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Não sou exatamente o maior fã desse gênero ou exímio piloto em jogos de corrida, mas sempre gostei de passar algumas boas horas curtindo um desafio leve e apreciando a beleza que os últimos títulos trouxeram desde a última geração. Dentre todas as opções no mercado, sempre estive com a escolha dividida entre Burnout, Forza Horizon e Need for Speed, com este sendo sempre a minha primeira escolha. No entanto, com a recente chegada de Payback, a sensação que fica é a de um produto qualquer, sem o espírito da série e que tenta copiar os enredos hollywoodianos.

Talvez se Need for Speed Payback fosse uma continuação do fraco filme estrelado por Aaron Paul, a EA não teria tantos problemas para quebrar a cabeça em como criar conteúdos que se apoiam em mecânicas que fazem você correr, mas atrás de dinheiro (seja ele digital ou real). Vou tentar tomar muito cuidado para não ser uma análise focada apenas em loot boxes, mas com certeza posso dizer desde o primeiro parágrafo que esse está longe de ser chamado de game, pois parece mais um caça-níquel pronto para engolir suas fichas!

Imagem do jogo Need for Speed Payback
Nenhum começo é fácil ou com carro bom.

Nada veloz e muito menos furioso

No comando da franquia desde Rivals, acredito que após três lançamentos, de 2013 até hoje, o estúdio Ghost Games viu seus esforços de reviver a série indo por água abaixo por conta de dinheiro. Os esforços foram válidos por trazer a jogatina para um lado mais cinematográfico, já que dessa vez temos um grupo de corredores de rua (talvez The Crew tenha sido a maior influência) que, após um começo confuso e com muitos acontecimentos ao mesmo tempo, partem em busca de vingança contra Lina Navarro e A Casa. Essa espécie de máfia/cartel comanda as ruas de Vale Fortune, uma mistura de Las Vegas com Los Angeles, desértica ao mesmo tempo que possui cores vindas dos seus cassinos e centros urbanos com ruas que vão sustentar o gameplay. Por conta desse plot e até mesmo pela resolução da história, com uma sequência de missões que nos levam por corridas, roubos e fugas, a comparação com Velozes e Furiosos é inevitável.

O problema é que a “velocidade” acaba se perdendo quando, entre uma missão e outra, você precisa buscar por dinheiro para comprar peças para o seu carro. Isso mesmo! Grind de motor, turbo, câmbio, etc. Tudo para poder progredir entre os diversos tipos de corrida (velocidade, off-road, fuga, arrancada e drift) enquanto acompanha o desenrolar da história. A construção narrativa até tenta impactar com uma ou outra revelação, de quem é o vilão e quem realmente é o responsável por tudo, dando ao grupo de protagonistas a função de sobreviver e desmascarar certas farsas. Nesse meio tempo você vai perceber que talvez não precisasse de um grupo, mas sim de uma dupla ou até mesmo apenas personagens secundários e que não prolongassem o jogo por conta dos vários tipos de carro que você precisa e da dinheirama para customizar seus carros.

Imagem do jogo Need for Speed Payback
Lina Navarro, a culpada de tudo.

Para perceber como essa velocidade na progressão do jogo é quebrada, basta parar para fazer a conta e notar que ela não bate: cada corrida inicial (com pequenas progressões no valor e que não acompanham a dificuldade do jogo) rende um total de sete mil dinheiros. Porém cada upgrade custa em torno de 10 mil e os carros pelo menos 20 mil. E detalhe importante: antes você ganhava os carros que vencia em corridas importantes, agora você só desbloqueia para compra. Multiplique esses valores entre os vários tipos de corrida que fazem parte da trama principal, pois abordam atividades da Jess, especialista em fugas, Mac, o rei do off-road e drift, e Rav, o mecânico, os companheiros de Tyler, personagem que você controla. Tudo para no final seguir a mesma fórmula dos mais recentes filmes de corrida, sem surpresa ou novidade ao encerrar a jornada dos corredores de Vale Fortuna.

Conteúdo demais não justifica o preço

Saem as opções de customização e tuning e entram as Speed Cards, como são chamadas nesse jogo a versão de loot box que a EA insiste em colocar em seus jogos. Agora você tem slots para aplicar as cartas que modificam o seu desempenho, não mais trabalhando independentemente como progressão de level, como antes, muito menos nas diversas opções para transformar seus carros.

Imagem do jogo Need for Speed Payback
Malditas loot boxes / Speed Cards.

Tudo fica com uma cara muito igual e sem personalidade, sem contar que a Inteligência Artificial do jogo está programada em dificultar o seu trajeto até a chegada se você apostar apenas nas suas habilidades no volante. No fim, o que parece é que não importa o seu esforço para ter o seu carro, pois você vai abandoná-lo por um outro mais rápido ao invés de trabalhar nele para melhorá-lo continuamente.

Foram mais de cinco horas até a primeira grande conquista, refazendo corridas ou percorrendo grandes extensões, já que Payback aposta no tamanho do mapa para diluir os colecionáveis e atividades extras, para ganhar algum dinheiro ao passar no radar em alta velocidade, tarefas de salto ou pontuação com áreas de drift. Mesmo assim era quase que em vão, pois tudo era muito caro para eu ter uma folga e vantagem no jogo, evitando perder feio por conta de um nível bem abaixo do exigido em cada desafio. Como saber disso? Cada pin point no mapa mostra o seu level e o indicado para enfrentar aquela corrida.

