Quando vi o trailer de A Space for the Unbound em uma Nintendo Direct, me senti atraído logo de cara pelo seu pixel art maravilhoso e pelo fato do jogo se passar na Indonésia, um país que dificilmente recebe atenção dentro dos videogames. Imaginem minha surpresa quando comecei a jogá-lo e me deparei com uma história que aborda assuntos pesadíssimos como depressão, ansiedade e até mesmo tendências suicidas.
Esse não é o primeiro jogo que trata desses assuntos delicados, mas adorei a forma sutil com que ele coloca tais temas na mesa. Em uma narrativa um tanto misteriosa e que, por vezes, parece não levar a lugar algum, teremos a oportunidade de viver um drama adolescente cuja maior parte dos acontecimentos são completamente banais – mas com o adendo de alguns poderes sobrenaturais, para deixar tudo mais divertido. No final, A Space for the Unbound acaba sendo um jogo sobre a vida!
Uma vida normal
A história se passa no fim dos anos 1990 e é ambientada em uma cidadezinha rural situada no interior da Indonésia. Aqui assumimos o papel de Atma, um adolescente que está se aproximando do fim do ensino médio e, junto com sua namorada Raya, está passando por aquela clássica crise existencial em que não sabemos o que diabos vamos fazer da nossa vida. No começo tudo parece normal até demais: você dá aquela escapadinha da escola, vai ao cinema com a cremosa, cuida de gatinhos na rua e coisas do tipo. Contudo, logo as coisas começam a ficar um pouquinho estranhas.
Não demora muito para descobrirmos que tanto Atma quanto Raya possuem poderes. Atma tem um livro mágico capaz de entrar no coração de uma pessoa e descobrir tudo que está lhe afligindo naquele momento. Já Raya é ainda mais poderosa, podendo criar mundos inteiros e moldar a realidade de acordo com sua vontade. Juntos, esses dois podem fazer praticamente qualquer coisa, mas na realidade tudo isso serve só como um pano de fundo para representar o principal tema abordado no jogo (que seria a depressão, como já citado).
A Space for the Unbound é um adventure focado em narrativa, bem semelhante aos clássicos point and click dos anos 1990 – mas sem a parte de apontar e clicar. Aqui você tem um jogo sidescroll onde seu único objetivo é andar por aí, conversar com pessoas, interagir com objetos e resolver puzzles de leva e traz de itens. É um daqueles jogos bem parados, cheios de textos e que de vez em quando colocam um minigame para o jogador acordar. O que realmente importa é que ele ainda faz bonito dentro da sua proposta.
Em busca da paz interior
As “fases” de A Space for the Unbound se dividem entre o cotidiano e o surreal. No dia a dia, faremos coisas rotineiras que você provavelmente também faz na vida real, enquanto o surreal seria o momento que usamos os poderes dos protagonistas, podendo explorar mundos estranhos e situações malucas. Em muitos casos, seremos colocados em ocasiões que, para conseguir um determinado item, devemos ajudar uma pessoa a alcançar sua paz interior. Para isso, Atma deve usar seu livro para descobrir o que está perturbando aquele indivíduo e fazer o que for necessário para acalmar seu coraçãozinho.
É nesse contexto que somos introduzidos a diversas situações totalmente críveis, que podemos nos identificar ou conhecer pessoas que já passaram por isso. Existem muitos motivos que podem levar uma pessoa a desenvolver um quadro depressivo e o jogo costuma apresentar essa perspectiva de vários ângulos. Ao mesmo tempo, ele também nos mostra que a verdadeira felicidade está nas pequenas coisas da vida, em compartilhar momentos de alegria ao lado daqueles que amamos. Quem jogar até o final certamente terá muito o que refletir.
Com seu visual de encher os olhos, fica muito mais fácil se apegar aos personagens e às histórias individuais de cada NPC com que nos deparamos. A ambientação também é incrível, fazendo a gente se sentir dentro daquela cidadezinha interiorana. A Space for the Unbound nos dá a oportunidade de conhecer um pouco mais da cultura da Indonésia, incluindo muitas referências que, para nós, são difíceis de entender. Além da bela representação do seu país natal, o estúdio Mojiken também fez pequenas homenagens a várias nações, incluindo o Brasil! Em um certo momento do jogo, você poderá encontrar um grande craque do futebol brasileiro, então fique de olhos nas ruas.
A Space for the Unbound te dá a oportunidade de relaxar nas situações mais simples da vida de um adolescente, ao mesmo tempo que te sufoca com os diversos fantasmas que podem atormentar a mente de uma pessoa. Não é um daqueles jogos que a gente joga buscando um gameplay divertido e frenético, mas sim uma experiência com uma grande mensagem nas entrelinhas. O único grande problema fica a cargo da localização em pt-br, que apesar de incluir diversas “gírias” modernas, muitas vezes peca na contextualização e, consequentemente, no sentido da coisa (em sua maioria, pela adaptação equivocada de algumas expressões estrangeiras).
Ao longo das suas 10 horas de duração, você pode ou não ser tocado pelas aventuras de Atma e Raya, mas o mais importante é que consiga entender que a vida não é feita somente de bons momentos e, mesmo quando tudo parecer perdido, sempre é possível se reencontrar em meio ao caos. É um jogo para poucos, mas a mensagem é para todos.