Quase cinco anos após o surpreendente Octopath Traveler chegar ao mercado, a Square Enix lança seu sucessor, desenvolvido pela Acquire, mantendo viva aquela proposta de resgar a era de ouro dos JRPG para a geração 16-bit.
Octopath Traveler II chega no início de 2023 com a missão de continuar impressionando com sua incrível pixel art ao mesmo tempo que precisa inovar em sua fórmula e mostrar evolução após as críticas ao primeiro jogo. Será que finalmente teremos um jogo definitivo para chamarmos de “o melhor JRPG de todos os tempos”?
Senta que lá vem oito histórias
Vamos falar de história? Adoro começar com esse bloco, pois Octopath Traveler II possui uma carga narrativa muito forte. Afinal não temos apenas uma história, mas sim oito histórias que se conectam e trabalham para levar o jogador até uma missão final. A grande dúvida é: será que este segundo jogo da franquia conseguiu resolver o problema do seu antecessor, integrando melhor as histórias? A resposta é sim e não.
Como história principal, os desenvolvedores escolheram trabalhar de maneira muito efêmera e metafórica, quase como os animês shounen de lutinha trabalham, carregando mensagens de amizade, superação e união num plano secundário, quase abaixo de um terceira camada de interpretação.
Em Octopath Traveler II temos uma mensagem maior e principal por trás da construção de oito jornadas, sobre a luta contra uma escuridão causada por uma força sombria que incide e assola os seres de Solistia, mundinho em que toda a aventura se desenvolve.
Ao longo das primeiras dez horas de jogo você conhecerá o capítulo inicial de cada jornada desses oito aventureiros. Antes de entrarmos em alguns detalhes, vale ressaltar que muitas histórias carregam sentimentos atrelados ao heroísmo, conhecimento, altruísmo, reconhecimento, justiça e superação, ao mesmo tempo que temos vingança (muita, por sinal). São oito jornadas individuais carregadas de motivações próprias e que conectam diretamente com a luta entre luz e trevas, bem e o mal.
Infelizmente esta sequência não consegue evoluir muito mais sobre como conectar as histórias. Ela oferece o sistema de capítulos conhecidos como Crossed Path, em que vamos acompanhar poucos momentos de integração entre as narrativas e interação entre os acontecimentos, mas que são raros e superficiais. Minha crítica fica por conta de termos algo “forçado” como capítulo, mas em momento algum temos suas conexões justificadas pela amizade entre eles.
Quando trilhamos cada narrativa em seu determinado capítulo, que tem sua quantidade variável entre os personagens, nossos “amigos” desaparecem magicamente e seguimos na história de alguém específico de maneira isolada e solitária. Poxa vida! Não estamos trabalhando na conexão de sentimentos, mensagens e motivações? Então por qual motivo eles não trabalham em equipe, fora dos combates, para buscarem as resoluções e fechamentos também como grupo?
O elenco de personagens é ótimo e cada história evolui de maneira interessantíssima. Todos os capítulos trabalham muito bem no desenvolvimento da mitologia, sociedade e religião de Solistia, entregando conflitos internos e externos que são explorados por vários pontos de vista. Uma pena perceber que os protagonistas dessas oito histórias não contribuem muito entre si além de suas habilidades, forças e magias.
Optei por começar com Hikari Ku, um jovem príncipe que busca por vingança para salvar seu próprio reino, por ser a região mais distante e me permitir viajar para três direções diferentes ao escolher qual seria o próximo personagem a ser desbloqueado. Depois segui em busca de Partitio, um mercador que luta por justiça sócio-econômica, seguindo por Castti Florenz, uma Apotecária que busca por suas lembranças e identidade e, por último para fechar uma primeira formação de equipe, busquei por Agnea Bristani, uma jovem dançarina em busca de fama.
Prepare-se para ser impactado de verdade por ganância, injustiça e maldade, principalmente na história de Throné, uma ladra da guilda Blacksnakes, que infelizmente acabou sendo uma das últimas recrutadas por mim. Essa personagem foi a prova maior de que mesmo com missões secundárias e capítulos cruzados, o jogo tenta forçar a interação dos personagens, mas se preocupa muito mais em explorar uma mensagem principal que nos carrega através do lado sombrio dos seres de Solistia.
