Horror: um termo utilizado para se referir a monstros, mitos ou acontecimentos terríveis. Assim, pode-se incluir toda a moléstia causada à raça humana atrás de uma palavra de seis letras. Imediatamente quando ouvimos a palavra, no entanto, nos lembramos das obras cinematográficas e/ou literárias, trazendo horríveis criaturas. A principio, muitos dos monstros que conhecemos hoje e são vistos como clássicos, na realidade, foram maneiras da humanidade explicar eventos. Doenças, desastres, tormentos climáticos, eram sempre produzidos por deuses, demônios ou alguma criatura mística.
Pathologic 2 é a segunda obra de uma série do estúdio Ice-Pick Lodge. Assim como o primeiro, o jogo trata de nos apresentar um mundo que parece ter saído diretamente de um sonho febril. Trazendo um ar pitoresco, o jogo teve seu primeiro título visto como experimental demais, mas logo se viu com uma enorme fan-base. Pathologic 2 é uma continuação que supera expectativas, mas também falha em algumas partes, uma mistura em equilíbrio.
As crianças pulam entre as chamas e cadáveres
Pathologic 2 nos apresenta a história de Artemy, um estudante de medicina que havia deixado a vila para estudar fora. No entanto, ele recebe uma carta de seu pai, pedindo para que volte o quanto antes. Assim, Artemy embarca em um trem e, durante a viagem, sofre com estranhas visões: um homem escondido em um caixão, no mesmo vagão que o seu, estranhas figuras mascaradas e até mesmo um combate no que parece ser a mistura da Cúpula do Trovão, de Mad Max, com Stonehenge.
Quando chegamos enfim na cidade, somos atacados por três homens que tentam nos roubar. Assim, acabamos os matando, o que é algo válido para esta situação. No entanto, logo descobrimos que o pai de Artemy, o Dr. Isidor Burak, também foi assassinado, por aquilo que os locais chamam de Shabnack Steppe Demon. Essa criatura, que dizem ser responsável pela morte do pai de Artemy, é temida por além dos assassinatos: ela também pode ser o vetor da doença chamada de Praga da Areia, uma terrível e antiga moléstia.
Apesar de a cidade estar sendo assolada por uma intervenção militar, a praga se espalhou. A cidade está eternamente escura, um miasma de morte ronda o local, crianças pulam amarelinha entre cadáveres ensanguentados ou carbonizados. E nisto, nosso protagonista recebe a chance de voltar 12 dias no passado e tentar salvar a cidade da aniquilação total.
Assim é o inicio de Pathologic 2: confuso, misterioso e envolto em morte. Entretanto, seu charme se encontra nisto. O jogo se passa em uma cidade pitorescamente bizarra, contando com um ar de conflito constante, característica herdada do primeiro título da série. Chamado de “Pestilence Utopia“ na Rússia, seu local de origem, o primeiro título trabalha constantemente o conflito de ambas palavras e seus significados.
Os capas vermelhas estão vindo
Pathologic 2 apresenta mecânicas interessantes de jogabilidade para um jogo do gênero. O título possui um longa lista de comandos, no entanto, o tutorial inicial é capaz de guiar os jogadores de maneira eficaz nesta parte. Vale destacar que as mecânicas de jogo foram extremamente aprimoradas em relação ao jogo anterior. Ao invés de recebermos nossas quests por cartas, desta vez temos o mapa da mente, que permite que o jogador rapidamente se situe. Nestes 12 dias, o jogador deve completar o máximo possível de quests e ver quais mais o beneficiam e as pessoas que deseja salvar ao final dos doze dias.
Afinal de contas, é impossível salvar todas as pessoas. É possível se manter de olho em seus conhecidos com a lista de habitantes da cidade, separados por facções. Porém, tome cuidado: a cidade é divida em setores, se unir ou completar missões de determinadas pessoas pode aumentar ou diminuir sua reputação em um bairro apenas, ou em todos simultaneamente. Dessa forma, sempre mantenha sua barra de respeito alta, afinal de contas, quanto mais baixo, mais perigoso você será considerado, fazendo com que seja atacado e pessoas não comercializem com você.
Uma vez que a cidade comece a ser assolada pela praga, o jogo realmente começa a apresentar seus maiores sinais de horror/suspense. O jogo, como dito ante,s vive uma eterna contradição entre a expansão moderna e os costumes tribais. Isso pode ser visto tanto nas personagens, quanto no cenário e trilha sonora.