Imagem do jogo Need for Speed Payback
De conteúdo extra, apenas carros abandonados valem a sua atenção.

Some aos valores uma infinidade de conteúdo desnecessário para dar a falsa impressão de progresso, porém que em nada acrescentam ou valem para a história. Ao contrário do que The Crew fez, ao entupir o jogo de conteúdo multiplayer em meio à história, Need for Speed Payback reserva apenas corridas PvP e cria desvios no mapa para você coletar fichas de cassino (apenas para ligar o seu “patrocinador” ao gameplay) e saltos em outdoor. Coisas que realmente queremos ao pagar caro em um jogo de corrida que ainda nos incentiva em gastar mais para conseguir completar o modo mais básico.

Como nem tudo está perdido, já que a construção dos desafios é bem feita e exige habilidade de quem está controlando cada corredor, existe apenas um único extra que realmente me chamou atenção. Ao vencer a quinta corrida, de uma sequência obrigatória para cada etapa da história e das gangues/tribos que você enfrenta para derruba A Casa, você tem acesso ao menu de carros abandonados. A partir de dicas por foto e mapas desenhados à mão, você precisa localizar o chassi e quatro partes para ganhar um novo carro, mas que retorna para o ciclo maldito da EA de customização e upgrade via Speed Cards, já que ele chega totalmente zerado para você.

Imagem do jogo Need for Speed Payback
Novamente, o começo não é fácil. Ainda mais com Speed Cards controlando o seu progresso no jogo.

Need for Speed: Ready, Set, Go!

Deixando de lado esse ciclo eterno de correr, pagar e ganhar a corrida, Need for Speed Payback aceita ser uma versão de console dos filmes Velozes e Furiosos quando aposta muito, quase excessivamente, em eventos scriptados. Não é nada ruim ou vergonhoso, pelo contrário! Da mesma forma como Forza Horizon ganhou o público pela diversidade e dinamismo nas corridas, a Ghost Games conseguiu evitar circuitos fechados, com início e fim previsíveis. Sendo mais fluido e menos travado, a qualquer momento em uma corrida você pode desencadear alguma sequência, sem loading, que levará você à outra missão.

Não acontece em todas as corridas, mas é muito gratificante quando você pensa que acabou e do nada ela exige que você mude completamente a maneira de jogar, indo de uma fuga para o off-road ou de uma arrancada para uma sequência de drifts. Essa facilidade em alterar o gameplay, contando com as mecânicas individuais de cada estilo de corredor em um grupo que se ajuda durante as missões, deixa tudo mais dinâmico, cinematográfico e prolonga o desafio em quase 10 minutos, como acontece com a corrida final.

Imagem do jogo Need for Speed Payback
Cinematográfico ao extremo.

Assim como qualquer experiência cinematográfica, o visual de Need for Speed Payback mantém o esperado para a geração. Talvez não para os personagens, que são muito plásticos e robóticos, quase sem expressão, além dos carros serem simples e sem explorar o design de cada marca como Forza consegue fazer. Fica por conta da mistura de ambientes que Vale Fortune tem para nos surpreender com a iluminação e o que está ao nosso redor durante a corrida.

Muitas vezes mascarado pela ótima sensação de velocidade, as texturas mais pobres do jogo acabam passando desapercebida aos olhos mais desatentos nessa questão. Mesmo sem variações climáticas, agora a franquia aprendeu a trabalhar com o nascer e pôr do sol, dando uma riqueza ainda maior ao visual do jogo e quebrando a monotonia de um cenário árido ou o cinza da cidade.

Imagem do jogo Need for Speed Payback
Need for Speed Payback tem paisagens belíssimas.

Uma pena que, mesmo com o atrativo visual, a física do jogo é praticamente nula. Carros saltando e policiais capotando são como pedras lançadas ao ar: elas basicamente caem duras no chão. O mesmo para as suas batidas que, por mais veloz que o seu carro esteja, você simplesmente vai quicar contra o muro ou outro carro, sem criar um arranhão ou amassado em seu carro. Apenas dentro de corridas é que você verá algumas raladas e vidros quebrados, mas sem inutilizar o corredor ou até mesmo criar um amassadinho na lataria. Impressionante!

Buscando indexar todo esse visual, além de aumentar a interação no multiplayer, você conta com uma imensa galeria de imagens criada pelos jogadores e, além das corridas online, você tem os desafios impostos pelo próprio jogo a partir dos resultados obtidos em outros jogos conectados. Esse sim é um bom fator replay para o jogo e não o grind para cards que possam melhorar o seu motor.

Imagem do jogo Need for Speed Payback
Sem muitas novidades na narrativa, o final consegue agradar.

Tudo isso mostra como o estúdio se esforçou para trazer uma experiência nova nesse lançamento da franquia. Porém, a fama da EA em pensar nos seus títulos não como “game as service” mas apenas como “game as business”, fez com que Need for Speed Payback batesse na trave. Talvez a “vingança” desse jogo seja realmente abandonar esses jogos lotados de loot boxes por uma opção que valorize o papel do gamer e não apenas sua carteira.

Review – Space Architect

Paulo AlmeidaPaulo Almeida24/11/2024