Desde o anúncio do remake de Silent Hill 2, a Bloober Team vem enfrentando um misto de excitação e ceticismo pela responsabilidade em trazer uma nova versão de um dos maiores clássicos do survival horror, que marcou uma geração de gamers. Mais de duas décadas depois, a Konami acertou ao reviver os pesadelos de James Sunderland nessa atualização e reinvenção para a nova geração.
Pelas mãos da Bloober Team, famosa por Layers of Fear e o morno The Medium, os desenvolvedores demonstraram extrema capacidade em criar a atmosfera opressiva, claustrofóbica e amedrontadora capaz de explorar o lado mais obscuro, mantendo a essência do jogo original de PlayStation 2. Esse remake consegue preservar a trama ao mesmo tempo em que atualiza a jogabilidade e amplia os desafios para engrandecer ainda mais a construção narrativa do jogo, fazendo com que os horrores psicológicos criem uma experiência ainda mais impressionante.
Fiel as suas raízes ou ambicioso demais?
O essencial para quem está interessado em Silent Hill 2, sejam novos jogadores ou para quem já jogou anteriormente, é saber de que temos um novo jogo e não apenas uma atualização “um para um”, sem alterações. Prepare-se para enfrentar um novo desafio com aquele gostinho de familiaridade, inclusive permitindo ao próprio jogo ironizar esse conhecimento obtido através do jogo original. Vamos novamente embarcar na jornada de James à cidade de Silent Hill após receber uma misteriosa carta de sua esposa, falecida há três anos. Através das ruas sob a densa neblina e buscando resolver enigmas, você conhecerá personagens intrigantes enquanto enfrentará os horrores psicológicos que ressignificam os pecados do protagonista em meio aos desafios de um título survival horror que conseguiu inovar dentro de sua própria fórmula.
Refazer os caminhos anteriores nos levam aos diversos easter eggs deixados pela Bloober Team como, por exemplo, o mapa original de Silent Hill e a roupa original de Maria, ao mesmo tempo em que brinca com a expectativa dos jogadores familiarizados com o jogo, surpreendendo com a maneira em que os puzzles se desenrolam, a maneira como os personagens reagem a essa nova versão e, principalmente, a resposta visual do jogo ao encontrarmos o local de resolução para algum quebra-cabeça original. A adição de fotos polaroid para serem coletadas também acrescentam uma cada extra de entendimento dessa narrativa, tudo muito conectada à história de Silent Hill 2
Por mais que a estrutura do jogo se mantenha a mesma, inclusive na ordem em que você visitará os principais locais da cidade em busca de Mary, Maria e Laura, sem contar seus encontros com Angela e Eddie, os desenvolvedores conseguiram preencher os momentos icônicos com um jogo que mantém seu engajamento e interesse sempre em alta. Saem as ruas que funcionam como corredores para você correr, desviar das criaturas e coletar itens pelo chão, para locais ameaçadores e que conectam os principais ambientes do jogo, inclusive com novos locais para visitar, colecionáveis e puzzles novos.
Falando em criaturas, Silent Hill 2 conseguiu renovar a maneira como os inimigos sejam ameaças presentes durante o jogo inteiro. Se no original os maiores desafios eram apenas os chefões, com atenção voltada apenas para a história e os quebra-cabeças, nesta nova versão o jogador precisa se manter em alerta para enfrentar um simples Lying Creature ou tomar cuidado para não morrer para uma das várias Mannequin. Se colocarmos as famosas Bubble Head Nurse na equação, com certeza os chefões talvez não sejam sua principal preocupação nesse jogo, pois a cada corredor você pode ser atacado mortalmente.
O Pyramid Head continua ameaçador, assim como as demais principais ameaças da história e principalmente o último chefe, com suas várias fases, que reforçam o trabalho da Bloober Team para reimaginar totalmente o combate de Silent Hill 2. Esqueça a mira automática para exigir calma e precisão ao usar sua arma de fogo, sem contar que James não conseguirá derrotar uma criatura ao apertarmos loucamente o botão de ataque corporal, pois os inimigos se movem pelos cenários, desviam da mira ou durante os ataques, recuam e até se escondem de você, tudo isso para conseguirem atacar e contra-atacar quando você menos esperar. Um combate inteligente, divertido e agradável em meio ao ambiente aterrorizante dos ambientes claustrofóbicos e escuros.
Um clássico atualizado para ser eternizado
Lembra do rádio e a estática para usarmos como “radar de inimigos”? Seu uso aliado ao DualSense ficaram ainda mais interessante, pois ele continua auxiliando durante o jogo ao mesmo tempo que não impede surpresas e os muitos jump scares ao longo das quase 20 horas de jogo. Nesse quesito, o remake reitera o cuidado em seu desenvolvimento, pois a trilha sonora é maravilhosa (obrigado Akira Yamaoka por ter retornado) e contribui imensamente para a imersão, conseguindo criar aquele sentimento de angústia e medo, preparando o jogador para a reação merecida para cada ocasião, seja de novo, repulsa, susto ou medo. O trabalho de mixagem de sons também valoriza cada barulho ao redor, criando uma atmosfera ainda mais opressora.