Alguns personagens se vestem de maneira tribalística, tal como os povos mongóis e da região da Manchúria. Enquanto isso, outros apresentam roupas nobres e de tecidos mais sofisticados. A cidade apresenta prédios da época, enquanto ao mesmo tempo possui trens modernos e estruturas “futuristas”. A trilha sonora também surpreende com uma mistura incrível de sons tribais e modernos.
Escolhas difíceis frente à morte
Como médico, Artemy deverá nestes 12 dias correr atrás de uma maneira de impedir a peste, enquanto interage com a cidade. Pathologic 2, no entanto, limita totalmente o famoso estilo de jogabilidade de “jogo de passeio”, aqueles títulos em que o jogador apenas deve cuidar da sua barra de vida e pronto. Pathologic 2 insere toda uma mecânica de sobrevivência em seu sistema. Andou demais por ai? Sua sede está aumentando e, quanto maior a sede, menor sua Stamina. Brigou demais? Fome surgindo, afinal não há maquinário que funcione sem combustível.
Exaustão também é um fator continuo em Pathologic 2. Caso a barra aumente demais, o jogador poderá morrer de exaustão e fadiga. O que é um passo para trás, afinal de contas, sempre que morrermos, somos penalizados com uma diminuição da barra total de vida de Artemy. Isto pode ser mudado nas opções, mas os próprios desenvolvedores recomendam que não se faça isto. Isto torna a experiência e imersão do jogo em algo intenso. O jogador começa a planejar como passar seu dia na cidade, quem ajudar e como fazer isto da maneira mais efetiva possível.
O jogador desta vez deve ponderar se realmente vale a pena entrar ou saquear uma casa. Pois, com a chegada da peste, todos na cidade estarão como você: famintos, sedentos e, na pior das hipóteses, enfermos. Para evitar isto, o jogador deve sempre se manter em forma e saudável, usar itens de proteção como máscaras, luvas e agasalhos. Ter dinheiro também não é sinônimo de sobrevivência. Em determinados momentos e lugares, dinheiro não vale de nada e itens como comida, água, armas ou favores são a moeda de troca.
No momento em que os barris de água pararem de chegar a cidade, é sempre bom estar preparado para consertar as bombas, diminuindo assim a chance de contrair a peste. Cuidar dos moradores com elixires e colher ervas também são ótimas maneiras de se manter vivo.
Fecham-se as cortinas
Pathologic 2 é uma experiência incrível e com alto valor de replay. Ainda assim possui seus pequenos contratempos. O jogo, em relação ao seu antecessor, teve um salto gráfico, trazendo personagens mais realistas e um cenário mais detalhado. Porém, com isto, o jogo também sofre com alguns atrasos durante o carregamento dos locais. Nada que atrapalhe o ritmo, mas pode ser um tanto quanto inconsistente. As batalhas também parecem ter uma queda de FPS quando ocorrem mas, com o tempo, é possível se acostumar.
Outro problema está nas falas dos personagens. Muitas vezes, as vozes parecem ter sido gravadas em lugares diferentes e algumas das frases de NPCs são reutilizadas. Como, por exemplo, as frases dos bandidos e incendiários, em que ambos são personagens diferentes, mas possuem a mesma voz e falas. Joguei o jogo utilizando a dublagem russa, que é um pouco mais diversa, mas ainda assim os bandidos continua repetindo suas frases como uma unica entidade. Só que, ao invés de “Get over here”, eu ouvia “eee Cyka”.
Pathologic 2 é um remake do primeiro? Sim. Pathologic 2 é uma continuação do primeiro? Em termos. É necessário ter se jogado o primeiro título? Não. Infelizmente o jogo tem sofrido duras críticas em relação ao seu sistema de sobrevivência. O que, para mim é algo injusto,visto que o jogo traz um sistema realmente interessante e imersivo, capaz de causar ansiedade e um ponta de horror nos jogadores ao ver seus protegidos morrerem por fome, exaustão ou a peste, que se move como uma sombra pela cidade.
Os elementos de horror são sutis e utilizados de maneira correta, em uma cidade sem nome, saída diretamente de um sonho ou pesadelo, depende do angulo que você deseja ver.