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Depositar esperanças em premissas é algo perigoso. Uma ideia, ainda sem forma concreta, pode parecer atraente e inovadora, nos fazendo esquecer dos vários obstáculos pelos quais ela terá de passar até que esteja em nossas mãos. E, como é de se esperar, existem vários casos nos quais este percurso turbulento não é transposto com facilidade, fazendo com que essa premissa perca muito do que havia prometido.

E é realmente uma pena que esse tenha sido o caminho que Scribblenauts acabou por trilhar. Quando ouvimos falar sobre o jogo, é difícil que não nos apaixonemos instantaneamente por ele. Entretanto, uma vez que ele começa a ser experienciado, problemas diversos surgem, tornando o título uma grande frustração.

“Escreva qualquer coisa, resolva tudo.” Foi assim que Scribblenauts foi propagandeado e é assim que ele se define. É uma descrição justa, pois é dessa maneira que você solucionará os diferentes desafios que o jogo oferece. As palavras que forem escritas aparecerão fisicamente, e você poderá usá-las para conquistar as Starites, o seu objetivo em todas as fases. Uma dessas Starites está em um lugar muito alto? Você pode fazer uma escada para alcançá-la ou, caso queira ser mais extravagante, poderá conjurar um par de asas ou um pterodáctilo e conseguirá pegá-la da mesma maneira. Estes são apenas exemplos simples para ilustrar um pouco da liberdade que o jogo oferece. E, olhando desta maneira, por que ele haveria de ser frustrante? Com um pouco de criatividade, as possibilidades de solução de casa fase poderiam ser bastante vastas, o que soa muito interessante. Mas, como disse, este é novamente o âmbito da premissa, e uma vez que começamos a entrar concretamente em Scribblenauts que os problemas começam a aparecer.

Comecemos com o mais proeminente deles: os controles de Scribblenauts são terríveis. Apesar de haverem botões de sobra no DS, foi decidido que o jogo inteiro seria controlado apenas com a stylus. A caneta serve então para movimentar Maxwell, mover e posicionar objetos, e fazer com que o garoto interaja com o cenário. Acontece que, devido à imprecisão da tela de toque, não é raro que ele corra quando você gostaria de mexer em um objeto, e vice-versa. Isso é especialmente ruim quando você está terminando de pavimentar seu caminho para o final de uma fase e, por razões fora de seu controle, o jogo compreende que seu intuito é mover o garoto ao invés de deslocar um objeto, fazendo com que ele muitas vezes derrube seja lá o que você estivesse construindo, ou pior, simplesmente caia em um poço de lava ou espinhos, tornando necessário refazer toda a fase.

Mas, sejamos sinceros, com um pouco de paciência é possível contornar esse problema. Será inevitável falhar em alguns momentos devido à imprecisão dos controles mas, desde que você esteja disposto a engolir as eventuais frustrações, eles não irão impedi-lo de aproveitar Scribblenauts. No entanto, este não é o único problema que o jogo tem a oferecer. Enquanto seu dicionário tem virtualmente qualquer palavra na qual você poderia pensar, é em seu uso que elas decepcionam. A grande maioria delas não funciona da maneira que você esperaria. Um pote de veneno? Ele existe, mas não espere conseguir envenenar algo. Capa da invisibilidade? Ela a deixa invisível, mas você ainda será percebido por outros personagens.

A imensa quantidade de objetos simplesmente não tem muita utilidade. A maioria serve, no máximo para ser arremessada. Pior do que isso, essa variedade, que pode soar muito interessante no papel, acaba entrando no caminho do aproveitamento do jogo. Por exemplo, ao escrevermos “ponte”, uma ponte comum irá aparecer. Entretanto, ela é tão pequena que não houve um único buraco no qual ela servisse como passagem. É preciso então procurar outros tipos de pontes, e essas sim servem para transpor obstáculos. Mas, se esse é o caso, por que a “ponte” mais simples existe, já que ela não é útil em nenhum momento?

Não bastasse a miríade de objetos que jamais terão uso prático, as próprias fases não pedem por muita criatividade. A não ser que você queria procurar usar coisas diferentes, apenas para tentar ser criativo e conseguir mais pontos, elas quase todas podem ser resolvidas pela mesma dúzia de objetos que você tem usado sempre. Pode-se argumentar que fazer isso é ir contra o espírito do jogo, e esse discurso não é desprovido de razão. Porém, o fato dos desafios do jogo não pedirem por uma criatividade maior pode também ser facilmente visto como um design pobre. Pode-se somar a isso a frustração de objetos que não funcionam como esperado e a imprecisão dos movimentos de Maxwell, à desistência de tentar ser criativo. Uma vez que comecei a falhar todas as vezes em que tentava fazer algo diferente, foi apenas intuitivo que me rendesse àquilo que sabia que iria funcionar.

Seria fácil encontrar desculpas para a qualidade de Scribblenauts devido à sua premissa um tanto ousada. Afinal, o escopo do que o título tentou fazer é bastante grande, e em certa medida ele funciona. As fases com desafios inteligentes, nas quais os controles não entram em seu caminho, são bastante gratificantes, ainda mais quando encontramos soluções lógicas e criativas para resolvê-las. É uma pena então que esses acertos aconteçam com uma frequência muito menor do que os erros. É importante ressaltar que, caso você esteja preparado para virar a cara para as falhas do jogo e consiga lidar bem com a frustração, será possível tirar proveito do conceito único de Scribblenauts. Aos outros, é melhor apenas permanecerem iludidos com a premissa do título, imaginando para si diferentes desafios e soluções.