Um novo roguelike com uma pegada brawler chega pela Devolver Digital, desenvolvido pela Free Lives, para ir muito além de um simples jogo de luta com bonecos de palito. Stick It to the Stickman, além de divertido e caótico, também é uma crítica ao sistema capitalista contemporâneo, transformando a jornada corporativa numa experiência de combate surrealista que expõe as contradições do mundo empresarial através de humor ácido e violência cartunesca.
Assim como já conhecemos da Devolver, a premissa do jogo é brutalmente simples e genial: você é um funcionário comum que decide subir na hierarquia corporativa literalmente na base da porrada. Não existem méritos, currículos ou competências técnicas, apenas a habilidade de nocautear colegas de trabalho e chefes para conquistar promoções. Esta abordagem direta funciona como uma metáfora perfeita sobre como o ambiente corporativo pode se tornar uma batalha selvagem pela sobrevivência profissional.

Como todo bom roguelike, a narrativa de Stick It to the Stickman se desenvolve em ciclos viciosos que espelham a realidade capitalista: ao vencer, derrotar e depor um CEO, o protagonista é convidado pelos acionistas a assumir o cargo, reiniciando imediatamente o processo de escalada violenta. Este loop infinito funciona como uma representação cruel da maldição do capitalismo moderno, em que o sucesso individual não quebra as estruturas sistêmicas de exploração mesmo quando presenciamos o progresso de uma corporação.
Homem primata, capitalismo selvagem
O jogo apresenta missões corporativas absurdas que incluem roubar carros da concorrência, reprimir protestos e sequestrar fiscais de obra, entre outras situações que podemos encontrar facilmente pelos polos empresariais. Estas atividades, apresentadas como “Tarefas Legais” expõem como o sistema corporativo pode normalizar comportamentos eticamente questionáveis em nome do lucro. A presença constante dos famosos cartolas, como figuras que representam os verdadeiros controladores do sistema, reforça a crítica sobre como o capitalismo é controlado por pouquíssimas pessoas que acumulam riqueza obscena enquanto se divertem com a violência competitiva dos trabalhadores.

Através de uma crítica social que vai muito além do óbvio, que faz com de Stick It to the Stickman um jogo que não se contenta em zombar superficialmente o ambiente de escritório, conseguindo dissecar sistematicamente as estruturas opressivas do capitalismo moderno. Desde estágios não remunerados até chefes tóxicos, cada elemento do gameplay amplifica os absurdos da cultura corporativa e os transforma em combates cômicos. O pior disso tudo é pensar que muitos jogadores ainda acreditam que seus joguinhos não falam de política ou carregam um viés ideológico.
No entanto, como estamos falando de um jogo não podemos deixar de analisar o gameplay de Stick It to the Stickman, que consegue combinar magistralmente elementos de beat ‘em up clássico com mecânicas roguelike modernas. A cada nova tentativa, o jogador recomeça do zero, mas mantém a possibilidade de evoluir tanto o personagem quanto a própria empresa ou até mesmo sua cidade. Este sistema de progressão dupla, do protagonista e o sistema de jogo, também reflete como o crescimento pessoal requer a participação ativa no próprio sistema opressor.

