Eu costumo dizer que os produtores de jogos indies salvam a indústria dos games, já que um AAA demora anos para ser produzido hoje em dia. Dá para contar nos dedos quantas super produções são lançadas por ano, enquanto que os jogos indies tem em toneladas (bons ou ruins).
Aqui no Gamerview temos excelentes jogos indies para recomendar, basta dar uma passada em nossa seção de reviews (vai encontrar jogos ruizinhos também). Death’s Door, desenvolvido pela Acid Nerve, um estúdio de dois caras, e distribuído pela Devolver Digital, é um RPG de ação com câmera isométrica (vista por cima) e é uma dessas gratas surpresas indies que me alegram tanto.
A morte confronta
Eu comecei a enigmática e divertida aventura em Death’s Door sem saber quase nada do jogo, somente o anúncio na E3, e acredito muito que minha experiência, digamos, não influenciada por nenhum conceito pré concebido, tenha me ajudado a reter melhor o que o jogo propõe.
No controle de um corvinho simpático (mesmo que ele não fale, sua linguagem corporal e sua aparência o faz parecer simpático), você tem o trabalho de ceifar almas como funcionário de uma empresa especializada (só de corvos) nisso. Cada corvo ceifador tem sua alma designada para colher, e é em busca disso que você vai.
Ao encontrar essa alma, que é colhida após a primeira batalha de chefe do jogo, você recebe uma porrada por trás, cai desmaiado e tem o fruto de seu trabalho roubado. Você sai em busca do ladrão e não demora muito para encontrá-lo. Ele explica porque fez isso e sua motivação parece plausível. Então ele pede sua ajuda e é nesse momento que o jogo começa de verdade.
A história se desenrola em um ritmo muito legal, nada forçado ou arrastado. E a forma como ela é contada é muito interessante. Death’s Door traz uma indagação sobre a morte e como se livrar dela. Com diálogos profundos e engraçados ao mesmo tempo, o jogo vai expressando suas “opiniões” sobre o assunto.
Confesso que o humor me surpreendeu, já que a atmosfera e trilha sonora nos leva a uma aventura triste e melancólica. Porém muitas vezes os diálogos com os vários NPCs presentes no jogo me arrancaram alguns risos, principalmente por conta do humor mórbido, o que causa certa estranheza, mas é muito bem aplicado no jogo.
Sem firulas, mas funciona muito bem
O corvinho não faz muita coisa diferente além de correr, rolar e atacar. A jogabilidade é bastante fluída, os comandos funcionam muito bem. Ele não é um esmaga botão frenético, mas também não é um souls-like, em que cada ataque precisa ser bem calculado. Death’s Door traz um combate em um ritmo bastante agradável.
Os inimigos são bem espalhados pelas fases e, em alguns momentos, algumas hordas aparecem. Alguns trechos são totalmente sem inimigos, o que é muito legal, já que a atmosfera, a ambientação e a trilha sonora fazem com que esses momentos solitários agreguem no que o jogo quer passar. É aquele momento de paz naquela rotina repetida de trabalho.
Falando em trabalho, o jogo tem um hub, que é o escritório da empresa de ceifadores de almas. Você vai encontrar alguns corvos e os diálogos com eles são muito interessantes. Você vai encontrar o corvo doido por trabalho; outro entediado; um que detesta o trabalho; ainda outro que soa misterioso.
Cada vez que você avança para uma outra região, você encontra uma porta, que dá no escritório. É como se fosse um checkpoint. Então, no fim do jogo, a região do escritório vai estar cheia de portas. Ou seja, você vai passar várias vezes pelo hub e cada NPC vai ter uma coisa diferente para falar, além de algumas mudanças que vão acontecendo no escritório conforme você avança.
Outra coisa importante em seu ambiente de trabalho é o seu chefe. Ele não participa muito da história em si, mas é o cara que vai melhorar suas habilidades, que são quatro: força, destreza, velocidade, e magia. Cada atributo tem cinco níveis de upgrade. Cada vez exigindo mais almas, que são adquiridas derrotando os inimigos.
O corvo conta com quatro habilidades distintas que são necessárias para progredir no jogo. Cada região vai liberar uma, mas todas as regiões tem áreas que só são acessíveis através daquela habilidade específica. Então se prepare para voltar às regiões iniciais para acessar novas áreas e conseguir novos itens ou melhorias dessas habilidades.
O pequeno herói (sim, ele é um herói) pode equipar cinco armas diferentes, cada uma com seus próprios atributos. Uma, particularmente, é bem desafiadora de conseguir. Exige decifrar alguns enigmas para destravar a porta. Não se preocupe, as legendas do jogo estão 100% em PT-BR muito bem localizadas. Até as conquistas estão bem localizadas, como “O Tigre e o Corvão”.
Um equilíbrio em diversos atributos diferentes
O jogo conta com três grandes regiões, mas cada uma delas tendo suas sub-regiões, o que garante uma diversidade interessante de ambientações. Você passa por cemitério; pântano; montanhas congeladas; castelos e mais regiões. Algo interessante é que o escritório é em preto e branco e o mundo fora dele é colorido. A interpretação é livre, mas entendo que a falta de cor no escritório mostra o tédio, o cansaço, o “não aguento mais esse lugar”.
A parte artística do jogo foi um acerto grande. Apesar de ser uma produção indie, os gráficos são bem bonitos. As cutscenes são simples, mas bem representativas. É interessante ver desde o preto e branco do escritório, com alguns pouquíssimos elementos coloridos (como a arma do protagonista), até as diversas cores nas mais diferentes ambientações. Em algumas salas fechadas com pouca iluminação, sombra e luz são muito bem implementadas.
O jogo conta com três grandes chefes, cada um dentro de sua região e subchefes. Chegar em cada um deles não é uma tarefa simples. Cada região vai confundir você sobre onde precisa ir, então a exploração é constante. Os puzzles são super intuitivos, nada simples, mas também não são de fazer você querer parar de jogar.
As batalhas contra os chefes são um dos pontos altos. É desafiador cada vez que um chefe traz um elemento novo à luta conforme ele vai enfraquecendo. Preciso destacar aqui as duas últimas batalhas contra chefes do jogo. Eu curti cada minuto (e olha que foram muitos por causa das várias tentativas). Pareciam danças muito bem coreografadas. Tudo isso embalado por uma trilha sonora super cativante, que emociona e empolga ao mesmo tempo.
O desenrolar da história e os diálogos finais do jogo fecham com chave de ouro a interessante e enigmática narrativa muito bem contada. Você termina o jogo refletindo em tudo que viu e leu (o jogo conta com diários dos outros corvos, que agregam muito a história). O jogo tem uma duração bastante aceitável para o gênero.
Com uma história super interessante, contada em um ritmo muito acertado e embalado por uma ótima trilha sonora, além de um gameplay super agradável e jogabilidade que respondem bem, Death’s Door tem grandes chances de chamar bastante a atenção esse ano. Arriscaria, inclusive, em dizer que deve concorrer em alguma categoria nas grandes premiações.