Ninguém segura a Capcom. Desde o excelente Resident Evil 7: Biohazard, a produtora japonesa só vem lançando jogão. E muito disso se deve à nova engine gráfica proprietária, a RE Engine. O remake de Resident Evil 2 também foi feito com ela e agora com Devil May Cry 5 o resultado impressiona ainda mais: além do visual incrível, reinventaram o gênero hack and slash introduzindo ideias inéditas.
Caso nunca tenha jogado os games da franquia, dá sim pra curtir esta continuação direta de Devil May Cry 4 sem ficar perdido. Há inclusive um vídeo de História do DmC pra assistir no menu inicial, que faz um resumão de tudo que rolou nos games anteriores. Hideaki Itsuno, diretor de Devil May Cry 2, 3 e 4, assina novamente o game junto do roteirista Bingo Morihashi, que criou o Nero.
Ninguém é páreo para o rei do submundo
Na trama, o caçador de demônios Nero abriu sua própria agência Devil May Cry em uma van e passou a usar um braço protético robótico chamado Devil Breaker, criado por sua parceira e engenheira habilidosa Nico. Como Nero perdeu o braço? Relaxa que o jogo explica no momento certo. Em paralelo, o misterioso V visita Dante para um trampo daqueles de virar noites. Seguindo o rastro de destruição em Red Grave City ele encontra a árvore Qliphoth, que cresce se alimentando de sangue humano. Dentro desta árvore bizarra, Dante trava batalha com Urizen.
O jogo abre exatamente com este combate, reunindo Dante com Nero e V. O rei do submundo é poderoso demais pra eles e nem sequer demonstra esforço ou interesse em combatê-los. Dante acaba tomando uma surra e é dado como morto. Sem chance alguma, os outros decidem recuar para bolar um novo plano para vencer Urizen. A história se desenrola no passado e presente, às vezes ao mesmo tempo ou com diferença de horas, alternando entre as personagens e aos poucos conectando os fatos.
Devil May Cry 5 já começa enchendo os olhos com o visual, que deixou de ser anime para se tornar algo mais realista. As animações são super caprichadas, montadas com captura de movimento de atores e com sincronia labial perfeita (tanto no inglês como no japonês). As cenas utilizam os mesmos gráficos do gameplay, assim como acontece no remake de Resident Evil 2. Esse carinho na produção enriqueceu as personagens, deixando tudo mais crível embora o universo do game continue sendo uma loucura sem fim.
O que não mudou e pode incomodar os puristas de plantão é o sexualismo exacerbado com as mulheres do game. Nico se comporta da forma mais provocativa possível, mesmo na hora de pegar uma nova Devil Breaker embaixo de sua bancada na van. Até suas tatuagens são insinuantes. E há outros exemplos distintos: as estruturas da árvore Qliphoth, que funcionam como passagem, possuem o formato de uma vagina. O fato de Nico ser uma mulher durona, cheia das gírias e fumante compulsiva ajuda a quebrar um pouco esse clima, mas não demora para Lady e Trish aparecerem nuas. O que não me incomoda, afinal este é um jogo tradicionalmente japonês e com classificação para maiores de 16 anos.
As diferenças entre Nero, V e Dante
Nas primeiras três missões você controla Nero e aprende a usar as diferentes versões da Devil Breaker. Aos poucos Nico vai apresentando suas novas invenções, sendo que cada braço robótico possui seu próprio visual e função: controlar o tempo, recuperar vida a cada golpe acertado, usar uma corrente, soltar uma broca perfurante, lançar um foguete que dá até pra surfar em cima… A criatividade vai longe e tem até a Mega Buster do Mega Man, com direito ao pulinho clássico.
Inicialmente você começa podendo carregar 3 Devil Breakers e aumenta a capacidade posteriormente com upgrades. Você encontrará braços pelo caminho, mas dá pra comprar na lojinha da Nico para ter estoque entre uma missão e outra, inclusive com a possibilidade de criar perfis com seus braços favoritos. Infelizmente não dá para alternar entre os braços disponíveis, obrigando o jogador a usar o atual até quebrar para vir o próximo, usar seu ataque carregado (que também o destrói) ou explodi-lo de propósito para causar dano nos demônios próximos à você. Mesmo com esta limitação, utilizar estes braços aumenta exponencialmente as possibilidades de combate. O revolver Blue Rose e a espada Red Queen, com guidão pra acelerar e fortalecer o ataque, ambos retornam de Devil May Cry 4. O gancho também continua presente, adaptado no braço robótico e não mais como Devil Bringer.
Como em todo Devil May Cry, há orbes para coletar: verde recupera vida; vermelho é usado em melhorias e na compra de itens; azul vem em 4 fragmentos que juntos dão +1 de vitalidade; roxo também vem em 4 fragmentos que juntos dão uma barra extra de poder demoníaco; branco recupera o poder demoníaco e dourado é utilizado para reviver. O poder demoníaco (PD) é utilizado por V e Dante, mas cada um à sua maneira. É aqui que entra a mudança mais notável no gameplay de Devil May Cry 5: V não entra em batalha, mas sim suas mascotes demoníacas. Ele controla o Grifo, a pantera negra Sombra e o golem Pesadelo, este invocado quando a barra de PD estiver no nível 3 ou acima. Uma forma inteligente de substituir o revolver e a espada, além de adicionar estratégia às batalhas. O único detalhe é que as mascotes não matam os demônios, apenas os deixam atordoados para que você os finalize.
