Depois de quase um ano de exclusividade no PC, finalmente os donos de consoles podem desfrutar deste que é considerado por muitos um dos melhores RPGs já lançados. A saga Divinity possui um grande legado dentre os jogadores de PC e, apesar de Divinity II (lançado em 2009) também ter chegado ao Xbox 360, foi apenas em 2014 com Divinity: Original Sin que a franquia chegou para todos os consoles, assim consolidando a marca de vez entre todos os públicos.
Divinity: Original Sin II é a sequência do também aclamado Divinity: Original Sin e, por incrível que pareça, a Larian Studios conseguiu deixar o que já era bom ainda melhor. Se você está curioso para descobrir o que faz de Divinity um RPG obrigatório, podemos resumir que ele segue à risca tudo que compõe um RPG de mesa, e de quebra ainda possui todos os elementos que levam os fãs de RPG à loucura: ele é gigantesco, complexo, envolvente e muito desafiador.
Jogue do seu jeito
Começando pelo enredo, resumir a história deste jogo é um verdadeiro desafio, mas a ideia central é: você é um Sourcerer, uma espécie de feiticeiro que consegue controlar a energia vital de Rivellon (mundo em que se passa o jogo), chamada de Source. Apenas alguns seres são capazes de controlar essa energia e isto lhe permite conjurar feitiços e usufruir de habilidades sobrenaturais (algo bem semelhante com a Força de Star Wars). Os sete deuses desse mundo escolheram um homem (intitulado de Divino) e doaram parte de seu poder ao mesmo, para que assim ele consiga fortalecer uma espécie de barreira que separa Rivellon de um local sombrio de trevas chamado Void, habitado por infinitas criaturas monstruosas.
Os problemas começam quando o Divino morre, assim enfraquecendo essa barreira e permitindo que os monstros invadissem Rivellon. O uso de Source atrai ainda mais essas criaturas, fazendo com que os Sourcerers passassem a ser perseguidos e aprisionados para terem seus poderes removidos de seu corpo à força. Nossa jornada começa no cárcere, dentro de um navio a caminho de Fort Joy, uma prisão de segurança máxima exclusiva para Sourcerers serem “curados”. A partir daqui tudo que descobrirmos sobre a história do jogo e como ela se desenrola fica a cargo apenas do jogador, com base na sua exploração e escolha de métodos de progressão.
O primeiro passo de um bom RPG é criar o seu personagem. É impressionante como este game te dá a possibilidade de customizar absolutamente tudo, e eu não estou me referindo apenas à customização de aparência ou características faciais. Aqui você tem à disposição seis personagens principais com passado e personalidades já definidas – cada um de uma raça e classe pré-definida diferente, mas você pode alterá-lo como bem entender. Com exceção da raça e do passado do personagem, você escolhe o rosto, a classe, traços de personalidade e até mesmo a música que tocará nas batalhas, podendo escolher desde faixas com harpas e banjos até algo mais clássico, com violinos. É simplesmente incrível!
Se você quiser ter um personagem mais original, ainda pode criar protagonistas neutros, escolhendo apenas alguma raça sem nenhum passado e assim customizando sua aparência e personalidade ao seu gosto. Apesar de parecer apenas cosmético, a escolha da raça define bastante como será sua progressão no jogo, pois cada raça possui alguma habilidade única que desbloqueia novos caminhos dentro do game e remove tantos outros.
Um exemplo: os elfos podem comer carne de cadáveres para reviver as lembranças daquele defunto e descobrir segredos impossíveis de serem revelados por qualquer outro personagem; já os Lizards, os lagartos humanoides deste universo, podem cavar pontos específicos usando suas garras, obtendo excelentes itens muito cedo no jogo e revelando caminhos exclusivos. Toda essa variedade enriquece ao extremo tudo que este título tem a oferecer, instigando a curiosidade do jogador de criar vários personagens apenas para ver as ramificações que cada raça te proporciona.
