Fort Solis chega como uma opção para quem curte experiências focadas em narrativa. Trata-se do jogo de estreia do estúdio polonês Fallen Leaf, que apesar de ser indie tem cara de título AAA graças à sua equipe de veteranos. O elenco de dubladores certamente ajuda neste aspecto: o protagonista é dublado por Roger Clark, o Arthur Morgan de Red Dead Redemption 2; Julia Brown, a Lois Bennett da série Mundo em Chamas, dubla Jessica Appleton; e Troy Baker, conhecido por ter trabalhado em uma porrada de jogos, incluindo o Joel de The Last of Us, empresta sua voz à Wyatt Taylor.
Este thriller em terceira-pessoa é turbinado pela mais recente versão da Unreal Engine (5.2), utilizando todos os recursos disponíveis para ajudar na imersão. E de fato Fort Solis se destacada muito no visual, especialmente pela atuação captada por vídeo (mocap), o que deixa tudo ainda mais realista. Desta forma podemos classificá-lo como um filme interativo, mas sem os exageros de apertar botões que vemos nos games da Quantic Dream. Fort Solis está mais para um jogo de exploração linear com alguns momentos de Quick Time Events.
Mas será que um jogo sem combate, totalmente focado em narrativa, se sustenta? Bem, isso vai depender da sua expectativa. Fort Solis não é um jogo frenético, muito pelo contrário: todo o desenrolar da história ocorre lentamente, no estilo dos jogos do gênero de simulação de caminhada, o que pode irritar os jogadores mais impacientes. Ainda que o game tenha sido claramente projetado para te deixar curioso e tenso, ele não é pra qualquer um. Para efeito de comparação, sua proposta se assemelha ao Tacoma.
Um dia de cão no planeta vermelho
Você é Jack Leary, um engenheiro espacial que responde à um alerta manual disparado de Fort Solis, uma antiga base de mineração ainda ativa em Marte. Por sorte, você não estará sem companhia: sua parceria Jessica Appleton mantém comunicação por rádio durante toda a aventura. A dupla possui uma química incrível, mantendo o jogador entretido com as piadas e com os momentos de tensão.
Chegando em Fort Solis, Jack não encontra ninguém e uma série de situações estranhas começam a levantar suspeitas. Seu objetivo é explorar, encontrar cartões de acesso e coletar informações para descobrir o paradeiro da equipe de funcionários. E tal exploração ocorre com a caminhada descompromissada e interações simples como abrir uma porta, acessar um computador, pegar o chip de um gravador de voz, etc. E quando eu digo caminhada, eu falo sério: o jogo não oferece opção de andar mais rápido, o que irá irritar muita gente logo no começo do jogo. E se você não tiver paciência para digerir a história através da leitura de emails, relatórios, gravações de áudio e vídeo, Fort Solis não irá lhe agradar.
Como não dá pra morrer, o “desafio” entra em poucas ocasiões quando você precisa reagir rápido com a direção do personagem ou apertando um botão específico. O tempo de reação é sempre curto, mas errar não interfere no desenrolar da história, ficando apenas como um alternativa às animações do personagem. Levar um soco ou desviar, ter a perna machucada ou não, nada disso influencia no rumo dos eventos.
Esse bolo saiu cru
Fort Solis é um game caprichado, isso não dá pra negar. A base foi cuidadosamente arquitetada, cada ambiente difere de outro, e há muitos efeitos visuais rolando a todo momento. A hud é bem criativa, sendo executada em uma telinha no antebraço de Jack. A ambientação, engrandecida pela excelente trilha sonora, é seu ponto mais forte. Já a história, que deveria ser ainda melhor, se revela bastante manjada e sem impacto em seu desfecho – há dois finais diferentes, igualmente insossos. Fora que a jornada acaba rapidinho na primeira vez, em menos de 4 horas.
Eu confesso que gostei da proposta, mesmo com o ritmo lento. O conjunto de qualidades me fez aceitar a falta de criatividade no gameplay. Mas é triste pensar que Fort Solis poderia ser incrível com pequenas mudanças, como adicionar puzzles realmente desafiadores e/ou uma mecânica de furtividade, para em determinados momentos você se esconder da ameaça que habita a base, com possibilidade de morrer e ter que recomeçar de um checkpoint.
A própria história, dividida em 4 curtos capítulos, poderia verdadeiramente bifurcar de acordo com as suas decisões – levando em consideração relatos dos tripulantes, por exemplo – e assim trazer situações inéditas, bem como novas áreas para explorar e até mesmo desfechos, contribuindo para o replay.
Eu entendo que tais decisões foram feitas pensando em prazo, orçamento e outros obstáculos de desenvolvimento, mas Fort Solis definitivamente merecia ficar mais tempo no forno. É um bolo que saiu antes da hora, sem o devido recheio e a cereja no topo. Agora, se você tem fome de jogos nesse estilo, não tem porque negar essa aventura no planeta vermelho.