Já houve uma época em que eu me empolgava mais com jogos de tênis e golfe, especialmente os da linha Mario, que sempre foram os meus preferidos. Com o tempo, o excesso de poderzinhos e modos malucos não pareciam conseguir sustentar esse tipo de jogo, que foi cada vez mais perdendo o brilho. Nem mesmo Mario Tennis Aces e Mario Golf: Super Rush conseguiram me arrancar um sorrisinho, então acabei chegando à conclusão de que não existe mais nada que possam fazer para deixar um jogo de golfe interessante de novo.
Eis que eu estava errado. O estúdio Chuhai Labs conseguiu me provar que ainda é possível sim impressionar com um jogo de golfe – e que nem é preciso se esforçar tanto para isso. Cursed to Golf, seu mais novo lançamento, traz uma premissa até então inexplorada não só dentro dos títulos baseados no esporte, mas também no gênero em questão: temos aqui um roguelike de golfe! Se parece maluco só de ler, é porque é mesmo, então vamos descobrir juntos se essa maluquice deu certo.
Jogando até a morte
Em Cursed to Golf, controlamos um simpático golfista que está prestes a vencer um grande campeonato e se consagrar como uma lenda do esporte. Infelizmente, não era para ser e, bem na hora de acertar sua última tacada para a glória, ele é atingido por um raio e acaba morrendo. Para sua sorte (ou azar), ele é enviado para o lugar onde todo golfista caído vai parar após perder a vida: o purgatório do golfe, onde terá a oportunidade de encarar um desafio insano para escapar do seu destino fatal.
Esse desafio consiste em vencer uma sequência de 18 buracos no purgatório, mas não é tão simples quanto parece. O lugar possui percursos absurdos, repletos de obstáculos e forças sobrenaturais que nos prejudicam de alguma forma. Se perder, nosso pequeno golfista volta para o início e terá de enfrentar uma nova sequência de buracos, pois eles estão em constante mudança, então o desafio nunca será o mesmo. Resumindo: isso que é um roguelike de golfe.
Convenhamos que, só nesta proposta, o jogo já entrega muito mais do que qualquer um de nós é capaz de esperar. Seguindo a tradição punitiva dos roguelikes, ele não pega leve com o jogador em nenhum momento e é cheio de regras que dificultam nossa vida (ou morte, no caso). Para começar, temos um número limitado de tacadas para chegar até o buraco e é simplesmente impossível conseguir esse feito com essa quantidade inicial. Você é obrigado a acertar alguns ídolos que garantem tacadas extras no caminho ou usar outros truques para expandir suas tentativas – e muitas vezes, nem isso é suficiente!
Outra grande dificuldade é ter uma noção de onde a bola vai parar após sua tacada. O jogo tem uma mecânica chamada de “câmera de passarinho”, onde você pode observar livremente o percurso para saber o que vem pela frente. Porém, na hora de avançar com a bola, você não enxerga o que está além da tela (pois esse é um jogo de golfe sidescroll, ou seja, é tudo em 2D), então toda tacada é praticamente um Hail Mary do futebol americano: joga para o alto e reza. Existem três tipos de tacos diferentes, sendo um de longa distância, outra de média e o último para curtas. Você precisa aprender a usar cada um na hora certa para se dar bem neste jogo.
Masoquismo puro
Até aqui, já deu para ver que esse é um jogo fácil de jogar, mas muito difícil de dominar, não é? O pior é que ele continua enfiando outras mecânicas que precisam ser muito bem exploradas para superar cada percurso, então mesmo sendo todo fofinho e amigável, ele não é brincadeira de criança. Falando no visual, não dá para deixar de elogiar o pixel art incrível deste jogo, extremamente detalhado e muito bem animado. Combina perfeitamente com a proposta de ser 2D, então acho que tudo aqui foi escolhido a dedo para fazer deste um game de golfe totalmente fora da caixinha.
Além de todas essas regras e mecânicas já citadas, nosso golfista ainda conta com algumas cartas na manga… literalmente. Através do fantasma de outro atleta preso no purgatório, conhecido como O Escocês, podemos adquirir cartas (distribuídas pelo velho esquema de loot box) que garantem algumas vantagens nos percursos, quando ativadas. Seus efeitos variam muito, desde fornecer tacadas extras até desacelerar o tempo ou controlar o percurso da bola no ar. São bastante úteis, mas só podem ser usadas no momento que foram ativadas, então é preciso apreciar com moderação.
No começo, a gente realmente acha que está tudo perdido e que não vamos nem conseguir passar do primeiro buraco, mas por incrível que pareça, as coisas fluem! Se você entender bem tudo que for explicado no tutorial (que é bem longo, por sinal), já é possível vencer alguns percursos logo na primeira tentativa e daí você vê que Cursed to Golf não é tão impossível quanto parece. É claro que ele é realmente muito difícil e você vai fracassar incontáveis vezes, mas ele é tão viciante que, mesmo sem nenhuma esperança de chegar até o final, você quer continuar jogando.
O fator replay é altíssimo e é praticamente impossível dizer a duração do jogo. Alguns buracos podem ser superados em 5 minutos e outros podem levar mais de meia hora, algo que também é imprevisível, já que as coisas sempre mudam de lugar. Com algumas tentativas de ascensão (como são chamadas as runs neste jogo), você começará a perceber alguns padrões e notar que, muitas vezes, o mapa não muda tanto assim, apenas alguns detalhezinhos – mas ainda não deixa de ser difícil. É masoquismo puro, mas definitivamente consegue nos manter presos naquele loop.
Cursed to Golf é surpreendentemente excelente. É um jogo 2D de golfe com mecânicas sólidas e funcionais, altamente desafiador, bonito até não poder mais e o melhor: que consegue divertir e te prender por muito tempo. Eu já nem sei qual foi o último título do gênero que conseguiu me conquistar dessa forma, mas esse aqui nem precisou de muito para isso. Se no purgatório tiver golfe, eu estou dentro!