Independente de qual for sua escolha, os demais personagens principais estarão presentes na sua jornada, pois assim como você, todos são Sourcerers e cruzarão seu caminho desde o princípio. Conforme você explora e avança teremos a possibilidade de recrutá-los para nossa party, e isso já entra em uma série de outras possibilidades. Primeiro: você pode escolher a classe de cada um, o que já influencia totalmente no fator estratégico do seu jogo. Se você criou um protagonista guerreiro e topar com outro guerreiro, não se preocupe, ele pode ser um mago, ou um gatuno, é você quem decide.
Segundo: os membros da sua party terão um relacionamento direto com seu personagem e desbloquearão novas linhas de história. Suas atitudes e o modo como você os trata vai definir se eles gostam ou não de você, correndo risco até de te abandonarem caso você seja odiado demais. Além disso, eles possuem quests e diálogos exclusivos que só poderemos desfrutar com o respectivo personagem na party. É realmente conteúdo que não acaba mais!
Botando a leitura em dia
Como um bom e velho RPG, Divinity possui incontáveis horas de texto. Seguindo o modo operandi de um RPG de mesa, temos um narrador observador (o Mestre, no caso) que irá narrar toda a história, mas essa narração vai além disso. Ele também narra cada detalhezinho presente nos diálogos, muitos deles imperceptíveis visualmente, como ações, sentimentos e comportamentos. É exatamente como funciona um RPG de mesa, em que o Mestre fala detalhe por detalhe do que está acontecendo naquela cena.
Falando em diálogos, pode se preparar porque Divinity: Original Sin II coloca os livros de As Crônicas de Gelo e Fogo no chinelo, se tratando da abundância de texto. Cada NPC, por mais irrelevante que seja, possui pelo menos umas 3 opções de diálogo, que desembocam em outras opções, e assim você vai descobrindo mais daquele mundo e até mesmo desbloqueando novas quests. É realmente uma quantidade absurda de leitura, e isso acaba por tornar o jogo muito denso e cansativo de se jogar por muitas horas seguidas, pois não dá pra fugir dessas conversas. Pra piorar um pouco mais, o jogo está totalmente em inglês, então quem não entende o idioma vai boiar do início ao fim e não terá uma experiência completa, o que é uma pena.
O importante de conversarmos com qualquer NPC que encontramos é que como dito anteriormente, o game possui diversos modos de ser concluído, e essas possibilidades dependem apenas da nossa exploração. Um bom exemplo disso é bem no começo da jornada, quando chegamos à Fort Joy: nosso objetivo principal é escapar da prisão, mas o jogo não vai te falar como. O forte está abarrotado de NPCs e lugares a serem explorados, e caso você seja um jogador paciente e empenhado, pode encontrar um NPC que vai te propor um plano de fuga, ou pode brincar de esconde-esconde com um garotinho, que vai te apresentar para um Undead que viveu há milênios atrás e vai te ensinar todas as rotas de fuga da prisão. É uma variedade realmente insana que torna cada jogada única.
Podemos concluir de tudo que foi dito até aqui que Divinity: Original Sin II é um jogo bem parado e com um ritmo muito lento, que requer muita exploração, muita leitura e muita paciência e interesse por parte do jogador. Se você está esperando que talvez os combates te tirem um pouco dessa “monotonia”, podemos dizer que em partes ele consegue, mas não espere nada muito dinâmico.
Transformando joystick em teclado
Divinity: Original Sin II é um RPG tático, então se você já jogou títulos como Final Fantasy Tactics e Tactics Ogre (ou até mesmo o MMO Dofus), já estará mais do que familiarizado com o gênero. Funcionando a base de turnos, esse sistema de combate leva a estratégia ao extremo: você seleciona as casas que o personagem anda, a habilidade que ele usará, o inimigo que será atacado e por aí vai, tudo dentro de um limite de pontos de ação que temos disponíveis para usar em cada turno. Quando se pega o jeito da coisa, não dá pra negar que essa é uma mecânica muito viciante, mas não é a maneira mais prática de se lutar, então não espere que as batalhas sejam rápidas, muito menos fáceis.
