Ultimamente, os jogos de anime vem me causando cada vez menos impacto. Em minha busca incessante por reviver os bons tempos dos jogos deste nicho no Playstation 2 e 3, me deparei com o anúncio de Gungrave G.O.R.E e logo uma faísca acendeu. Eu estava empolgado novamente, esperançoso por um bom game.
Meu cérebro foi acometido de imagens e lembranças deste título que trazia o cruzamento de Alucard (Hellsing) com Vash (Trigun) e Guts (Berserk). Um cowboy morto-vivo carregando um enorme caixão em suas costas, armado com duas grandes pistolas chamadas Cerberus.
Nem a morte pode pará-lo
Gungrave nasceu pelas mãos da Red Entertainment em 2002, coincidentemente após o cancelamento de uma adaptação de Trigun para os videogames. A história traz a mesma energia, com organizações criminosas, um grupo de elite de assassinos, e um pistoleiro com armas lendárias que era mais do que aparentava ser.
Seu nome era Brandon Heat, mas após ser traído por seu melhor amigo Harry McDowell, seu corpo é resgatado e passa pelo sádico processo de necrolização. Uma prática profana que traz os mortos de volta à vida, garantindo reflexos, velocidade, força e regeneração sobre-humanas. Mas o custo é alto: para que seus corpos não apodreçam, eles precisam estar sempre recebendo uma transfusão de sangue novo.
Em busca de vingança e para proteger sua agora filha adotiva Mika Asagi, Brandon se torna a entidade conhecida como Beyond the Grave, ou G.O.R.E (Gunslinger Of REssurection). Juntos e após os eventos de Gungrave Overdose (2004), eles criam um grupo chamado El Alcangel, cujo objetivo é acabar com o tráfico da droga SEED.
A droga parasítica transforma seus usuários em criaturas conhecidas como Orgmens. O tráfico dela é conduzido e mantido pela organização conhecida como Raven Clan, um sindicato de vilões típico do gênero, como um ninja, uma femme fatale, mafiosos e um vilão ao melhor estilo Dandy.
Uma chuva de balas cobre a rua
Em busca de impedir que a droga SEED continue a corromper os moradores da cidade de Scumland, o grupo El Ancagel movimenta suas tropas pela cidade em busca dos soldados e traficantes do Raven Clan, empregando a brutalidade de Beyond the Grave e outros agentes como a jovem Chemi “Quartz” Angel.
Durante sua jornada para acabar com a distribuição de SEED, Beyond the Grave irá reencontrar antigos inimigos, como o líder mercenário Zellcondorbrave e seu antigo rival pistoleiro (e companheiro necrolizado) Bunji Kagashira. Ele voltou à vida sem memórias do seu passado ou eventos de Gungrave Overdose, podendo vir a se tornar uma ameaça.
Usando suas pistolas e o Ataúde Funesto, um caixão mecanizado que serve como arma e meio de transporte, o herói se torna um verdadeiro exercito de um “homem” só. Aliás, o ataúde pode se transformar em diversos armamentos como rifles, metralhadoras, serras, lança mísseis, ou apenas servir como porrete mesmo.
Combinando todas estas características, espera-se que este game seja um hack ‘n slash mais pesado e brutal que Devil May Cry, certo? Bem, a resposta é sim e não. Desde o primeiro game no PS2, o foco de Gungrave é o combate armado em ambientes abertos e sem cobertura, dando ênfase à força absurda de Beyond the Grave. Mas com este novo game, as coisas não são bem assim.
Não mexe em cadáver, que fede
Gungrave G.O.R.E é a revitalização de uma antiga IP que fez sucesso dentro de um nicho durante a era do PS2. Uma decisão tão arriscada quanto tentar reviver jogos congelados em suas respectivas épocas, como Shadow of the Damned, Killer 7, God Hand e Vampire Rain. Nem mesmo Deadly Premonition 2, que tantos queriam, conseguiu fazer o salto.
O grande problema de Gungrave G.OR.E está em seu gameplay, que segue o padrão dos jogos de ação em terceira pessoa da era do PS2. Não bastasse isso, mudaram o visual das cidades e das personagens. Pra quê isso? A originalidade foi pro ralo junto da minha admiração pelos designs arrojados (e muitas vezes cômicos) de soldados menores.
Com excessão dos protagonistas e antagonistas, os inimigos são extremamente clichês. Nada arrojado ou estilizado como era de se esperar, apenas soldados baixos, gângsteres e monstros que exemplificam a mais pura falta de criatividade. Como se não bastasse, a HUD é desproporcional, com barras e informações que ocupam muito espaço na tela. Uma característica de game design que morreu há muito tempo, mas que a desenvolvedora Iggymob preferiu manter em pleno 2022.
O gameplay é tão limitado que Grave apenas anda, desvia, atira e bate. Não há como agachar ou usar coberturas para se proteger, excluindo qualquer possibilidade de estratégia. Seus ataques corpo a corpo também não são fluídos o suficiente para permitir combos elaborados.
Graves é um tanque humano, que anda em direção aos inimigos gastando sua munição sem dó. Mas para isso é bom você preparar os dedos: após 10 minutos de combate você estará com as mãos doendo de tanto apertar os botões de gatilho para cada disparo.
A cada acerto em inimigos ou itens destrutíveis do cenário, o contador de Beat aumenta, o que gera energia para as habilidades especiais de Grave. Ataques corpo a corpo também aumentam o Beat, além de fazer com que os inimigos fiquem tontos mais facilmente.
Enquanto tontos, os inimigos podem ser eliminados com finalizações especiais. Elas geram mais pontos para serem ganhos ao final de cada nível. Caso deixe um adversário atordoado mas distante, Grave pode usar a corrente do ataúde para puxá-los pra perto ou se lançar até ele e finalizá-lo após o impulso.
Nem sempre essa é a escolha mais sábia, uma vez que no meio dos inimigos eles podem quebrar a barra de escudo e drenar rapidamente a vida de Graves com ataques. A não ser que você tenha o suficiente para um especial ou um ataque com dano de área, para evitar ser transformado em queijo suíço.
Nostalgia sabotada
Gungrave G.O.R.E tentou tanto emular, nos dias atuais, um jogo com a vibe old school de PlayStation 2, que conseguiu errar a mão de todas as maneiras possíveis. Abriram mão do que realmente dava originalidade e características únicas ao seu enredo e identidade visual.
Eu amo os jogos antigos da franquia. Gungrave e Gungrave Overdose são cheios de estilo próprio e personagens marcantes. Até mesmo os subalternos e monstros tinham originalidade. Gungrave G.O.R.E tenta inovar, mas não consegue justamente por estar engessado no passado.
É como se pegassem um jogo como God Hand, anunciassem uma continuação, mas fizessem o mesmo visual e combate de outrora, sem tirar qualquer proveito da atual geração de consoles. Concorda que seria um tiro de bazuca no próprio pé?
Em outras palavras, Gungrave G.O.R.E não tem alma. Tal qual seu protagonista, o game é um corpo reanimado com o sangue dos títulos antigos. Mas diferente dos necrolizados, ele é mais lento, mais chato, e nada estiloso.
Esta é a prova máxima de que, sem amor e carinho na produção, jogos como esse dificilmente farão sucesso com o público atual ou de antigamente. O que é muito triste, pois sou fã e esperava outra coisa. Grave não teve uma feliz ressurreição, mas quem sabe no seu próximo despertar venha mais preparado.