A melhor parte de poder retornar para Lordran e reviver o incrível cânone de Dark Souls é poder jogar o título responsável por acender a chama (olha a piadinha logo de início) ao popularizar um novo gênero. Essa oportunidade em retornar ao que pode ser considerado o início do tipo de game conhecido por “Souls-like” faz com que eu regresse com mais idade, mais conhecimento desse estilo e até mais confiança para encarar tal sucesso a ponto de escrever essa crítica com muito mais propriedade. Tal responsabilidade me deixou muito feliz e ao mesmo tempo numa saia justa imensa, pois deixar o lado de fanboy adormecido para realmente enxergar algumas limitações desse lançamento talvez seja mais difícil do que enfrentar Ornstein e Smough! Então vamos lá…
Lá e de volta outra vez
Quando todos esperavam por anúncio de um novo Tenchu ou até mesmo Bloodborne 2, após o teaser revelado pela FromSoftware, os fãs foram surpreendidos por Dark Souls Remastered. A euforia inicial de ter uma versão com upgrades visuais e com possibilidades de melhorar os defeitos do título original fizeram com que eu e muitos outros jogadores se empolgassem em jogar mais uma vez a obra de Hidetaka Miyazaki.
O problema disso tudo foi ver que a Bandai Namco seguiu com o que parece mais um upscale dos gráficos, como se estivéssemos assistindo a um DVD em uma TV 4K. Tudo bem que os cenários ficaram mais bonitos, as texturas e iluminação parecem de um jogo feito para a nova geração e tudo isso contribui imensamente para o gameplay. Afinal, o excelente trabalho de level design que a franquia possui acaba sendo engrandecido por conta de uma melhor definição visual dos caminhos, passagens, buracos e até mesmo nas armadilhas que estão dispostas apenas para causar uma morte surpreendente e desagradável.
Na minha opinião, o grande problema é termos Dark Souls Remastered muito próximo do original e apoiando apenas nos gráficos e na melhoria do frame rate, que finalmente possibilita girar a câmera ou rolar sem ver um borrão pixelado na TV. Tudo fica mais bonito e fácil quando temos um jogo rodando a 60 fps e em 1080p no PS4 e Xbox One (porém apenas a 30 fps e 720p no Nintendo Switch). A maior limitação para esse remaster foi ter o seu desenvolvimento feito pela QLOC, desenvolvedora famosa por trabalhar com a CAPCOM em diversos títulos, e não pela FromSoftware. Por exemplo, um dos primeiros glitches que tivemos lá no início da década continua acontecendo sete anos depois! Na mesma hora parei e fui procurar por mais vídeos que resgatavam esses problemas, que vão desde congelamento do jogo, corpos invadindo paredes a modos de burlar o jogo com erros de gameplay (como ir de Firelink Shrine para Sen’s Fortress passando por dentro das paredes da fortaleza).
Para a minha surpresa, essa versão remastered simplesmente ignorou muitos dos diversos erros que o jogo original possui e simplesmente apertou um botão de “embelezar”, virando as costas para detalhes que os gamers sempre pediram. A lista de melhorias que a Bandai Namco divulgou como atrativos e diferenciais, que até podem apresentar diversos pontos interessantes, acaba sendo esquecível com quebras que realmente atrapalham a experiência (de novo!). Talvez o Remastered que vem gravado na caixa do jogo pudesse ser trocado por um simples “Ported” e sem a desagradável cobrança muito próxima de um jogo AAA de 2018, por 39 dólares! Se fosse um remake, quem sabe? Está aí Shadow of the Colossus, que mantém a mesma proposta e entrega melhorias gráficas bem maiores, mostrando que essa é uma oportunidade desperdiçada pela Bandai.
Praise the sun!
Nem tudo está perdido para quem quer se aventurar novamente como um Undead em busca do seu legado como o sucessor de Gwyn e de reacender o fogo primordial. Essa nova edição já vem com o conteúdo extra Artorias of the Abyss, inicialmente vendido como DLC, e melhorias de multiplayer que foram bem aceitas em Dark Souls 3: seis jogadores simultâneos ao invés de somente quatro, implementação de senha para jogadores invocados no modo online, nivelamento de levels pelo host do jogo e algumas novidades para PvP mais honestos, como recarregar Estus após vencer um fantasma invasor. Todas essas implementações foram fruto do sucesso dos demais títulos que compõem a franquia, mas que infelizmente não passaram pela mente brilhante de Hidetaka Miyazawa para ver o seu trabalho original ser mantido ou até mesmo otimizado nessa nova oportunidade; como ele mesmo já disse em entrevista, Dark Souls era para ser único e não como foi tratado (em três capítulos).
Tirando as expectativas, você terá tudo o que pode esperar daquele que sucedeu Demon’s Souls e expandiu para um nível superior. Uma jogabilidade melhorada por conta do frame rate e deixa ainda mais claro o quanto esse jogo é difícil, sendo recompensador pelo aprendizado por meio da punição. Você também perceberá melhor os locais, fazendo com que Anor Londo e Blighttown sejam mais belas ou mais próximas do que vemos no terceiro jogo, além dos chefes ficarem ainda mais bonitos; afinal o gore que a direção de arte possui e o design dos inimigos acabam sendo únicos e ainda mais belos nessa nova geração.
O sentimento nostálgico colabora, mas o esforço do trabalho de iluminação aproxima o jogo ao que vimos no último título lançado; as magias e golpes monstruosos de cada chefe impressionam e fazem o coração palpitar ainda mais rápido com aquela aflição e urgência para evitar a morte quase certa. Todo esse sentimento e experiência são únicos, fazendo com que nenhum outro jogo que nasceu desse gênero como, por exemplo, Nioh ou The Surge, consiga chegar aos pés da sensação prazerosa de derrotar um inimigo. Isso sem contar a maestria no level design que eu nunca mais vi em nenhum outro jogo, pois diferente até mesmo de Breath of the Wild, Lordran oferece cenários belíssimos ao mesmo tempo em que proporciona diversas formas de exploração, incluindo maravilhosas punições para os mais desavisados.
Então surgiu o fogo…
Aproveite o esforço da Bandai Namco em trazer o jogo original em português (textos e legendas) para reacender a chama em seu coração ou crie coragem de embarcar nessa jornada por Lordran contra hollows, demônios, dragões e lordes para vivenciar e experimentar algo único.
Será uma das poucas vezes que você vai chorar e xingar por morrer e fracassar dezenas de vezes, mas ao conseguir completar um cenário ou vencer um chefão, você será inundado por uma satisfação imensa e uma sensação recompensadora que nenhum outro jogo vai proporcionar. Tudo bem que isso pode custar pelo menos 150 reais, mesmo sem ser um jogo totalmente novo e ainda repleto de glitches, mas que no fim tudo acaba compensando. Tudo isso para PC, Xbox One e PS4 – menos para o Nintendo Switch, que ganhou uma versão semelhante à da geração passada e que não vale o investimento nem por essa chuva de sensações gratificantes!