Quando Tcheco in the Castle of Lucio foi lançado em 2015, foi celebrado merecidamente como o grande feito de Marcelo Barbosa, um desenvolvedor independente com um grande talento para a sátira e para o desenho e com uma grande paixão para os jogos eletrônicos, mas sem experiência na área. Os poucos recursos do jogo faziam parte de sua mítica “naif” e o título disfarçava suas limitações técnicas com um banho de nostalgia e compensava com dez vezes mais simpatia que jogos de grandes equipes.
Considerando-se os anos necessários para concretizar aquele jogo, teria Barbosa fôlego para tentar de novo? A resposta é Skatemasta Tcheco, a prova viva de que um raio pode e deve cair duas vezes no mesmo lugar.
Só os loucos sabem
Se o jogo anterior era uma coleção de 65 mini-jogos costurados pela fino fio da insanidade em um castelo onde nada fazia sentido, desta vez nosso protagonista está de volta em outro mundo estranho, mas desta vez melhor costurado. O nome entrega: Skatemasta Tcheco coloca o personagem principal em cima de um skate em uma jogabilidade arcade de plataforma. O jogador não precisa gastar tempo tentando entender os desafios de cada tela, como era antes, é só incorporar seu Tony Hawk interior e deixar as rodas te levarem.
Nesse ponto, pode-se dizer que Barbosa trocou a anarquia do primeiro jogo por uma jogabilidade mais coesa, familiar até. Por conta disso, houve uma redução no grau de dificuldade, evidenciada na curva suave de desafio entre os mundos de Skatemasta Tcheco. Ao contrário do padrão de outros jogos similares, aqui o desenvolvedor libera acesso imediato a todos os mapas (ou à maioria deles, talvez haja níveis secretos). Então, se você quiser partir logo para cenários mais tensos, a decisão é sua.
Barbosa também é bastante caridoso com o número de vidas disponíveis desde o início, com kits médicos bem distribuídos pelos mapas.
Essa nova abordagem não significa que Skatemasta Tcheco não tenha atrativos para os jogadores hardcore. Executar os movimentos com precisão e memorizar os padrões de inimigos e obstáculos que vão aparecendo continuam sendo a chave do sucesso e a diferença entre a tela de Game Over (“Nasceu nenê, morreu nenê”) e o triunfo. Entretanto, novamente, há uma “mordomia” aqui que não havia no Castelo do Lúcio: é possível salvar seu progresso a cada mapa completado.
Para quem se importa com pontuação, o jogo registra seu recorde. Porém, não há um ranking global online. E, mesmo em relação a si mesmo, é possível “trapacear”: níveis mais complexos rendem mais pontos, mesmo que você sobreviva por poucos minutos neles. O ideal, nesse caso, seria uma pontuação separada para cada nível.
É importante também não confundir coesão com perda do jeito pirado que sempre caracterizou o universo de Tcheco. Ainda há referências bizarras ao longo do jogo, assim como elementos que ou são piadas internas obscuras ou fenômenos aleatórios exclusivos da mente de Barbosa, como bailarinas rodopiantes surgindo de lugar nenhum, um homem-mão saltitante, um tiozão vampiro chamado Seu Almeida e a onipresente ajudante cadela-cibernética Pepita com uma mola nas costas.
Se não eu, quem vai fazer você feliz?
O mundo de Tcheco in the Castle of Lucio era fulgurante e alegre de tão exótico, mas o pobre Tcheco sempre aparecia cabisbaixo, certamente incomodado por estar prisioneiro. Desta vez, o nosso herói é bicho solto, a céu aberto e praticamente abre um sorrisão em todas as telas, enquanto desvia de ameaças, coleta dinheiro e atravessa os cenários mais inesperados.
Barbosa mantém a lógica urbana do skate, com inclinações e tudo, somente no primeiro mapa. Depois disso, está liberada de novo a bagunça e nosso skatista vidaloka vai passar por um parque de diversões, um shopping center, uma praia com areia e tudo, a superfície da Lua e até mesmo a chegada de Papai Noel em um estádio. Essa tradição natalina esquecida das grandes metrópoles aqui é mais um playground para Tcheco e uma boa desculpa para colocar o personagem vestido de acordo.
Além de juntar dinheiro para pagar o save no final do mapa, Tcheco também precisa coletar letras em seu passeio de skate. Reunidas, essas letras dão a dica para a pessoa para quem ele vai telefonar para pedir uma ajuda para a batalha com o boss da fase. É nesse momento que entram os convidados especiais de Skatemasta Tcheco, como Mavra, heroína de Blazing Chrome, ou Dandy, de Dandy & Randy, para combater inimigos como o meme Sônica. É uma festa de arromba e muita gente ainda pode chegar. Barbosa é querido por todos e sua casa está de portas abertas.
Eu vou fazer de um jeito que ela não vai esquecer
Skatemasta Tcheco não mexe um pixel no estilo visual do jogo anterior e isso é bom. O mundo de Tcheco é 2D, é retrô, tem linhas de televisão velha, tem traços simples. É um retrato Polaroid da era NES, uma era que permanece viva no coração de marmanjos e ainda consegue cativar a molecada.
Tecnicamente falando, tem alguma marotagem em cena: apertar F12 não ativa a captura de tela do Steam, mas o debugador do navegador. Seria Skatemasta Tcheco um jogo em Flash rodando em um navegador Chrome encapsulado? Estamos aqui diante de uma gambiarra tecnológica, outra demonstração do espírito “do it yourself” de Barbosa, mais um detalhe punk da trajetória de uma franquia que ninguém segura mais.
A trilha sonora é o glacê do bolo, mais uma camada de nostalgia que nos leva para outros tempos e o casamento perfeito para seu gráfico charmosamente ultrapassado. Efeitos sonoros propositalmente toscos e surpreendentes completam a experiência.
Skatemasta Tcheco termina sendo uma palpável evolução do que foi visto antes. Não uma revolução, ou não seria outro jogo do Tcheco, mas uma caminhada (de skate) em direção a um jogo melhor elaborado, mais coeso, mas não menos simpático ou imprevisível.