Se você já jogava nos anos 90, certamente teve o prazer de vivenciar o auge do gênero Beat ‘em up. O que não faltava eram títulos de peso, como o clássico Final Fight da Capcom, Streets of Rage da SEGA e a série Double Dragon, que já vinha fazendo sucesso desde 1987. Com o tempo e avanço da tecnologia, o gênero acabou sendo substituído pelo hack and slash, que segue a mesma ideia de fases lineares recheadas de inimigos a serem espancados, porém com diversos outros elementos que só as gerações seguintes de consoles puderam nos oferecer.
Vez ou outra ainda pinta algum jogo indie de Beat ‘em up por aí, não só como uma tentativa de dar aquela nostalgia para os gamers mais saudosistas, mas também como uma forma de não deixar o gênero morrer. Wulverblade é um desses jogos, produzido pelo estúdio Fully Illustrated – que na verdade é um estúdio de um homem só, fundado e comandado pelo britânico Michael Heald. O game aborda toda uma temática histórica dos tempos de conquista do Império Romano e da resistência das tribos celtas, em que não só aprendemos um pouco mais de história como também conhecemos mais do folclore desse povo.
“O Norte se lembra”
A história se passa no norte da Grã-Bretanha, onde os romanos estão conquistando cada pedaço de terra das redondezas e as tribos celtas não estão conseguindo resistir ao poder militar do Império Romano. Mas existe uma tribo em especial que não está disposta a desistir de suas terras, liderada pelo bárbaro Caradoc. Junto de seu irmão Brennus e sua irmã Guinevere, o trio parte em uma jornada derramando o sangue de todos os seus inimigos até alcançarem o líder da 9º Legião Romana, que está comandando o ataque.
Wulverblade contém oito fases, todas apresentando cenários e detalhes fiéis à história antiga, como círculos de pedra e fortes romanos que realmente existiram. Conforme passamos de fase, liberamos alguns vídeos informativos sobre os círculos de pedra encontrados no norte da Inglaterra e alguns arquivos de texto explicando mais do contexto histórico do local daquela fase. Tudo isso é enriquecedor para quem gosta de história e também para quem gosta de aprender. Afinal, conhecimento nunca é demais e esses vídeos não tomarão mais do que dois minutos do seu tempo.
A história não chega a ter muita profundidade, assim como os personagens. Ela é contada em cutscenes no estilo “slide comentado”, tudo desenhado de acordo com a arte do jogo, que é toda cartunizada e muito bem feita. Mas não é porque o jogo parece um desenho que ele pega leve na violência. Wulverblade é muito violento e não poupa detalhes na hora de passar toda a brutalidade do povo celta em combate. Conforme matamos os inimigos o chão é pintado com seu sangue, e podemos também mutilá-los, arrancando braços ou até mesmo cabeças. Dá até para usar esses pedaços para atacar outros inimigos e executá-los quando estiverem caídos no chão. Portanto tire as crianças da sala!
Podemos escolher entre três personagens para jogar, citados anteriormente. A campanha não muda entre eles, pois todos compartilham a mesma história centrada no protagonista Caradoc, levando à um único desfecho. Ainda assim, existem diferenças de gameplay entre eles. Caradoc é o guerreiro mais balanceado; Brennus é o mais forte e mais resistente, porém o mais lento; e Guinevere é muito rápida, porém muito frágil. Podemos comparar facilmente esses personagens ao trio de Final Fight: Caradoc seria Cody, Brennus seria Haggar e Guinevere seria Guy. Então se você não quiser passar sufoco ao longo do jogo escolha Brennus, o “tanque” do grupo.
