A série Mafia sempre me cativou com suas histórias sobre o crime organizado. É curioso entender as motivações de seus personagens e ter a perspectiva de ambos os lados da moeda. Além disso, as conexões entre os jogos e os contextos históricos são um charme à parte. Mafia: The Old Country promete resgatar muitas dessas sensações, e foi justamente isso que me deixou ansioso para viajar até a Sicília.
O quarto título da franquia chegou trazendo uma beleza absurda. O visual da Sicília nos anos 1900 é encantador e diferente do que estamos acostumados a ver na série, saindo das cidades cinzentas para um ambiente mais campestre. Mafia: The Old Country também vai contra a maré dos jogos de mundo aberto, trazendo linearidade e grande foco narrativo. Essa decisão chama a atenção em tempos em que os jogos costumam oferecer mapas gigantescos repletos de atividades. Ainda assim, não se engane: o jogo é riquíssimo em conteúdo.

Provando o seu valor
Neste jogo, conhecemos as origens da máfia que mais tarde se expandiria até Empire Bay. Através da história de Enzo Favara, um anti-herói que cresceu pagando uma dívida que não era sua, logo nos conectamos com os outros títulos da franquia. Só isso já empolga bastante, mas há surpresas que tornam a experiência ainda mais rica, e será ainda melhor se você tiver jogado os anteriores, embora isso não seja obrigatório.
Tudo começa a mudar quando Enzo se torna trabalhador nas terras do famoso criminoso Don Torrisi. Apesar de temido, ele é um líder respeitado e concede a Enzo o mínimo de dignidade para viver – e não apenas sobreviver. Convenhamos, esse é um baita motivo para demonstrar gratidão e se dispor a servir essa família.

A gratidão, no entanto, é logo convertida em provações de valor e confiança. Enzo, apesar de forte, tem muito a aprender, especialmente porque toda a estrutura dessa família já está bem definida. Por isso, o início é acompanhado de perto, com personagens orientando sobre o que e como fazer. Na prática, é quase como um tutorial abstrato.
Cercado pela gangue, logo reencontramos muitos rostos familiares. Leo Galante (aqui jovem e ainda mais galanteador), Giuseppe Palminteri, Frank Vinci e Sam Trapani também dão as caras. Para os fãs, é impossível não sentir a nostalgia, enquanto esses personagens fortalecem os laços que amarram toda a franquia.

Uma faca cheia de propriedades
Conforme avançamos, Mafia: The Old Country dedica momentos para ensinar comandos essenciais: furtividade, combate, montaria de cavalos e até direção de carros. Mas talvez o mais interessante sejam as facas, que vão além do uso em batalhas. Elas podem arrombar fechaduras e realizar eliminações furtivas; algumas podem ser arremessadas, enquanto outras funcionam melhor em combates corpo a corpo.
Cada faca possui atributos distintos, e será necessário afiá-las periodicamente para conseguir quebrar fechaduras. É possível comprar pedras de amolar ou encontrá-las pelo caminho. Essa mecânica é muito interessante e favorece quem gosta de jogar de forma furtiva.

Curiosamente, Enzo não luta com os punhos. Qualquer combate corpo a corpo será com facas ou armas de fogo. E por falar nelas, as opções são diversas: você pode comprar suas próprias ou saquear inimigos. Apesar da variedade, percebi que, no geral, é fácil encontrar armas na dificuldade média, o que diminui a necessidade de comprá-las.
A família de Mafia: The Old Country exige tempo
Valle Dorata é uma região linda da Sicília, daquelas que dão vontade de explorar sem pressa. Os campos, os vinhedos, as casas… tudo enche os olhos. Mas, na pele de Enzo, os momentos de contemplação são raros. Mesmo quando o jogo pede para esperar até certa hora para agir, a tela rapidamente escurece e leva direto à próxima missão.

Isso acontece porque a campanha de Mafia: The Old Country é totalmente voltada para a história – e ela é bastante cinematográfica. Honestamente, não vejo isso como um problema, desde que a narrativa seja boa e bem contada, algo em que a série sempre acerta. Há até uma opção para esconder quase toda a interface da tela, ampliando a imersão (e a beleza) das cenas. Confesso que joguei assim até o fim, e foi encantador.
Apesar da linearidade, a Sicília guarda diversos coletáveis. Em vez das clássicas revistas Playboy (risos), encontramos altares com santinhos e símbolos da Trinácria que têm um baita contexto histórico. Vale lembrar: foram os gregos que, ao navegarem ao redor da Sicília, notaram sua forma triangular e a denominaram Trinácria, representando-a com três pernas e a cabeça da Medusa.

