O gigante acordou. Desde 2011 sem uma versão inédita, a sub-série Modern Warfare mostra que está mais viva do que nunca. Advanced Warfare e Infinite Warfare tentaram, mas só esse novo Call of Duty: Modern Warfare (e sim, aposto que no futuro a galera vai confundir com o jogo homônimo de 2007) conseguiu trazer de volta toda a glória dos antigos clássicos. É um game completo, com uma das melhores (ou a melhor? depende do seu humor e do quanto você releva certos probleminhas em pelo menos uma das missões) campanhas de toda a série e um multiplayer renovado em muitos aspectos, com escolhas ousadas e que podem dividir a comunidade – mas com a qualidade de sempre.
Ver para crer
Em quase 15 anos de estrada, a série Call of Duty finalmente tem um novo motor gráfico. A engine antiga, derivada da id Tech 3, famosa por Quake III: Arena, se manteve viva por tanto tempo justamente pela versatilidade, já que em todos esses anos os estúdios foram adicionando as mais diversas melhorias. Mas a idade chega para todos e agora temos uma novíssima engine que deixou o game com um visual chocante, para dizer o mínimo.
Antes de tudo, a modelagem parece avançada até demais. Os modelos das armas provavelmente são os mais realistas já vistos na história dos jogos de tiro, com todo tipo de detalhe possível – e olha que um mero modelo de arma não é lá a característica que geralmente salta aos olhos de quem vê um game rodando. Aqui, eu me via parado apenas observando as armas que tinha em mãos.
Os efeitos de vapor, fumaça e fogo possuem uma certa “volumetria” inédita em consoles – Battlefield V e 1 chegam perto, mas tais efeitos ainda pareciam um pouco “artificiais” demais nos games da Electronic Arts. Todas as fontes de luz têm um tom realista difícil de expressar e, em HDR, parece que o tratamento das luzes artificiais (como luzes de faróis, sinalizadores ou lâmpadas) é radicalmente diferente do visto na luz natural.
Há um impacto visual imenso ao sair de uma casa para a parte de fora no sol e é algo que Gears 5 e Horizon: Zero Down fazem muito bem, mas definitivamente não nesse nível. Ou a engine é boa o bastante para saber o que fazer com os mais variados tipos de iluminação ou os desenvolvedores realmente perderam o sono com isso, porque o resultado final é impressionante.
As cenas com os óculos de visão noturna são igualmente deslumbrantes, com uma “tridimensionalidade” que eu nunca tinha visto ainda em cenas desse tipo. O contraste dos elementos com os cenários, as rajadas dos tiros, parece que tudo foi feito para impressionar! E o melhor é que tudo funciona: como de praxe, Modern Warfare busca rodar a 60 quadros por segundo e a resposta dos controles é absolutamente precisa. Jogar Modern Warfare depois de jogar um shooter que roda a 30 quadros por segundo é quase como dormir em um saco de dormir e acordar na suíte presidencial do melhor hotel do Principado de Mônaco, tamanha sensação de se sentir confortável.
Vale lembrar que eu joguei no Xbox One X, mas a maioria das características vale para todas as versões. No Xbox One normal, a resolução (que é dinâmica em todas as versões) vai bater em 900p e no PS4 em 1080p. No One X, a resolução máxima chega aos 2160p (o famoso 4K) enquanto no PS4 Pro o máximo que o game chega é 1528p. A grande questão aqui é que o game não parece ter sido lá muito bem otimizado para o console da Microsoft. Apesar da resolução maior quase o tempo inteiro, as quedas de quadros por segundo são mais frequentes e não é incomum bater nos 48 a 50fps em alguns momentos, com a taxa caindo ainda mais no One normal ou no S.
Infelizmente é esse o preço que se paga pela resolução maior. Talvez, uma boa alternativa fosse a Infinity Ward ter incluído uma opção de priorizar a taxa de quadros em vez da resolução, como vimos em alguns títulos de outros estúdios, como Middle Earth: Shadow of War, Hellblade ou mesmo os mais novos Tomb Raider. De qualquer forma, quem tem um monitor ou TV compatível com Freesync poderá ter uma experiência melhor, percebendo menos as quedas e inclusive com menos tearing.
Em time que já ganhou…
A campanha não é longa e na dificuldade padrão (a “Regular”), foi possível terminar em menos de 8 horas jogando sem pressa. Não é das campanhas mais longas, mas para mim, é com certeza uma das mais marcantes. Black Ops 1, o próprio Modern Warfare de 2007 e a sua continuação de 2009 tiveram campanhas excelentes, mas essa aqui, meu amigo… é pesada.
Modern Warfare se passa em 2019 e a trama gira em torno de um ataque terrorista a um carregamento de um tipo de gás letal que estava sendo levado a um fictício país chamado Urziquistão (aliás, a organização terrorista também tem um nome fictício: Al-Qatala). Como sempre, a história é contada de forma confusa, cheia de flashbacks e com o jogador sendo colocado na pele de diferentes personagens em diferentes localidades. Praticamente, não há telas de loading entre as missões, já que as cutscenes (em CG e que bizarramente rodam em uma resolução bem mais baixa que a do jogo) dão conta de “esconder” as telas de carregamento.
