Já se tornou padrão vermos projetos encabeçados pela Devolver Digital apresentarem conceitos distintos – para não dizer fora da caixinha -, e com Witcheye não é diferente. Disponibilizado com exclusividade para plataformas móveis, Android e iOS, aqui iremos encarnar uma bruxa, ou melhor, seu olho para tentar reaver nossos pertences que foram roubados por um cavaleiro fanfarrão.
A trama se inicia quando um mago decide roubar os tesouros de uma bruxa, para tal mandando um valente aventureiro na promessa de o recompensar com “grandes poderes”. Fugindo dos clichês de um cavaleiro herói que defende o mundo do mal, aqui controlamos uma bruxa que se transforma em um olho e irá desbravar o mundo atrás de seus bens.
Idealizado pelo designer Peter Malamud Smith (Satellina e Satellina Zero, além do viral The Great Gatsby for NES) junto de Charlie Hoey, Witcheye carrega muitas inspirações de jogos, como Super Ghouls ‘N Ghosts, Mega Man, Spelunky, Super Mario Bros. 3, Ninja Gaiden e até mesmo Pokémon. Mas não apenas tem inspiração nos clássicos jogos de plataforma das gerações de 8 bits e 16 bits, como é uma bela homenagem a tais títulos tão consagrados. Logo, podemos esperar por altos desafios.
Olho por olho
O grande destaque está em sua jogabilidade diferenciada. Os comandos são simples: escolha a direção para a qual deseja se movimentar e execute a ação de deslizar o dedo pela tela (swipe) para tal direção, assim o olho irá efetuar o movimento. Outra possibilidade é parar, para tal basta tocar na tela. E essas são as únicas ações possíveis e necessárias em Witcheye. O que não quer dizer que será uma tarefa fácil chegar ao fim desta aventura.
É unânime que a combinação de um jogo de plataforma com comandos via touch screen é uma fórmula desastrosa – tal qual jogar um jogo de corrida com teclado. E apesar deste título ser adaptado para tal finalidade, ainda assim a falta de precisão prevalece, e essa com certeza irá causar muitos momentos de raiva – e frustração – para aqueles menos pacientes.
A questão aqui é clara: comandos por touch combinados com um jogo que exige ações rápidas e/ou precisas, o que não é um fator que funciona plenamente. Mesmo assim o gameplay em certos momentos (ou contra certos inimigos) exige apenas isso, o que não dá certo e resulta em mortes atrás de mortes. Porém isso é uma questão de persistência e – literalmente – tentativas e erros.
O olho tem um movimento contínuo e relativamente lento, sem a possibilidade de executar qualquer outro tipo de ação a não ser parar, o que nos leva a outra questão que resolveria boa parte do problema citado mas faz falta: a função de dash (esquiva). Isso com certeza iria ajudar muito. Pois, na maioria das vezes, não é possível desviar de projéteis ou ataques simplesmente pela movimentação lenta da personagem, ou mesmo atingir um inimigo com agilidade.
Algo que agrava ainda mais isso são os inimigos voadores, pois eles tem a péssima mania de entrar em locais onde não temos acesso, como por exemplo paredes. Enquanto alguns deles conseguem nos atacar à distância, e não temos opção senão tentar atrair eles para fora quando isso acontece.
Falando nos inimigos, eles são bem variados e possuem os mais diversos tipos de ataque, desde arremessar projéteis, sejam bolas de fogo até escudos, atacar diretamente ou mesmo utilizar armas para ataques corpo a corpo, além de serem temáticos com os mundos presentes. Eles não te darão trégua e irão te importunar ferozmente e sem dó, alguns sendo extremamente irritantes. O segredo está em descobrir seus pontos fracos e suas sequências de movimentação e assim atacá-los no momento certo.
Ao atacar um inimigo, nós sofremos o impacto dele, que nos repele, e isso é especialmente inconveniente, pois às vezes em uma tela repleta de inimigos lançando os mais diversos projéteis, a chance de sofrer dano, devido a esse ato de repelir e acabar acertando algum inimigo ou projétil no ar, é grande.
