Não é de agora que a Square Enix vem lançando alguns títulos desenvolvidos especificamente para agradar o público ocidental. Para ser sincero, acho esse “lado B” da empresa um tanto bizarro, considerando que várias das suas principais franquias são sucessos absolutos no ocidente, como Final Fantasy, Dragon Quest e Kingdom Hearts. O que estou querendo dizer é que eles não precisam fazer jogos “hollywoodianos” para chamar a atenção da galera por aqui, mas tudo indica que eles não pensam dessa forma.
Forspoken é mais um título dessa empreitada, desenvolvido pela subsidiária Luminous Productions e contando com vários membros do time de desenvolvimento de Final Fantasy XV na equipe. Esse é um daqueles jogos que as expectativas já eram baixas, mas o resultado conseguiu ser ainda mais decepcionante. Ele tenta misturar muitas coisas que já fizeram bastante sucesso em outras ocasiões, mas que aqui só foram implementadas de uma forma genérica e pouco interessante.
Frey no País das Maravilhas
Neste jogo controlamos Frey, uma moça que foi abandonada quando ainda era bebê e precisou lutar pela sobrevivência, seguindo o bom e velho estereótipo do delinquente órfão. Após atingir a maioridade, Frey tentou viver o sonho americano em Nova York, mas não teve muito sucesso em sua empreitada, o que a levou a mexer com as pessoas erradas. O jogo começa nesse contexto, onde escapamos por um triz de um julgamento por roubo e ainda levamos uma surra de uma gangue.
Cansada de levar porradas da vida, Frey conseguiu juntar um bom dinheiro e estava pronta para pegar sua gata (chamada Romero, um nome bem estranho para um pet) e partir para novos ares, mas acaba perdendo tudo em um ato de vingança dos criminosos com quem se envolveu. Sem casa, sem dinheiro e sem esperanças, ela se depara com um misterioso artefato que se assemelha a um bracelete, este que a leva para um mundo mágico chamado Athia, onde a ação realmente acontece.
Eu tinha a mínima expectativa de que a história de Forspoken seria ousada ou até mesmo um pouco inovadora, então imagine minha decepção ao me deparar com esse conjunto de fatores que você provavelmente já deve ter visto em algumas dezenas de filmes e jogos. Os clichês não param por aí: o mundo de Athia está sendo destruído por uma calamidade chamada de Ruptura e, adivinhem? Isso mesmo, Frey é a única pessoa imune a essa praga. Ao usar o bracelete que encontrou (que por sinal é vivo e se comunica com ela o tempo inteiro), ela ganha poderes capazes de enfrentar as ameaças daquele mundo, o que a torna a única capaz de salvá-lo da ruína. Pois é, muito original.
Não vou negar que Frey até chega a ser uma personagem carismática, principalmente porque ela é gente como a gente e isso a torna bem humana. Para mim, o maior problema foi esse protagonismo dividido entre a moça e o bracelete, cujo relacionamento é repleto de atritos nas primeiras horas de jogo. Chega a ser irritante as interações entre os dois e, após algum tempo, os diálogos começam a se repetir durante a exploração, o que torna tudo ainda pior. Não sou a favor de protagonistas mudos, mas com certeza abriria uma exceção para essa pulseira falante.
O vazio interior
Se você achou a história clichê, saiba que o jogo todo também faz jus a essa característica. Temos aqui um RPG de ação em mundo aberto que parece ter sido feito dessa forma simplesmente porque está na moda. Os gráficos são bonitos e exploram bem a parte técnica da atual geração de consoles (apesar do visual dos trailers aparentar estar bem melhor que o do produto final), mas tudo que temos aqui são vegetações e ecossistemas um tanto vazios, que embelezam os olhos, mas ao mesmo tempo não empolgam.
Você tem todo um mundo para explorar utilizando um parkour mágico que é bem legal, provavelmente sendo a melhor parte desse gameplay. A campanha não é das maiores e, se você ignorar completamente as terras ao seu redor, consegue terminá-la em cerca de 20 horas – mas serão 20 horas muito arrastadas. A lentidão com que as coisas progridem é um dos fatores mais desmotivadores de Forspoken, exigindo muita paciência e empenho do jogador.
Só para terminar o tutorial são aproximadamente duas horas, levando mais de um capítulo para isso. Quando você finalmente está solto em Athia, demora mais um bocado para desbloquear todas aquelas magias legais que vimos nos trailers. As melhores só são acessíveis para quem realmente for a fundo no jogo, realizando vários objetivos opcionais que consomem bastante tempo. A sensação que dá é que, no final, não vale a pena o esforço.
O combate não é de todo ruim, mas o mapeamento de botões consegue prejudicar consideravelmente a experiência. Nada aqui é intuitivo e você precisa ficar apertando R2 constantemente para usar as magias, então é muito fácil se perder ou manter o foco nas suas estratégias. A câmera também é um problema, este que foi herdado de Final Fantasy XV; a personagem é ágil e muitas vezes se movimenta mais rápido do que a câmera, fazendo com que ela fique meio maluca e não acompanhe mudanças bruscas.
Aliás, quando falamos em mundo aberto, não podemos deixar de levar em consideração as atividades que tornam a exploração daquele território interessante. As sidequests de Forspoken são mais um indício de que enfiaram um mapa gigante neste jogo somente porque está na moda, pois nenhuma delas tem o mínimo de capricho. Ao invés de contribuir com a lore de Athia, todas se resumem a ir até um lugar, matar uma horda de inimigos e receber uma recompensa. Mais genérico, impossível.
Eu até me interessei pela história de Athia por um tempo, principalmente se tratando das Theias, bruxas que governavam aquelas terras e, de alguma forma, estão envolvidas com o surgimento da Ruptura. O problema é que o jogo já falha em ser interessante em todos os outros aspectos e não seria diferente aqui. A maioria das informações são obtidas através de textos e documentos que encontramos por aí, então é de se esperar que a vontade de ler é zero.
Mesmo com todos esses pesares, Forspoken está longe de ser péssimo ou algo injogável, como estão pintando por aí. É só um jogo recheado de ideias clichês e uma execução ruim de praticamente tudo; quem fizer vista grossa para a maioria desses problemas ainda consegue jogá-lo numa boa – só não garanto que será divertido. Aqui jaz mais uma tentativa da Square Enix de conquistar o público ocidental.