feito em Remnant: From the Ashes, mas agora esse elemento está ainda mais elaborado. Em minha experiência de algumas dezenas de horas (sim, o jogo é grande), iniciei dois personagens, entrei em partidas de outros jogadores, e para minha surpresa, mesmo jogando no mesmo mapa, a minha experiência, inicialmente, era diferente.
Não só algumas salas e caminhos são alterados, mas também posicionamento dos inimigos, acontecimentos da história, loot e por aí vai. Isso adiciona em muito no fator replay, e também já era uma das propagandas do jogo. Como deixam claro os desenvolvedores, sua experiência será diferente do seu amigo, como aconteceu comigo e nosso editor chefe, Vinícios Duarte, cada um em sua campanha e um ajudando o outro.
Esse fator influencia também no progresso do seu personagem, já que os equipamentos, sejam armas, armaduras, acessórios, pontos de nível, todos são espalhados aleatoriamente, o que ajuda a tornar mais única cada nova tentativa. Esse, sem dúvidas, é um dos maiores destaques de Remnant 2. Apesar disso, existe um progresso principal da história que não tem como fugir. Claro, se não nada faria sentido no jogo.
Outro ponto positivo está no gameplay fluído, que basicamente é herança do título anterior que já apresentava um bom resultado nesse sentido. A franquia Remnant é chamada de “soulslike com armas de fogo”, e esse apelido faz sentido. As armas de fogo são os destaques dos combates, independente da classe (que já explico mais adiante), mas também é possível enfrentar os inimigos “na mão” com armas brancas, como espadas, martelos, garras e vários outros.
Nesse tipo de combate, a cadência se assemelha aos soulslike, com a diferença (significativa) que não é possível defender ou dar parry, por exemplo. Os inimigos que não oferecem tanto desafio podem ser derrotados assim, poupando munição para suas armas, já que dependendo da dificuldade elas são mais escassas. Além disso, existem atributos que ajudam nesse tipo gameplay, caso o jogador queira investir.
Seja único em Remnant 2
É possível escolher uma das quatro classes iniciais: o Médico conta com diversas habilidades de cura para si e o grupo; o Caçador foca em combate de longo alcance; o Desafiante é o tanque com mais defesa e habilidades para melee; e o Domador conta com um cão que tem habilidades de suporte como aumento de ataque e defesa. Existe ainda uma quinta classe, Pistoleiro, que é possível adquiri-la através da pré-venda, e já agradeço a Gunfire Games pela chave de ativação, já que foi a minha classe escolhida e preferida, esta que foca em velocidade e habilidades para o tiroteio.
Cada arquétipo conta com características (atributos) únicas que podem ser melhoradas. Mas no decorrer do jogo é possível adquirir várias outras. Cada caracteristica pode ser melhorada com um ponto, que conseguimos ao matar chefes principais e encontrar em cantos escondidos pelos mapas (por isso, explore). As características pode chegar ao nível 10 com os pontos, mas a característica única de classe é melhorada somente através de experiência adquirida normalmente nos combates. Essas características únicas garantem habilidades específicas da classe, e são muito úteis.
Uma das novidades de Remnant 2 em relação ao jogo anterior é a possibilidade de misturar duas classes. Comprando itens específicos com os NPCs no Setor 13, você consegue criar o item necessário com o Wallace (o mesmo que você escolhe a classe inicial), equipá-lo e começar a usar os dois arquétipos de sua escolha. Isso adiciona uma variedade de builds diferentes interessantes. Eu, por exemplo, fui de Pistoleiro com Desafiador. Então pude ter a agilidade misturada com boa defesa, e como isso ajudou.
Além disso, cada arma pode carregar um modificador (mod), adicionando habilidades especiais que podem ser compradas com a Ava no hub usando a moeda do jogo e itens de chefes. Já os mutadores, novidade de Remnant 2, aumentam atributos como dano de longo alcance e ataque corpo a corpo, por exemplo. Aliado a tudo isso, existe uma grande diversidade de anéis e amuletos que mudam os status. Ou seja, a possibilidade de builds diferentes nesse jogo é bem grande com esse tanto de combinações.
Capricho nos detalhes
A variedade de cenários e inimigos é bem interessante. Remnant 2 conta com diferentes áreas que vão desde florestas, cavernas, palácios, cidades medievais, terra desolada que lembra Returnal, enfim, e cada área conta com uma grande ramificação. Por exemplo, a primeira área, Yaesha, conta com 12 diferentes áreas, sendo uma das maiores regiões. É possível viajar por todas elas através dos cristais ativados.
