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Os mais novos podem não saber, mas houve uma época onde os arcades de luta faziam grande sucesso no Brasil. Era fácil trombar com uma máquina da SNK ou Capcom em bares de esquina. Quando nossas mães nos mandavam comprar algo na padaria nós íamos felizes, pois sabíamos que o troco do pão se transformaria em fichas de fliperama logo mais. As máquinas ficavam lotadas na “hora da saída” das escolas, a galera inseria ficha atrás de ficha e partia para o contra sem nem mesmo perguntar antes. Como era bom ouvir o barulho da ficha caindo pra dentro da máquina fazendo com que a mensagem “Press Start Button” aparece quase que milagrosamente na tela.

Se você nasceu nos anos 80 ou antes, deve se lembrar dos seguintes arcades: Street Fighter 2, Samurai Showdown, Tartarugas Ninja, Fatal Fury, The King of Fighters, The Simpsons, Killer Instinct, The Xmen, Double Dragon, Art of Fighting, Mortal Kombat, entre outros. Só de citar esses nomes minha memória já começa a processar mil coisas ao mesmo tempo. Era de uma ansiedade tão infantil saber que eu teria dinheiro para uma única ficha e que há qualquer momento alguém poderia chegar do meu lado e me desafiar e, devo ser sincero, as possibilidades de eu perder aquela ficha eram muito grandes. Sempre fui ruim e descoordenado, mas isso não vem ao caso.

Infelizmente, por vários motivos, o arcade foi perdendo seu espaço. Para mim, um dos principais motivos foi à chegada dos consoles caseiros mais acessíveis. Na era do Playstation, as pessoas já não frequentavam mais os arcades. Contudo, o problema maior não está na troca de plataforma, mas na ruptura que a tecnologia causou em um gênero que dominava os fliperamas: os jogos de luta. Eu sinceramente não perdia muito tempo com jogos de plataforma, embora existissem alguns muito bons, como o famoso Ghosts ‘n Goblins da Capcom. Mas o barato era bater na cara e dar Fatalities! Talvez pela demanda ser tão grande, o nível dos jogos de luta lançados era espetacular. Em um intervalo de dois ou três anos vimos grandes franquias como Mortal Kombat, Samurai Showdown e King of Fighters nascerem. Empresas como Capcom e SNK eram grandes rivais na criação do jogo de luta definitivo e nós, os jogadores, saíamos sempre ganhando.

Com o passar do tempo, a tecnologia começou a possibilitar a inserção de novos gêneros no mercado. Após o surgimento dos jogos em 3D e dos consoles com mais memória, gêneros como o de aventura e RPG começaram a fazer grande sucesso. Os arcades de luta começaram a se esvaziar e a demanda por outros estilos aumentou. Além disso, a tendência do 3D acabou banalizando um estilo antes dominado por muita criatividade e arte. Grandes novas franquias de luta chegaram como Tekken e Virtua Fighter, mas junto com elas uma grande onda de jogos de luta medíocre também apareceu. Foi nessa época inclusive que a SNK começou a dar sinais de fraqueza e resistência ao novo padrão estabelecido pela “geração Playstation”. Tivemos até Street Fighter em 3D e acredite, o jogo era ruinzinho. Até a Capcom com seu excelente padrão de qualidade teve tropeços nesta nova fase.

Sem contar mais com o espaço que antes ocupavam sem preocupação, os jogos de luta passaram por uma época de provação no início do novo século. Não que o gênero estivesse completamente esgotado, mas a oferta de qualidade com certeza era bem menor que a dos anos 80 até meados dos anos 90. Basicamente tínhamos a Capcom lançando seus novos e muito bem recebidos Cross-overs (X-Men vs Street Fighter, Marvel vs Capcom) e a Namco com suas franquias em 3D de sucesso (Tekken, Soul Edge/Calibur) mas que envelheciam mal a cada ano que passava.

Agora eu pergunto o que mudou de um ano para cá? Perceberam como os jogos de luta voltaram ao topo? Mas por quê? Por que Street Fighter IV foi e ainda é um sucesso tão grande? Por que todo o hype para o novo Mortal Kombat? Tekken vs Street Fighter!? Que idéia genial! Marvel vs Capcom 3 talvez seja o jogo mais aguardado de 2011. De onde está vindo todo esse investimento em jogos de luta? O que mudou? Por que de uma hora para outra, os jogos mais aguardados do próximo ano pertencem a este gênero?

Eu tenho uma teoria e como sempre, compartilhá-la-ei. Na verdade, é uma teoria que se resume a uma expressão muito conhecida atualmente pelos jogadores: Ranked Matches. O advento dos multiplayers online e das partidas rankeadas traz de volta o sentido de competição frenética antes existente nos fliperamas. Mesmo que o jogador consiga jogar lado a lado com amigos em sua casa, a sensação de um completo estranho te desafiar estava de fato esquecida. Aquela noção de “melhor do bairro” agora foi ampliada. Você pode ser o melhor do mundo e saber disso. Você pode não ser o melhor do mundo, mas pode desafiá-lo. Você pode não ter coragem de desafiá-lo, mas pode vê-lo em ação. Como quando ficávamos na ponta dos pés para ver aquele racha entre dois marmanjos no fliperama ali no bar da rua de trás.

Multiplayers online são muitas vezes criticados por nivelar o modo single player por baixo como uma fachada para o que realmente importa, as partidas online. Muitas vezes eu mesmo levanto essa bandeira. Mas com jogos de luta, a competição online não poderia ser mais bem aplicada. Talvez este seja o gênero mais adequado ao suporte online. Aliás, não tenho dúvidas disso. Atualmente, um jogo de luta sem suporte online, está fadado ao fracasso.

Como sabemos, uma coisa leva a outra. Ao estabelecer que a boa competição online favorece as vendas, os desenvolvedores começaram a olhar para trás. “O que fazia com que uma pessoa gastasse dinheiro comprando centenas de fichas durante o ano para jogar nossos jogos?”. Essa deve ter sido a pergunta que os criadores e produtores do novo Mortal Kombat tenham feito a si mesmos antes de começar a pôr a mão na massa. Claramente eles olharam para trás e tentaram enxergar o que os criadores de Street Fighter já enxergam há algum tempo.

O que importa em um jogo de luta não é a tecnologia aplicada. Não importa se estou em um jogo 3D, 2D ou 2.5D. O que importa é que haja competição justa onde os personagens tenham características distintas, mas equilibradas entre si. O que importa é termos personagens bem desenvolvidos, carismáticos com golpes bem desenhados. O que importa é que o jogo tenha uma característica única, que não iremos encontrar em nenhum outro jogo no mercado. Esta última talvez tenha sido a característica mais esmagada nos últimos anos com o advento dos jogos de luta em 3D. Todos pareciam o mesmo jogo, com a mesma mecânica de quicar os inimigos no ar e apertar os botões de forma aleatória até que finalmente um jogador perdesse.

Felizmente estamos vivendo um renascimento do gênero. É chegada a hora de economizar no troco do pão novamente. É chegada a hora do frio na barriga antes da partida contra o “bonzão do bairro”. É chegada a hora de treinar a finco com um personagem só. É chegada a hora de voltar para os arcades, mesmo que seja dentro de nossas próprias casas.

E que venha 2011! Até lá.