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Eu nunca vou esquecer a emoção de ir ao cinema conferir a primeira adaptação cinematográfica de Mortal Kombat, em 1995. Eu tinha meus 13 anos, exatamente a faixa etária exigida para ver o filme e, sendo um adolescente pouco exigente, foi uma experiência marcante pra mim. Eu tinha gostado de praticamente tudo: a caracterização dos personagens, o animatronic do Goro, o carismático Raiden de Christopher Lambert, a fantástica trilha sonora (que marcou uma geração), entre outras coisas. De lá pra cá o filme envelheceu mal, mas a nostalgia sempre fala mais alto. Pelo menos não é ruim no nível da desastrosa sequência, Mortal Kombat: Annihilation (1997).

O novo Mortal Kombat, dirigido por Simon McQuoid, estava com o hype nas alturas graças ao trailer. Este que basicamente mostra tudo o que o filme tem de melhor. E não é lá muita coisa, infelizmente. A releitura começa muito bem, com Hanzo Hasashi (Scorpion) sendo atacado por Bi-Han (Sub-Zero) no Japão de 1617. Porém o tom da abertura, disponibilizada na íntegra no YouTube, distoa totalmente do restante do filme. A qualidade da direção tenta se manter no mesmo nível, resultando em boas cenas, mas o roteiro leva tudo pra cova.

Justificando o desnecessário

De novo, Hollywood tentou adaptar um jogo fantasioso querendo dar explicação pra tudo. Algo até possível com um bom roteiro e uma quantidade menor de personagens, porém extremamente difícil. Como explicar os poderes? A necessidade de um personagem matar o outro de forma brutal com um fatality? Ou você abraça o mundo de Mortal Kombat desde o início ou fica dando murro em ponta de faca.

Sub-Zero mete o terror o filme todo.

O que parece andar perfeitamente nos trilhos com a abertura, logo descarrilha com os vários personagens sendo apresentados aos poucos, sem tempo para desenvolve-los, e um herói que tenta conectar tudo mas falha em carisma. É importante deixar claro que a culpa não é do Cole Young, que poderia funcionar e até virar personagem em um futuro jogo. A culpa está exclusivamente no roteiro, que força goela abaixo um lutador de MMA para conectar o público leigo ao filme. E sua participação na jornada só ocorre porque Sub-Zero está caçando todos com a marca no corpo, como um serial killer a solta.

Liu Kang, o verdadeiro herói de Mortal Kombat, o Bruce Lee defensor da Terra, aparece só aos 40 minutos de filme sob a premissa de reunir lutadores com uma misteriosa marca no corpo (o dragão, símbolo da franquia) para combater os adversários reunidos por Shang Tsung – uma versão tão genérica quanto um imperador chinês de um filme de artes marciais qualquer. E tal reunião acontece por acaso, com Liu Kang surgindo convenientemente quando Sonya, Cole e Kano tentam encontrar um local habitado por monges no meio do nada. E por falar em Kano, que serve (muito bem) de alívio cômico na estranha ausência de Johnny Cage, ele rouba todas as cenas.

Liu Kang e Kung Lao ficaram ótimos no novo filme de Mortal Kombat.

Decisões ruins de roteiro

Além da ideia de marcar os lutadores com o símbolo do dragão, o filme empurra outro conceito estranho para justificar o sobrenatural: arcana, um poder interno despertado pelos personagens quando eles evoluem (ou estão na merda mesmo). Liu Kang e Kung Lao, ambos muito bem caracterizados, já dominam suas técnicas e isso é muito legal de ver no filme, mas os outros precisam passar por treinamento. Ao desenvolver o poder arcano, os personagens passam a utilizar seus ataques especiais clássicos. Do jeito mais esquisito possível, mas o fan service está garantido.

Torneio? Quem dera houvesse torneio para reunir os lutadores do jeito certo, mesmo que fossem só algumas batalhas com fatalities. Raiden aparece só para falar o óbvio, fazer uma coisa ou outra e não impedir o que poderia ser evitado a qualquer momento. Como resultado, temos Shang Tsung e seus campeões (da sub-divisão) de Outworld desobedecendo tudo na tentativa de dominar o plano terrestre. Ou para justificar lutas com Nitara, Reiko, Milena e Kabal. Os dois primeiros eu até entendo, já que são pouco lembrados até pelos fãs, mas Milena e Kabal mereciam lutas mais épicas.

Goro é outro personagem mal aproveitado, ainda que muito bem feito em computação gráfica. Sua presença merecia se estender por mais tempo pelo filme, inclusive como uma ameaça maior que Sub-Zero. O que vemos é um capanga de quatro braços em uma luta rápida e sem graça, só para vermos Cole evoluir em ação. É o começo de uma correria sem fim, com várias lutas acontecendo em paralelo, até chegar no aguardado confronto entre Scorpion e Sub-Zero.

O ator Josh Lawson mandou bem demais como Kano.

A dura realidade de Mortal Kombat

Como fã, eu me diverti com o novo filme de Mortal Kombat. As lutas são realmente boas e adorei as referências, easter eggs e piadas. É uma pena que muito do esforço da produção e elenco tenha sido sabotado pelo roteiro. Dá pra sentir a interferência da Warner na produção, resultando em várias decisões ruins. Fiquei extremamente decepcionado de ver a luta na ponte (The Pit) sem ninguém ser arremesado dela, o Kano sem o seu olho biônico, Reptile representado de novo como uma criatura (lembra um mini Godzilla), a forma genérica como ambientaram Outworld e nenhuma cena com golpe de Raio-X.

Ao meu ver, o filme tinha que ter o torneio e só alguns personagens representando cada lado, para dar tempo de desenvolvê-los. Igual fizeram com o excelente longa de animação Mortal Kombat Legends: A Vingança de Scorpion. E para justificar os fatalities, que colocassem personagens nada memoráveis para morrer: Hsu Hao, Mavado, Li Mei, Ashrah, Kobra… Realmente não faltam opções. Quem sabe no próximo filme.

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