A destruição paira ao seu redor conforme você recobra a consciência. Sua nave está em ruína e você não sabe onde está e nem como foi parar ali. Próximo a Saturno, é evidente que a nave chegou até lá por ordens suas, mas sua memória foi apagada e pouco restou para ser vasculhado. Assim se inicia Observation.
Mas quem é você? Uma das sobreviventes do acidente, a astronauta Emma? Não desta vez. Em Observation você assume S.A.M., a inteligência artificial que controla a nave e, sob as ordens de Emma, deve tentar descobrir o que está acontecendo e qual é o paradeiro do resto da tripulação. É sob essa nova e intrigante perspectiva que desbravaremos este thriller de tirar o fôlego.
A fronteira final
Observation é um jogo de puzzles com um grande foco em sua narrativa. A grande cereja do bolo é todo o mistério e o suspense que estão envoltos à trama. Tudo que o jogo te permite saber no prólogo é o que foi contado na introdução desta análise e o resto vai sendo desvendado pouco a pouco, pedaço por pedaço.
Os desenvolvedores souberam trabalhar de maneira surpreendente em uma narrativa que te deixa absolutamente intrigado até o final e louco para saber mais. O mais impressionante ainda é a sensação transmitida ao assumirmos S.A.M. nesta história – é um misto de impotência com onipresença.
Ao mesmo tempo que você não está ali fisicamente, você faz parte do todo, você É aquela nave. Tudo ao redor obedece os seus comandos, você pode observar cada cômodo, pode explorá-la de fora pra dentro e vice-versa. Mas é claro que a mente humana sempre prevalece e você não age por conta própria, pois está sempre seguindo as ordens de Emma e cumprindo o seu dever.
Como thriller o jogo não falha. Ele vai fazer você querer mais e sempre vai te intrigar em como será possível desenrolar a história no controle de um computador. É uma façanha que poucos jogos conseguem fazer, ainda mais um com uma proposta tão ousada como este. Ponto para a No Code (que por sinal também é a autora de Stories Untold).
Te manter entretido e interessado por algumas horas já é um bom motivo para te convencer a comprar esse jogo, mas nem tudo são rosas. Eu citei anteriormente que Observation é um jogo de puzzles com foco na narrativa, então não é um mero “drama interativo”, como os jogos da Quantic Dream, por exemplo. É exatamente em sua parte mecânica que ele começa a falhar.
A monotonia do espaço
S.A.M. pode se manifestar de várias formas. Por fazer parte do sistema da nave, ele pode “incorporar” qualquer câmera de vigilância, abrir qualquer porta e fazer as alterações que bem entender. Mas ele também tem a capacidade de “possuir” umas esferas robóticas que lhe garantirão uma forma física, permitindo que explore tanto o interior como o exterior da nave com mais liberdade.
O grande problema é que a nave está em pedaços e grande parte da sua jornada será consertando componentes e tentando fazê-la voltar a sua total atividade. É aí que entra os puzzles, oferecendo uma diversidade considerável de quebra-cabeças a serem resolvidos. O problema é exatamente este: o jogo acertou em cheio na sua narrativa mas acabou pecando nos seus aspectos jogáveis, o que torna a experiência apenas 50% satisfatória.
Emma sempre está dando ordens para S.A.M. e é isso que define os objetivos do jogo. Se ela pedir que ele abra uma porta, você terá que seguir as instruções para conseguir abrir aquela determinada porta, o que pode variar o tipo de puzzle mas não oferece desafio algum. Grande parte dos puzzles se limitam apenas a apertar os botões que aparecem na tela no momento exato ou seguir alguma outra instrução que o próprio jogo te dá. O jogador não é estimulado a pensar, a rachar a cuca tentando descobrir como se prossegue.
Há pouquíssimos puzzles que conseguirão te dar um trabalho considerável. Um deles é logo no começo e, diferente de outros quebra-cabeças, neste o jogo não te oferece nenhum tipo de ajuda, além do fato do desafio não ser nada intuitivo. Penei um pouco para passar, mas quando consegui a sensação de recompensa e triunfo foi impagável. É esse tipo de coisa que se espera o tempo inteiro em um jogo de puzzles e infelizmente é um fator raro neste título.
Fora esses poucos puzzles que te desafiam às cegas, outros momentos que podem te fazer empacar por um tempo são os de exploração. Por vezes Emma vai te pedir para consertar ou procurar defeitos no exterior da nave e em Observation você não conta com nenhum ícone ou indicação de onde estão seus objetivos no cenário. Você terá que procurar na raça, andando para lá e para cá até encontrar o que foi pedido. Esses momentos acabam sendo mais maçantes e entediantes do que desafiadores.
Dito tudo isso, não preciso nem dizer que o jogo exige no mínimo um ótimo conhecimento em inglês, certo? Infelizmente não há localização em português e isso fará toda a diferença para quem não fala inglês, pois é necessário estar atento o tempo todo as ordens de Emma e entender o que está sendo pedido é essencial para prosseguir.
Com respeito aos gráficos e trilha sonora, a qualidade é meio mista. A trilha sonora é quase ausente, mas vez ou outra podemos ouvir algumas faixas típicas de filmes e séries sci-fi, então está de bom tamanho. Já os gráficos não são tão exuberantes e isso é perfeitamente disfarçado pela visão borrada e “chuviscada” da nossa IA. A única coisa que não deu para esconder foram as expressões faciais bizarras dos personagens. Nos momentos que Emma fala perto da câmera, é simplesmente agoniante o modo como ela mexe a boca e os olhos em uma tentativa desesperada de demonstrar algum sentimento.
Observation tinha muito potencial para ser um dos melhores indies deste ano e em partes ele consegue. A história é ótima e não decepciona, te mantendo preso ao jogo até terminá-lo, mas infelizmente o gameplay não ajuda muito a manter essa empolgação. É um título que não vai te manter jogando por muito tempo, mas que sempre te fará voltar para saber o que acontece em seguida. Poderia ser melhor? Com certeza, mas a sensação de estar participando de um filme sci-fi bem imersivo é impagável.