O jogo segue o padrão Beat ‘em up que já estamos acostumados, porém com umas coisinhas a mais para deixar o gameplay mais atraente. Contamos com diversas armas que podemos pegar de inimigos caídos, sendo que a maioria são apenas pequenas armas de arremesso (tipo as faquinhas do Final Fight), mas também temos à nossa disposição um arsenal de armas lendárias, muito mais fortes que as comuns e que ainda possuem conteúdo histórico. Essas armas são raras e só podemos encontrá-las em momentos específicos de cada fase, mas é realmente um desafio encontrar todas e completar sua galeria de armas nos Extras. Essas armas não são os únicos colecionáveis, pois você também terá uma série de papéis e documentos históricos para encontrar e aprender mais sobre aquele povo. Cada personagem conta com uma barra de Rage que, ao ser ativada, os torna invencíveis e com golpes mais rápidos, fortes e devastadores. Para fechar com chave de ouro, seguindo a lenda de que os povos do norte tinham uma ligação com os lobos da floresta, podemos invocar uma matilha para dilacerar os inimigos em momentos complicados no campo de batalha.
Um jogo para qualquer um se sentir hardcore
A maioria dos Beat ‘em up seguem a tradição de terem uma dificuldade bem amarga, principalmente nas fases finais. A dificuldade de Wulverblade não tem nada de absurda, sendo um jogo bem acessível para todos. Afinal, não existe segredo na sua jogabilidade: é só esmagar o mesmo botão do início ao fim. Os trechos mais difíceis são os dos chefes, que nunca lutam sozinhos e sempre contam com a ajuda de vários inimigos. Tanto na dificuldade Normal quanto no Easy o jogo te dá três vidas por fases, continues infinitos e checkpoints. Dá pra jogar tranquilamente, sem sofrer muito. Agora se estiver à procura de um desafio maior, basta escolher o modo Arcade: três vidas por fase, três continues e, se der game over, acabou para você.
O lance da dificuldade também é muito influenciado pelos personagens, pois quando eu digo que eles são diferentes, é uma diferença muito grande que acaba favorecendo um e prejudicando os outros. Um bom exemplo disso é que é possível passar qualquer fase com o Brennus sem perder nenhuma vida, enquanto que com Caradoc você sente muito mais dificuldade e com Guinevere chega a ser necessário um milagre para conseguir passar qualquer uma das fases finais, pois qualquer grupo que cerca a personagem já te arranca uma vida. Felizmente, para compensar tamanho desbalanceamento, o jogo conta com coop local em que você e mais um amigo podem suprir a falta dos atributos de seus personagens, facilitando bastante e deixando tudo muito melhor do que já é. Ao terminar a campanha e o modo Arcade, ainda existe a possibilidade de encarar o modo Arena e massacrar ondas e ondas de inimigos em diversos cenários do jogo. É como se fosse um modo sem fim, que só tem utilidade para os placares de pontuação. Mas, novamente, jogar com um amigo é bem melhor do que sozinho.
A trilha sonora segue aquele estilo épico, com tambores, gritos de guerra e tudo que gostamos em um bom jogo de guerras históricas. Se você leu até aqui, provavelmente deve ter notado algumas semelhanças do que foi dito com a aclamada série de literatura fantástica As Crônicas de Gelo e Fogo, de George R.R. Martin, que você também conhece pela série de tv Game of Thrones, da HBO. Se você é um fã dos livros ou da série, ou de ambos, Wulverblade é o tipo de jogo que te conquista só pela temática. Martin inspirou basicamente toda a história do Norte nesse folclore do povo celta, em que os personagens se comunicam com lobos, vivem em terras de gelo e tudo mais. Fora que o mapa do game é totalmente inspirado no mapa de Westeros, que podemos ver nos livros da série. Eu, como fã de Game of Thrones, me interessei ainda mais por conta desses elementos.
Wulverblade é um jogo para todos os amantes de história, jogos antigos e indies de qualidade. É um título que não decepciona nem mesmo na sua duração. Jogos do gênero geralmente enjoam rápido devido às repetições. Mas em Wulverblade, quando você começa a enjoar, ele acaba. O que resta é aquele gostinho de quero mais, o deixando louco para explorar os outros modos e prolongar a vida útil do game. Prepare sua garrafa de hidromel, convide seus irmãos de guerra para te acompanhar nessa jornada e prepare-se para derramar muito sangue na luta pela liberdade.