Assim como os movimentos feitos para simular um boneco de massinha feito com palitos, o combate se baseia numa física exagerada e permite a construção da sua própria máquina de luta corporativa, através da escolha entre centenas de movimentos únicos. Como cards colocados em ordem, você executará o golpe ou habilidade ao utilizar seu botão de ação, conseguindo bater, chutar, arremessar e até atirar. Stick It to the Stickman também possui um sistema de classes, que oferece habilidades específicas acompanhadas de piadinhas inteligentes com muitos trocadilhos e referências, enquanto os ataques incorporam referências tanto ao ambiente de trabalho quanto à cultura pop. Entre os movimentos disponíveis estão desde Shoryuken e tiro com grampo, até técnicas de persuasão que enfeitiçam inimigos ou habilidades absurdas, como trazer seu filho para o trabalho.
A progressão ao longo dos andares do prédio, ao subir em direção ao CEO e chefe final, acontece através da coleta de estrelas e pacotes de bônus durante o combate, permitindo que os personagens se tornem extremamente apelões com habilidades no estilo Hadouken e movimentos ninja. Esta escalada de poder funciona como uma paródia do crescimento profissional acelerado prometido pela cultura do empreendedorismo, ao mesmo tempo em que satiriza a crueldade do individualismo e competitividade que o corporativismo carrega.
Você está demitido!
A Devolver acertou muito em trabalhar com Stick It to the Stickman da maneira mais acessível possível, com controles simples e muito responsivos, contrastando intencionalmente com a complexidade crescente dos combos e habilidades disponíveis, criando uma curva de aprendizado suave e tranquila de ser masterizada para enfrentar os desafios mais complexos. No entanto, o estilo molenga dos personagens encaixa entre qualquer dificuldade sofrida pelo hitbox durante os golpes, tornando tudo ainda mais engraçado quando vira uma montoeira de informações com diversos inimigos se espancando ou voando pelo andar. Ao incorporar elementos de múltiplos gêneros, carregados pelo estilo beat ‘em up, roguelike e plataforma, você enfrentará uma briga de rua generalizada e justificada pelo sucesso, refletindo também a natureza multifacetada e frequentemente contraditória do mundo corporativo moderno, como uma luta pela sobrevivência.

Saindo da jogabilidade e indo para o humor, temos um jogo que conseguiu desenvolver um estilo próprio e carregado de irreverência, mesmo quando tudo não passa de bonecos de palito. Os desenvolvedores conseguiram trazer para um jogo a crítica social de maneira escancarada, embora seja efetiva, ela acaba sendo exagerada a ponto de chegar num nível didático demais, com algumas piadas perdendo sutileza em favor do impacto imediato.
Se a proposta de loopings por conta do formato roguelike para a evolução do jogo pode acabar afastando alguns, a escolha estética por bonecos de palito também pode ser estranha num segundo momento. No entanto, o estilo gráfico carrega uma intenção clara de referenciar os antigos jogos em Flash, ao mesmo tempo em que a estética colorida e caótica contribui para o tom cômico enquanto os cenários corporativos se transformam em palcos para batalhas épicas.

Esse tom cômico e absurdo do jogo é reforçado pelos efeitos sonoros exagerados, fazendo com que cada golpe, explosão ou queda de funcionário possui um som característico que amplifica a natureza cartunesca da violência, evitando que a crítica social se torne pesada demais. Enquanto isso, a trilha sonora traz músicas que embala a ação e amplia o formato de denúncia aos exageros do capitalismo, com faixas que possuem nomes como “Your Call is Important to Us” e “Performance Review”. Jaybooty é a mente por trás da composição e você pode conferir todas as músicas em seu canal do YouTube.
Stick It to the Stickman representa uma evolução madura no que tínhamos antigamente em jogos com boneco de palitinhos ou até mesmo de massinha, com gameplay e física preparadas para serem cômica. No entanto, mais do que um simples beat ‘em up com temática corporativa, o título funciona como uma experiência que acompanha muitas emoções intensas e reprimidas, principalmente da classe trabalhadora que sua para comprar seus amados joguinhos, permitindo aos jogadores extravasar frustrações profissionais enquanto reflete criticamente sobre as estruturas sistêmicas que moldam nossas vidas profissionais. É um jogo que consegue ser simultaneamente divertido e politicamente engajado, provando que entretenimento e crítica social podem coexistir harmoniosamente quando executados com inteligência e criatividade. Tudo isso envelopado num jogo engraçado e divertido.
Prós:
🔺Crítica social inteligente e humor ácido
🔺Combate divertido e variado com muitas classes
🔺Controles simples e acessíveis
🔺Visual minimalista e direção de arte carismática
🔺Trilha sonora muito boa
🔺Alto fator replay
Contras:
🔻Visual simples e repetitividade podem frustrar
🔻Alguns bugs pelo período de early access
Ficha Técnica:
Lançamento: 18/08/25
Desenvolvedora: Free Lives
Distribuidora: Devolver Digital
Plataformas: PC