Todos os mundos são temáticos e cada um deles possui um determinado número de fases, em média sendo oito para cada – de um total de 53 fases distribuídas por seis mundos. No decorrer delas, iremos nos deparar com mini-chefes e ao final com um chefe de mundo (também seguindo o tema do mundo em questão). As fases são relativamente curtas, porém desafiadoras, algumas exigindo habilidade para serem concluídas.
Os chefes, assim como nos clássicos jogos das gerações 8 bits e 16 bits, se movimentam e executam ações pré-determinadas, e decorar essas sequências ajudará muito no sucesso das batalhas. O que não quer dizer que você não irá morrer nessa tentativa – devido muitas vezes à questão de imprecisão dos comandos.
A dificuldade geral de Witcheye é relativa, e apesar de desafiadora caso você seja um jogador habilidoso na arte de jogos via touch screen ou um jogador que curte jogos praticamente impossíveis, pode ser que alguns não sintam tanta dificuldade. Porém, há a possibilidade de escolhermos o nível dela. Uma vez terminado o modo história na dificuldade inicial (Normal), liberamos a dificuldade “Difícil” e em sequência a “Extremo”.
A diferença principal entre estes modos é a velocidade dos inimigos, tanto em movimentação, quanto em ataque, e a posição de certos inimigos ocultos pelos cenários. Nas dificuldades mais elevadas, eles são bem mais ágeis e possuem uma cadência de ataques maior.
Além disso, ao terminar cada dificuldade com todos os colecionáveis, serão desbloqueados outros modos, como o “Cace os Chefões”, “Cace os Minichefões” e a “Prova de Tempo”. Sendo os dois primeiros fases de chefes (ou mini-chefes) subsequentes nas quais a melhor pontuação e menor número de mortes são contabilizados. O último modo, sendo literalmente o que o nome sugere, é um desafio de tempo – inclusive com a opção do fantasma do melhor tempo anterior.
O que os olhos não veem…
Como dito, Witcheye também conta com colecionáveis, dentre eles diamantes, cujo cada fase conta com quatro para serem coletados, e dois itens mágicos da bruxa, um deles escondido em alguma das fases e o outro sendo desbloqueado ao vencer o chefe de mundo. Nesse quesito, há outro problema: os itens colecionáveis, quando são deixados pelos inimigos, não são automaticamente coletados, ou seja, é necessário tocar neles, porém em algumas ocasiões eles simplesmente atravessam paredes – assim como os inimigos voadores – e não conseguimos mais coletá-los, nos obrigando a reiniciar a fase para tal. Além disso, eles somem rapidamente pela tela.
Outro ponto que pode ser chato para alguns é o fato de que, para concluir a fase completamente, com todos os colecionáveis, é necessário coletar todos em uma única partida. Se você deixar de coletar algum, terá obrigatoriamente de entrar na fase e coletar todos novamente, não apenas aquele que deixou para trás. Diferente de jogos como os da franquia Mario, por exemplo, onde podemos apenas coletar aquele que não tínhamos feito anteriormente. A dica que eu deixo: mate todos os inimigos da fase primeiro e depois retorne para coletar os itens que ficaram pelo cenário, pois os inimigos não renascem.
Composto por um visual retrô 2D em pixel art, este é definitivamente o maior chamariz de Witcheye, bem refinado, extremamente atraente e detalhado. A trilha sonora também acompanha essa linha e traz composições que remetem aos jogos de época que casam bem com toda a dinâmica do gameplay e seu visual. Uma opção interessante presente no jogo é o ‘teste som’, muito presente em jogos da era 16 bits, no qual podemos selecionar e ouvir todas as faixas da trilha do jogo. Um recurso bacana e uma boa referência.
Witcheye é com certeza uma proposta diferenciada e com um conceito singular, apresentando visuais e trilha sonora retrô, inspirado nas grandes franquias de gerações passadas, e é quase certo que irá agradar e muito os fãs das antigas. Quase, porque talvez a falta de comandos precisos possa ser um ponto desnecessariamente frustrante. Mas para aqueles que sentem nostalgia de jogos especialmente difíceis, essa é uma boa pedida. Enfim, a persistência é recompensadora.