Como já é tradição em jogos da série Modern Warfare, nosso bom e velho Capitão Price dá as caras como um dos protagonistas nessa nova linha do tempo de 2019. Tudo bem, é um rosto conhecido, mas além dele, eu não consigo ter empatia por praticamente nenhum personagem que aparece nem nesse, nem nos outros Modern Warfare, muito em função dos diálogos na maioria das vezes risíveis e do fato de você nem ter tempo de ter uma conexão com os personagens.
Mas nada disso tira o brilho de Modern Warfare. Como em quase todas as produções da Infinity Ward, há mudanças de ritmo quase que constantes que não deixam o jogador se cansar de meter bala nos inimigos. Quando aquela missão furtiva parecia ficar repetitiva, ela acaba e você cai em um campo de batalha, em outro país, com um cenário totalmente diferente e em um cadência completamente oposta. No quesito de não deixar o jogador cansado ou com sensação de estar ali atirando só por atirar, Modern Warfare é quase impecável.
É “quase” porque em alguns poucos momentos, a estrutura das missões foi um pouco mal planejada. Estou falando especificamente de uma missão furtiva (que não vou entrar em detalhes para não dar spoilers) em que o jogador controla uma criança que deve fugir de um terrorista. Um passo errado é garantia de perder a vida e ter de recomeçar do último checkpoint, então essa parte específica fica parecendo um jogo de tentativa e erro. Tirando isso, os outros trechos de furtividade (inclusive um mais próximo do final do jogo e todo no escuro, com os óculos de visão noturna) são um deleite – arrisco dizer que foi a melhor jogatina furtiva que eu já tive o prazer de experimentar.
No geral, a campanha desse Modern Warfare de 2019 é facilmente digna de ser considerada uma das melhores de toda a série e, para mim, por pouco (muito pouco mesmo) não é a melhor de todos os tempos. O fato de ser relativamente curta não a desabona em nada, já que eu pretendo jogar tudo de novo nas dificuldades mais altas e depois mais uma vez para pegar todas as conquistas. Se sobrar tempo, ainda dá para voltar em algumas das missões mais memoráveis (a penúltima é espetacular) apenas para dar uma relaxada.
Multiplayer após às 22h?
O multiplayer veio sem grandes novidades e isso não é uma crítica, já que há infindáveis modos e opções. A nova engine, de novo, se prova agradabilíssima de ser experimentada nesses modos. Os modos tradicionais, como Team Deathmatch, Domination, Kill Confirmed e Search and Destroy ficam reunidos em um modo Quick Play, com opções de filtros para quem de repente não curte um desses modos. Uma das novidades é a lista de NVG (de Night Vision Goggles), exclusivamente composta por mapas à noite e sem elementos do HUD, como mini-mapa e contagem de granadas ou munição. A recepção foi mista entre a maior parte da comunidade mas, para mim, foi um deleite jogar esses mapas no escuro, principalmente em função da nova engine, que deixa tudo muito realista visualmente. Para quem curtiu esse estilo mas prefere os mapas de dia, há o modo Realism, que é basicamente isso.
De resto, há desafios diários e todos aqueles “perks” que podem ser acumulados e desbloqueados conforme o jogador avança. Como em todo Call of Duty, a população de jogadores é bem alta, a comunidade é fiel e nesse aqui ainda existe crossplay com outras versões. Os jogos da série ainda têm a tradição de se manterem bem populosos mesmo quando sai alguma nova versão, então encontrar partidas não vai ser um problema por muito tempo.
Por fim, o modo que gerou polêmica por ter um submodo exclusivo no PS4 (e que só vai sair no Xbox One e PC depois de um ano): o Special Ops. A polêmica toda foi instaurada porque muita gente acreditou que o modo inteiro estaria de fora das plataformas que não fossem da Sony. Enfim, esse tipo de modo é um “PvE” cooperativo com missões paralelas àquelas da campanha e com a característica de serem absurdamente difíceis. Em uma delas, no mapa Safeguard, eu sobrevivi míseros sete segundos na primeira vez que joguei. É um desafio legal, ainda mais porque há opção de tela dividida, mas a dificuldade pode ser para poucos.
Pode ir sem medo
Se ano passado a série Call of Duty caminhou por um caminho, digamos, tortuoso em meio a um mercado inundado por tantos battle royales, em Modern Warfare a série volta a suas origens em toda a sua glória. É quase um milagre que o jogo tenha saído com uma campanha tão memorável e com um multiplayer que literalmente não traz muitas novidades (a maior talvez sejam os mapas à noite mesmo), mas que é um prato cheíssimo para quem tem o mínimo de apreço por um bom jogo de tiro online.