V deve sempre manter distância dos inimigos enquanto suas mascotes fazem o trabalho sujo. O interessante aqui é que você controla apenas seus ataques, não seus movimentos. É como jogar um co-op com a inteligência artificial, que funciona super bem e raramente deixa de atingir os inimigos. Enquanto o pau tá comendo solto, V pode ler um livro pra carregar a barra de PD. Com o uso do poder demoníaco você aciona ataques especiais com o Grifo e a Sombra, enquanto o Pesadelo é o recurso ideal para enfrentar um número maior de inimigos ao mesmo tempo. Dá até para subir em suas costas, depois de adquirir o talento para tal.
Lutar com V é no mínimo interessante, uma vez que os ataques das mascotes ocorrem com um certo atraso. Grifo é fraco e ataca apenas do alto, mas possui upgrades que dão vantagens interessantes, porém é a Sombra que faz a maior parte do serviço com seus ataques que atingem inimigos tanto no chão como no ar. Leva tempo pra se acostumar com eles, mas não dá pra negar que o jogo fica bem mais fácil assim do que o combate corpo a corpo de Nero e Dante. Aliás, a maioria das melhorias de V funcionam em função das mascotes.
Em Dante nós confiamos
Agora Dante é Dante, né. O cara é foda desde o primeiro game e tá ainda mais badass em Devil May Cry 5. Além de alternar entre armas, espadas e o conjunto de manoplas Balrog (que agora permite alternar entre socos ou chutes, com combos distintos), ele ganhou uma nova arma chamada Cavaliere: uma moto criada com partes metálicas demoníacas, que se transforma em duas espadas enormes com rodas espinhosas. E sim, é extremamente prazeroso fazer marcas de pneu na cara dos inimigos.
Outra novidade é a troca livre de estilos de combate, sendo 4 ao total e com atalhos no D-Pad: Trickster prioriza a esquiva, Swordmaster confere golpes extras de espada, Gunslinger dá foco no combate por arma de fogo e Royalguard permite defender e contra-atacar os inimigos. Por fim, Dante pode se transformar em um demônio ao ativar o Devil Trigger com o PD no nível 3, mantendo o mesmo visual visto em Devil May Cry 4.
Por mais old-school que seja em sua fórmula, o combate com cada personagem é tão variado que o jogo simplesmente não enjoa. Ainda mais com os talentos, que agora podem ser testados no Vazio antes de comprar na van da Nico ou através de estátuas da divindade, seja no início da missão ou em checkpoints específicos. Há tantas opções que não dá pra desbloquear tudo na primeira vez que terminar a campanha. Os fãs irão pirar pra valer na segunda jogada, com o desbloqueio do nível Difícil, que realmente coloca os habilidosos à prova.
Jogando no Normal, confesso que achei fácil a campanha e principalmente os chefões, ainda mais se comparado com os games anteriores. Até DmC: Devil May Cry oferece desafio maior na dificuldade Normal. Por outro lado, o que não é nada fácil é encontrar as muito bem escondidas missões secretas, com os clássicos desafios cabeludos da franquia. Há também itens escondidos pra encontrar, como o lança-mísseis Kalina Ann de Lady.
Já na questão do rank por arena de combate – quando o cenário é fechado e infestado por demônios – está mais complicado obter nota S ou maior. Sem alguns talentos, principalmente para ampliar os combos, fica difícil se sair bem. Mantendo a tradição, com a soma do seu desempenho temos a nota final da missão, que define o quanto ganhará de bônus em orbes vermelhas. Embora seja importante para a evolução das personagens, vale mais ficar atento às orbes escondidas nos cenários do que se matar pela maior pontuação.
A Capcom está de parabéns!
Não posso deixar de elogiar o design dos demônios, um mais caprichado e criativo que o outro. Eles surgem em pequenas apresentações e são muito diferentes entre eles, exigindo adaptações de combate principalmente quando estão misturados. Sei que isso não é novidade na série, mas aqui o nível impressiona. Os chefões são igualmente interessantes, alguns com etapas para vencê-los. Fiquei surpreso também com a qualidade da câmera, que em momento algum me atrapalhou. Se desejar, é possível alterar sua distância, velocidade, enquadramento e comportamento no menu de opções.
A dublagem também irá agradar muita gente, embora eu goste mais da voz japonesa da Nico do que a americana. A tradução PT-BR também está impecável, mantendo em inglês apenas alguns nomes que não tem como alterar, como as armas. A trilha sonora também surpreende pela variedade, com um tema diferente pra cada personagem. Obviamente o rock and roll predomina nos combates, com voz gutural no tema de Dante pra deixar seus ouvidos em chamas.
Devil May Cry 5 é uma experiência de ação frenética mais do que obrigatória. Por mais linear que seja, é uma obra que renova o gênero hack and slash, possibilita o co-op online em missões com caminhos paralelos (para encontrar coisas escondidas, principalmente) e traz tudo aquilo que gostamos em jogos despretensiosos: história doida, personagens com habilidades impossíveis, criaturas horrorosas e uma série de situações absurdas, como a van da Nico que chega nos lugares mais improváveis. Além de curtir o game, não deixe de ver os vídeos de bastidores da produção da Capcom. São hilários!