Também há coleções de fotos que podem ser tiradas em pontos específicos com uma câmera da época. É tão divertido que espero que, em futuras atualizações, possamos usá-la a qualquer momento.
Jornais, notas e documentos completam essa coleção, trazendo não só contexto histórico, mas também easter eggs e conexões com personagens da franquia, como Ennio Salieri e Frank Colletti, do primeiro título.
Esses itens ainda podem desbloquear diálogos diferentes, já que Enzo compartilha as informações descobertas com NPCs. Isso dá peso aos coletáveis, revelam alguns segredos e torna as conversas mais interessantes.

Além disso, o jogo oferece 50 raposas misteriosas e estátuas de São Celestino, padroeiro que concede proteções divinas. Essas bênçãos podem ser equipadas no rosário, que é personalizável com crucifixos e pedras que melhoram atributos como vida, resistência, furtividade ou força.
A coleta, no entanto, tem um detalhe estranho: alguns itens só podem ser adquiridos em missões específicas. O mapa até mostra onde procurá-los, mas a limitação pode frustrar quem gosta de explorar livremente.

Curiosamente, dentro do “Veiculopédia” (uma opção no menu inicial) existe um modo exploração. Ao escolher um carro para testar, você fica livre para rodar pela Sicília. Tudo o que coletar ou gastar nesse modo será refletido na campanha. É uma forma curiosa de liberar exploração, mas funciona.
Na campanha principal, a linearidade também limita algumas experiências. Há, por exemplo, corridas de cavalos e até de carros, ambas muito divertidas, mas que só acontecem uma vez cada durante toda a jornada. Uma pena. Espero que novas atualizações tragam mais momentos assim.

O charme da língua Siciliana
Não posso deixar de destacar o capricho artístico. Em certo ponto, ouvimos “Libiamo Ne’ lieti calici”, da ópera ‘La Traviata’, de Giuseppe Verdi. Os personagens, bêbados, acabam parodiando a canção e ficou muito engraçado. A dublagem em siciliano torna a cena fantástica e mais uma vez, evidencia o carinho colocado no jogo.
Outro ponto apaixonante é a atenção ao idioma. Palavras como piacere e schiuso recebem pronúncia diferente, com o “c” mais chiado, virando “piaxêre” e “xquiuzo”. Também há contrações típicas, como “u capixe” no lugar de “tu capice”.

Mesmo sendo iniciante em italiano, pude notar (com a ajuda do meu namorado) como o sotaque siciliano foi respeitado na dublagem. É uma pesquisa linguística cuidadosa que reforça a imersão cultural e histórica.
As legendas, por sua vez, mantêm alguns termos em italiano, ajudando a preservar a identidade original. Recomendo fortemente jogar assim até o fim.
O capricho visual se estende a pequenos detalhes: ver uma gangue tramando no horizonte, Enzo puxando a manga da blusa para aplicar bandagens que permanecem no corpo, ou diálogos ativados ao mirar nos inimigos. Tudo mostra o cuidado da Hangar 13 em dar profundidade ao jogo.

No fim, fico feliz que Mafia: The Old Country tenha optado pela linearidade. A campanha é incrível, contada em um cenário belíssimo, e todos os detalhes reforçam a qualidade pela qual a franquia é conhecida.
Não dá para julgá-lo por não ser um mundo aberto cheio de missões secundárias. O que ele entrega já é muito e isso me faz recomendá-lo sem sombra de dúvida.
Prós:
🔺Atmosfera cinematográfica envolvente, típica da franquia
🔺Narrativa madura e bem construída
🔺Apresenta a origem de personagens da franquia
🔺Visual que reforça a ambientação histórica
🔺Trilha sonora maravilhosa e imersiva
🔺Dublagem em siciliano de tirar o chapéu
Contras:
🔻Modo exploração escondido na ‘Veiculopédia’
🔻Faltou um modo foto livremente
Ficha Técnica:
Lançamento: 7/08/2025
Desenvolvedora: Hangar 13
Distribuidora: 2K
Plataformas: PS5, PC, Xbox Series
Testado no: PS5