Mesmo tendo quatro níveis de dificuldade disponíveis – indo do explorador até o honrado (também conhecido como impossível de ser concluído) – Divinity: Original Sin II pode ser cruel nos combates, muitas vezes te colocando em situações que podem te parecer impossíveis de serem superadas. É claro que quando se é novo no jogo as chances de empacarmos em qualquer coisa são grandes, pois até nos familiarizarmos com os comandos e as habilidades do personagem pode levar algum tempo – ainda mais devido a tamanha complexidade deste título. É bem provável que você só esteja realmente familiarizado com os desafios de Divinity apenas após tê-lo concluído uma vez, ou seja, nem 50 horas de jogatina conseguem garantir que você atinja a maestria aqui.
Uma boa forma de testar suas habilidades no jogo é jogando o multiplayer online, que te coloca em batalhas de times contra outros jogadores em uma arena. É aqui que você verá se realmente entendeu como se faz, pois não estaremos enfrentando uma IA mas sim pessoas de verdade. Porém, essas batalhas PvP costumam demorar ainda mais que o normal, fora a demora de conseguirmos encontrar outros jogadores também interessados no modo. Se você ainda quiser se aventurar no multiplayer, o game também tem um co-op local onde com dois controles você assume o seu personagem e o player 2 fica a cargo de outro personagem da party. O que já era divertido consegue ficar ainda melhor, afinal duas cabeças pensam melhor do que uma.
Como ele foi feito para ser jogado no PC, com teclado e mouse, fica a questão: funciona mesmo em um joystick? É notável que a Larian fez o melhor que pôde para otimizar cada comando dentro das limitações de um joystick, afinal um teclado possui muito mais botões. As funções do mouse ficam a cargo do analógico direito, tanto a movimentação do cursor quanto o scroll down e up. O acesso aos menus e diversas outras coisas ficam a cargo de vários sub-menus acessíveis por todos os botões disponíveis, então vai ser uma confusão sem fim até que você consiga se acostumar com tudo isso e parar de apertar os botões errados.
O contra de tudo isso é que mesmo sendo muito bom termos este título disponível nos consoles, ele acaba não sendo tão prático de ser jogado no mesmo. Um jogo tão complexo, com tantas funções, construído originalmente para PC acaba se tornando confuso e ainda mais complexo quando substituímos o teclado e o mouse por uma dezena de botões. Nas batalhas, por exemplo, o modo como usamos itens e skills é torturante: primeiro apertamos um botão para abrir a barra de utilizáveis, depois apertamos para o lado até selecionar o slot desejado, selecionamos o mesmo e, para enfim concluir a ação, devemos arrastar o cursor até o personagem que desejamos afetar. É uma trabalheira sem fim que funciona infinitas vezes melhor com um mouse, onde só clicamos na skill, arrastamos pro personagem e é isso.
Os gráficos do jogo são bem agradáveis, e mesmo não sendo extremamente realistas ele não faz feio no quesito visual – ainda mais porque a câmera é predominantemente isométrica, então como todos os elementos ficam longe da visão do jogador tudo fica mais bonito. A trilha sonora é belíssima e digna de um RPG dos bons, onde como já foi dito podemos até escolher a música tema de batalha do nosso personagem. Esse é o tipo de jogo que vai te fazer buscar a trilha sonora na internet depois.
Pra fechar esse pacotão completo, a Definitive Edition vem com todas as DLCs lançadas para o jogo já inclusas, sendo elas a Divine Ascension, que apenas acrescenta algumas coisas como artbook e trilha sonora digitais, e a Sir Lora the Squirrel, que adiciona um companheiro de party inédito: um guerreiro esquilo que cavalga no esqueleto de um gato. Depois de ler tudo isso, não há mais discussão sobre a dúvida de adquirir ou não Divinity: Original Sin II. Você não precisa ter jogado o primeiro para jogar este, e ele ainda garante mais de 100 horas de jogatina para quem for corajoso o bastante para caçar o 100%. Um RPG obrigatório para todos os RPGzeiros consolistas de plantão.