O trabalho na reconstrução visual em Silent Hill 2 é impressionante. A câmera sobre o ombro mostra perfeitamente a cidade, tudo muito bem detalhado e representado visualmente, sombria sob a densa névoa e ainda mais decrépita e ameaçadora no Otherworld, contrapondo os ambientes escuros e medonhos dos locais fechados. O Hospital Brookhaven, a Prisão de Toluca e o Hotel Lakeview são horripilantes e brilhantemente construídos para carregarem a proposta da franquia, valorizando o horror e aumentando ainda mais o terror psicológico que acompanha James.
Todos os personagens foram refeitos e agora possuem cenas melhores trabalhadas, que fazem sentido com a construção narrativa e justificam muitos pontos da história com diálogos que complementam o que já existia anteriormente. Masahiro Ito também retorna para dar uma nova vida às criaturas, reimaginando para a nova geração como enfrentar esses pesadelos de James, que agora fazem ainda mais sentido ao interpretarmos as entrelinhas do jogo. Tudo é horrivelmente belo e muito bem trabalhado visualmente!
No PC, o horror fica ainda mais imersivo
Testamos Silent Hill 2 também na versão de PC, graças à um código cedido em parceria com a NVIDIA. Tudo que podemos afirmar é que o visual do jogo fica muito mais imersivo se puder rodar em uma placa de vídeo atual. Utilizamos uma GeForce RTX 4070 Super rodando em 1440p, Ray Tracing ligado, DLSS no modo qualidade e as predefinições de qualidade de renderização em épica. A média de FPS variou de 65 a 85, se mantendo a maior parte do tempo em torno de 70. Dá para obter resultado semelhante de FPS em resolução 4K se deixar o DLSS no modo balanceado, caso prefira obter maior nitidez de imagem.
Nota-se uma qualidade insana na névoa, que engole a cidade resort de um jeito nunca visto antes nos games. Reflexos em vidros, espelhos e poças d’água fazem muita diferença na imersão, um aspecto técnico turbinado pelo Lumen da Unreal Engine 5 quando renderizado pelo hardware da GPU. A incidência de luz da lanterna de James sobre os diversos objetos dos cenários também ajuda a criar uma atmosfera mais detalhada e crível. Em ambientes fechados e engolidos pela escuridão rola um certo alívio na performance, mas não por muito tempo. Por se tratar de um jogo feito na Unreal Engine fica difícil de escapar dos “stutterings”, engasgos que ocorrem principalmente por conta do carregamento de áreas e objetos em segundo plano, conforme o jogador explora o cenário.
Outro detalhe que incomoda é a taxa de frames na animação de tecidos em movimento (cortina, bandeira, etc), travado em 30 FPS. As cutscenes também (mas de propósito), seguindo o estilo do game original de PS2, e ainda assim não escapam do stuttering. Ou seja, não adianta ter o PC da Nasa quando o problema está na engine. O jeito é esperar os patches para resolver este e outros problemas – alguns deles já solucionados pela comunidade de modders.
Desfechos inéditos
Com dois novos finais, totalizando oito encerramentos possíveis para a história de James e Mary, Silent Hill 2 consegue alcançar um novo patamar de remakes, entregando um jogo que se tornou a melhor surpresa de 2024. Uma nova interpretação de uma história já consagrada como um clássico dos games, reimaginando como vivenciar essa experiência por uma cidade medonha e a maneira como enfrentamos todos as ameaças, passando por ambientes maravilhosamente horripilantes e resolvendo puzzles familiares, mas que ganharam novas roupagens e se expandiram para se conectarem ainda mais com a narrativa.
A Bloober Team e a Konami conseguiram superar todas as expectativas com um novo/velho jogo de survival horror que a nova geração merece e precisava.
Prós:
🔺 A história de Silent Hill 2 ficou mais compreensível
🔺 Visual todo retrabalhado, mas fiel ao game original
🔺 Trilhas e ambientação sonora aprimorados
🔺 O combate melhorou muito com a nova câmera
🔺 As criaturas agora oferecem desafio elevado
🔺 Conexões entre Silent Hill e Otherworld melhor construídas
🔺 Diversos easter eggs ao longo do jogo
🔺 Longa duração e alto fator replay
Contras:
🔻 Pequenos problemas de câmera ao entrar com Maria em locais apertados
🔻 Criaturas com glitches raros ao interagirem com o ambiente
Ficha Técnica:
Lançamento: 08/10/24
Desenvolvedora: Bloober Team
Distribuidora: Konami
Plataformas: PC, PS5, Xbox Series
Testado no: PC e PS5