Evoluções com cautela
Esqueça o formato padrão de quatro capítulos para cada personagem, como o primeiro jogo trabalhava. Sem predeterminar uma quantidade de etapas para cada história como anteriormente, nesta sequência também temos diversas possibilidades desde o início, abrindo acesso a praticamente todo o seu mapa desde o início, além de deixar para o jogador escolher qual personagem começar, a ordem que deseja recrutar os demais (inclusive mostrando o local em que cada um está no mapa) ou se prefere seguir sozinho, seja com apenas um ou até quatro personagens na equipe.
Como novidade, a Acquire trouxe, além do Crossed Path que comentei anteriormente, o ciclo do dia e noite para trabalhar diretamente com as Path Actions. Com apenas um botão podemos facilmente passar o tempo para que nossos personagens utilizem habilidades próprias fora das batalhas em NPCs, com ações diferenciadas entre dia e noite. Podemos interrogar, roubar, subornar, adquirir itens, lutar, deixar inconsciente e recrutar, para nos apoiar durante as jornadas.
Temos também o Latent Power, que se assemelha aos Limit Brakes do Final Fantasy, em que uma círculo secundário vai sendo preenchido durante as batalhas, ao atacar ou ser atacado e causando Break nos inimigos, mecânica já existente anteriormente em que quebramos a defesa inimiga e deixamos o adversário atordoado.
Após carregado, o Latent Power pode permitir ataques especiais, aumentar o poder de habilidades ou inflingir alteração no status, e ao lado do Boost, outra mecânica do jogo anterior que foi mantida, permite causar ainda mais dano ou potencializar suas habilidades.
Acredito que a novidade mais interessante sejam as Guild Licenses, que permitem até três licenças de guildas diferentes para um mesmo personagem, conquistadas após breves missões secundárias, trazendo a adição de novos Jobs como sub-classes. Você poderá gastar seus Job Points, ganhos ao derrotar seus inimigos, para buscar ainda mais poderes e habilidades para cada personagem.
Essas classes secundárias também podem trabalhar em conjunto, entre sua party, para influenciar na batalha, potencializando cura, aumentando status ou oferecendo vantagens no início de cada combate. Como exemplo, eu consegui combinar a habilidade passiva da Castti com Osvald para ter 30% do meu HP e SP recuperados após o fim de cada luta.
Todas essas adições em Octopath Traveler II foram, na minha opinião, muito bem calculadas e cautelosas, pois tudo se mantém igual na questão de combate ou exploração, tendo neste último apenas a adição do bote para travessar áreas com água. Para as batalhas, você continuará o grinding pesado que o jogo exige, além de manter atenção para explorar as fraquezas dos inimigos e como eles se comportam.
Na exploração, o mapa continua sendo difícil de ler para os mais inexperientes, além dos encontros aleatórios, que parecem estar em uma quantidade maior, surpreendendo até os mais acostumados e podendo causar Game Over a qualquer momento, caso você não esteja devidamente preparado para enfrentar um inimigo.
Mais que uma obra de arte, um jogo obrigatório
Quase como uma obra de arte, por conta da sua direção de arte e excelente trabalho com a pixel art, você parece estar presenciando um mundo vivo. A iluminação ou escuridão tomando conta dos cenários, o nível de detalhe para tudo e todos, inclusive capaz de trabalhar a expressão de pequenos bonequinhos pixelados, tudo é impressionante e parece ter um cuidado ainda maior do que seu antecessor.
A trilha sonora é impressionantemente boa e impactante, com músicas que parecem encaixar perfeitamente com o estilo de história e personagem, mas também com a situação e ambiente. Com crescentes e mudanças do calmo e melancólico para algo mais incidente ou pesado pontuam perfeitamente o que está acontecendo ao longo das mais de 70 horas de jogo.
Mesmo com suas limitações narrativas, a Acquire propõe melhorias e evoluções que ampliam e melhoram a experiência de um bom JRPG. Ao lado da parte artística e com um excelente elenco de personagens, inclusive com um maravilhoso trabalho de dublagem (sempre jogo com as vozes em japonês), este é um excelente trabalho da Square Enix e que pode concorrer por um lugar como melhores jogos do ano. Um jogo obrigatório para todo entusiasta e também para quem se impressiona com a proposta de Octopath Traveler II.