Coelhinhos felpudos de olhinhos vermelhos que se reproduzem rapidamente são um dos maiores clichês da fofura, mas desde Monty Python e o Cálice Sagrado a gente sabe que as aparências enganam e que esses demônios de pelo macio podem devorar os desavisados. Fluffy Horde parte da premissa absurda da invasão de uma legião quase infinita de coelhos e entrega uma jogabilidade compatível com o nível de insanidade. Ao longo de 100 exaustivos cenários, você terá que aprender que é dura a vida de um homem vestido de coelho nesse universo. E que princesas apenas querem se divertir.
Pela horda… não, pera!
Fluffy Horde é fruto de uma salada multicultural: a desenvolvedora independente Turtle Juice é tecnicamente brasileira, mas conta com profissionais oriundos não só do Brasil como também da Síria, Ucrânia e Inglaterra. Essa mistura de influências está nítida na salada mista de gêneros que transborda no jogo. Temos pitadas de tower defense? Temos sim, senhor. Mas também estão presentes side-scrolling e principalmente puzzles, então não espere aquele jogo tradicional de posicionar unidades e esperar os inimigos virem.
Na prática, você será apresentado a 100 mapas extremamente curtos com desafios variados e sem qualquer sensação de continuidade que possa ser chamada de história. Algumas partidas podem ser encerradas literalmente em menos de um minuto. De qualquer forma, se você demorar mais de três minutos em alguma, é certo que os coelhos irão se multiplicar como, bem, como coelhos e você será derrotado.
Ora será necessário proteger uma área contra a horda felpuda, ora será necessário escoltar um personagem pelo cenário, ora será apenas necessário destruir todos os coelhos. Há um total de quatro chefes no jogo inteiro, para dar aquela apimentada na avalanche de mapas. Infelizmente, com poucas opções de unidades ou variações táticas do que você pode fazer, os cem mapas acabam cansando e o jogo não é recomendado para sessões longas.
Quem espera um jogo de estratégia vai se decepcionar com Fluffy Horde. A vitória aqui não é obtida pela paciência ou administração firme de recursos, mas sim pela análise do que o mapa pede e o uso dos elementos que já estão espalhados. Na maioria dos casos, apenas uma abordagem exata pode levar à solução correta, o que aproxima o jogo dos quebra-cabeças. Isso é agravado pelo fato de suas mecânicas raramente serem explicadas a contento antes do início da partida, com novos e inusitados elementos sendo adicionados sem aviso. Tipo “como assim esses coelhos estão sendo multiplicados por dez quando passam por ali??”.
O que temos aqui, então, é um título onde você provavelmente irá perder na primeira tentativa, apenas para entender como tudo funciona e decifrar o enigma para uma segunda investida. É a insanidade presente em sua atmosfera, aplicada em uma jogabilidade, que deixa o título mais próximo do inesperado de um The Gardens Between do que da tática ofensiva de um Mushroom Wars 2, para ficarmos em exemplos recentes.
Temporada de caça ao coelho
Se a jogabilidade não é exatamente o que eu esperava, Fluffy Horde compensa pela simpatia. Usando uma arte em pixel caprichada, dá gosto de ver uma chuva de flechas pulverizando um tsunami de coelhos ou uma vaca recebendo uma chuva de leite que jorra de uma flor gigante (não faça perguntas, abrace o caos e aprecie). Quando catapultas estiverem jogando criaturinhas por todos os lados, sua princesa estiver sendo devorada viva e você for obrigado a repetir o mesmo nível pela décima vez, pelo menos você terá a certeza que será tudo bem desenhado, com aquele climão retrô que faz escorrer uma lágrima dos jogadores veteranos.
A arte se completa com uma dublagem (em inglês apenas) que também mira no humor, com uma princesa que teria vaga em um filme de patricinhas dos anos 90 e um ator fracassado vestido de coelho que sente orgulho em servir de isca. A música acompanha o tom de galhofa, embora dê nos nervos depois de um tempo. Mas quem foi que disse que você irá jogar Fluffy Horde por uma hora seguida?
Para quem tem um amigo com o jogo na sua biblioteca, é possível preparar uma partida multiplayer, onde um de vocês assume o papel do xamã que comanda o exército dos coelhos e o outro controla a força dos humanos. Sem servidores externos, o modo depende de um dos lados se tornar o host, gerar um código e enviar esse código para o parceiro. É uma complicação que acabei não testando, na falta de conhecidos que também tivessem adquirido Fluffy Horde.
Entretanto, o resultado final é um jogo que vale a pena ser conhecido. Seja para quebrar a cabeça em alguns mapas, seja para relaxar depois da janta, em partidas rápidas e descompromissadas mas com risos garantidos. O preço de R$ 10 (ou R$ 8.50 no desconto de lançamento na Steam) também ajuda na decisão: mais barato que aqueles ovinhos de chocolate marotos com brinquedo dentro, com a vantagem de ter muito mais conteúdo e, certamente, muito mais surpresas.