Cada área conta com seus próprios inimigos, seja os mais comuns, os mais fortes, subchefes e ainda os chefes principais. Os desenvolvedores capricharam no design dos ambientes, como muitos detalhes, texturas de alta qualidade (ao menos no PC), e também no design dos inimigos, NPCs não humanos e chefes, todos muito bem desenhados e dignos de elogio.
É interessante ver que a Gunfire Games trabalhou em tantos detalhes que vão além da estética. Exemplos: inimigos que vem correndo, ao serem acertados nas pernas, caem; em um momento na cidade medieval de noite, vi a sombra dos inimigos se debatendo pegando fogo projetada numa parede, uma cena que marcou; dá para ler os livros abertos sem precisar interagir com eles, e é legal ver tudo escrito em um português poético impecável; a aparência das armas mudam conforme você instala modificações. E essa lista vai longe.
Existem inúmeras batalhas de chefes diferentes. Desde as clássicas de soulslike, onde aquele inimigo imponente botando medo vem para cima de você, passando por aqueles mais fracos que “sumonam” incontáveis inimigos para infernizar sua vida, até aqueles que funcionam como se fossem um grande quebra-cabeça. Todos muito bem desenhado, seja visualmente falando, seja o funcionamento das mecânicas.
Remnant 2 conta com uma quantidade generosa de chefes secretos e opcionais, e eles sempre rendem um bom loot. Por isso, fica a dica para você explorar bastante cada cenário. Se vir um ponto de interrogação no mapa, ache um jeito de ir até ele, já que uma região não explorada, e potencial lar de um chefe secundário.
O jogo conta ainda com um modo aventura, que basicamente anula momentos da história. Particularmente, eu gostaria que fosse um modo só para enfrentar os chefes. Ainda falando deles, é possível negociar com quase todos os chefes, abrindo novas missões extras e recompensas, então é necessário jogar o game mais de um vezes para ver os diferentes caminhos com esses personagens/inimigos. Além disso, devo dizer que fiquei bastante satisfeito com os desafios através de quebra-cabeças, alguns mais difíceis que outros.
Ajustes que o tornariam um 10
Ao ler tudo isso, você espera que o jogo seja perfeito, não é? Infelizmente esse não é o caso. Existem alguns ajustes que facilitariam a vida do jogador, como a possibilidade de ver o mapa regional sem precisar necessariamente entrar na região para conseguir ver o que você perdeu. Ou ainda conseguir fazer uma marcação no mapa, para que você possa voltar naquele ponto mais tarde. Ler todos os documentos no menu. Vender armas e armaduras que não usa mais. Nada disso é possível.
Mas, sem dúvida o maior ponto negativo do jogo, é o seu desempenho na versão de PC. Quem joga nessa plataforma, está ciente da dificuldade em achar um jogo otimizado nos últimos tempos, e infelizmente Remnant 2 entra para esse grupo. O jogo está bem bonito, mas sofre severamente de quedas de quadros por segundo. Mesmo com computadores que estão acima das recomendações dos desenvolvedores, Vinícius, o redator Rafael Nery e eu, tivemos problemas com isso.
O jogo é feito em Unreal Engine 4, e sofre dos problemas comuns desse motor gráfico, como pré-compilação de shaders e, aparentemente, streaming de assets, que basicamente é o carregamento de coisas pelo cenário, então as maiores quedas de frames acontecem quando você corre pelo cenário, mesmo com o jogo em um SSD. Por vezes, essas quedas de FPS eram aleatórias, como ao entrar em um dos últimos mapas e já de início, o jogo ficar em 12 FPS, sendo necessário reiniciá-lo para voltar ao normal.
E nossas experiências envolvem placas de vídeo tanto da AMD, quanto da NVIDIA, então não tem a ver com alguma espécie de incompatibilidade, lembrando que até a publicação dessa análise, os drivers específicos do jogo ainda não foram lançados.
Apesar disso, o jogo consegue brilhar. Ele oferece uma ótima experiência solo, mas é excelente quando o assunto é coop, especialmente quando cada jogador (total de três) usa uma classe diferente. Não é difícil imaginar que Remnant 2, no mínimo, alcance o sucesso de Remnant: From the Ashes.