Skip to main content

Mais um shmup com elementos de RPG? “Tomara que seja melhor que o Revolution Ace.” Assim a esperança bateu meu coração quando vi o trailer de Drifting Lands pela primeira vez. Só de olhar o trailer, já dava para sacar grandes avanços tanto nos gráficos quanto nas mecânicas de jogo. Agora que eu pude sentir o drama pilotando a nave, vou deixar meus dois tostões.

Drifting Lands é um jogo de navinha 2D com rolagem horizontal, o segundo game desenvolvido pelo estúdio indie francês Alkemi. A proposta do jogo, segundo eles, é unir aspectos de Action-RPG a um jogo de navinha (ou shmup, como queiram), promovendo o avanço no jogo através da manipulação das características da nave.

Logo no início, o jogador deve escolher uma dentre três naves com perfis diferentes, com a qual terá que conviver por bastante tempo, até o jogo liberar a possibilidade de compra de outros modelos (no meu caso foram cerca de 9 horas até poder trocar). Há também uma infinitude de acessórios e equipamentos que você pode comprar ou coletar nas fases, assim como habilidades (skills) especiais que vão sendo liberadas também aos poucos, sendo o ponto alto do jogo.

Diversas habilidades à sua disposição

Pilotando a nave com habilidade

É principalmente através da combinação das habilidades (é possível “equipar” até seis habilidades simultâneas) que o jogador conseguirá superar os desafios do jogo. É possível fazer coisas legais como um “dash” que dribla tiros e naves, absorver tiros, recuperar a energia da nave, dentre muitas outras, que permitem definir estratégias criativas para superar situações complicadas, como esta dos trenzinhos espaciais da foto abaixo, que só consegui vencer usando as minas.

Uma questão complicada dentro da proposta do jogo, contudo, é o fato da nave perder todos os equipamentos quando ela é abatida. Isso gera retrabalho, podendo levar o jogador a rejogar fases já superadas para farmar e tentar reaver equipos, nos piores cenários. No meu caso, sempre mantenho equipada a habilidade “Automatic Retreat”, que faz com que sua nave fuja da fase automaticamente antes de ser destruída e você perder peças preciosas.

Isso garante certa autonomia de voo, mas como nem tudo são flores e a proposta do jogo parece ser exigir bastante do jogador, esta habilidade “mata” um dos slots que poderia ser algo muito mais interessante em termos de gameplay. Para piorar, muitos dos equipamentos possuem “falhas” e uma das falhas mais comuns é a possibilidade dele se quebrar quando ocorre a fuga manual ou mesmo automática da batalha.

As mina – PÁ!

Mas por que o temor desse jogo se parecer com o Revolution Ace (Laser Guided Games, 2014)? Justamente porque naquele jogo era necessário rejogar fases já superadas para juntar scraps e XP. Scraps eram o dinheiro para comprar armas e com XP era possível upar a nave e, assim, liberar mais slots para armamentos. Convenhamos que esse modelo de gameplay baseado em repetir fases vencidas para farmar e melhorar o equipamento é mais antigo que andar para a frente, vide o game de Famicom Fuzzical Fighter (Sigma, 1991), colocando tal “elemento de RPG” em um jogo de navinha 26 anos atrás.

Em Drifting Lands, porém, não é o caso de “grindar pra upar o char até o LVL99”, pois não existe melhoria de nada através de XP (nem mesmo existe XP no jogo). Dinheiro também não parece ser problema para equipar a nave, já que sempre ganhei muito mais jogando as fases que foram surgindo pelo caminho do que precisei gastar, além de ser possível obter dinheiro vendendo tudo o que é equipamento recolhido que não interessa. O que faz diferença concreta na performance da nave são duas alternativas principais: as missões solicitadas pela Ginger e as novas habilidades e naves liberadas com o avanço do Grade.

Tony Stark tem a Pepper, nós temos a Ginger

Gran Turismo da galáxia?

Conforme vamos avançando no game, podemos fazer uns bicos para a Ginger, que em troca nos dá itens raros, assim como habilidades exclusivas. As habilidades obtidas desta forma permanecem para sempre à disposição, mas os itens podem ser perdidos a qualquer momento e para sempre, se nossa nave for destruída sem a habilidade que mencionei anteriormente (Automatic Retreat).
Já o Grade, como o próprio nome diz, é uma espécie de grau, que vai subindo de um em um a cada dez fases superadas.

Em um esquema muito parecido com as licenças de Gran Turismo, por incrível que pareça, quando pegamos um novo Grade, o jogo libera novas habilidades, novas fases, deixa os inimigos que já existiam mais difíceis e, em alguns casos, novas naves são liberadas. É algo cíclico que vai rolando ao longo dos dez Grades disponíveis e chego a enxergar um paralelo com Gran Turismo da seguinte forma:

Gran Turismo: superar as corridas disponíveis, juntando grana até comprar o melhor carro possível daquela licença e tunar o carro até conseguir pegar uma nova licença, que libera novos circuitos e carros.
Drifting Lands: superar as fases disponíveis, juntando grana até comprar a melhor nave possível e equipar a nave até conseguir subir de Grade, que libera novas fases e habilidades (e, com sorte, naves).

Só eu vejo uma Pokébola e uma fita de 64 aqui?

Assim como em GT é possível ainda fazer ajustes específicos no carro para cada corrida, em Drifting Lands é possível escolher a combinação exata de habilidades para cada fase, o que me leva a crer que poderíamos considerá-lo mais um shmup com elementos de Gran Turismo que de Action-RPG. Ou seria Gran Turismo um jogo de corrida com elementos de Action-RPG?

Jogadores à deriva?

Seja como for, ao contrário de Gran Turismo, que premia o jogador mesmo quando ele chega em segundo ou terceiro lugar, por exemplo, Drifting Lands se distingue por propor uma experiência deveras punitiva ao jogador. O jogo é lindíssimo, a interface do jogo é intuitiva e funcional, os comandos respondem perfeitamente, é uma delícia voar em alta resolução por entre as rochas à deriva do que restou de um planeta detonado por um cataclismo, metendo bala em tudo que aparece pela frente e usando sem parar todo o leque de habilidades escolhidas a dedo para aquela missão. Mas… Diante de certos desafios, até Joãozinho descobrir a combinação de habilidades vencedora, a frustração já pode ter atingido níveis insuportáveis após muitos loots perdidos e equipamentos únicos quebrados.

Assim sendo, Drifting Lands deu alguns bons passos adiante de Revolution Ace, tanto em relação a expandir e muito as possibilidades de customização e evolução da nave, quanto com a adição das diversas habilidades. Porém, o tal apelo aos famigerados elementos de RPG que vêm sendo aplicados em jogos de navinha como este, diz respeito mais a aspectos instrumentais (como looting, farming e grinding) do que no protagonismo em tomadas de decisões relevantes para os rumos de uma aventura dentro de uma narrativa interessante.

Ainda chegará o dia em que farão um jogo de navinha com os elementos mais importantes do RPG, mas enquanto o dia ainda não chega, Drifting Lands é uma boa pedida e entrega o que promete, mas se você não gosta de apanhar, passe longe.