Às vezes, no calor do momento, podemos deixar passar batido qual ou quais foram os primeiros jogos que compramos em uma nova plataforma. Mas me lembro até hoje de que, quando resolvi começar a usar a Steam em meados de 2013, fiquei quase que imediatamente viciado em Hotline Miami. Criado pela Dennaton Games e publicado pela Devolver, o jogo trazia a história de Jacket e sua matança desenfreada através de mensagens subliminares. Porém um desafiante a altura surge em Project Downfall.
Com dois jogos, a franquia Hotline Miami desapareceu, mas ainda é lembrada por muitos fãs com carinho e admiração por sua estética e trilha sonora fantásticas. Quatro anos já se passaram desde o lançamento de Hotline Miami 2: Wrong Number, e agora a MGP Studios, junto da Solid9 Studio, trazem Project Downfall, uma amálgama de Hotline Miami e John Whick, caso John fosse um civil normal prestes a chutar o balde do dia a dia em uma sociedade controlada por drogas.
Morrer, você sabe, não é tão ruim assim
Trazendo uma sociedade dominada por um modo de vida controlado de forma doentia, nosso personagem parece ser guiado por Teddy, um homem utilizando uma roupa completa de ursinho de pelúcia que o coage a cometer diversos assassinatos. Focando gangues, máfias e grupos criminosos diversos, nosso personagem segue deixando um rastro de sangue e selvageria por onde passa. Outro personagem importante em encaminhar-nos para a violência desenfreada é ninguém menos do que nosso bulbo cerebral, que parece estar ciente de que tudo talvez não passe de um “sonho ruim”.
Project Downfall traz toda uma história decadente em relação ao misterioso protagonista. Mesmo vivendo em um luxuoso apartamento na área nobre de sua cidade, o mesmo não consegue ficar longe da violência urbana, dos prazeres e traições da luxúria. Vivendo nesta versão ainda mais febril e infestada pelas luzes neon, experimentamos o que pode ser considerada uma Sin City moderna. O jogo ocorre de maneira na qual escolhemos as missões quando entramos em nosso carro, e como em Hotline Miami, aqui também elas são segmentadas até que sejam concluídas, nos levando a uma tela de pontuação.
Trazendo o gameplay de um FPS, a velocidade é a chave em Project Downfall. Nosso personagem pode receber o equivalente a quatro hits antes de ir ao óbito – o que ainda é uma vantagem em relação a Hotline Miami, onde apenas uma pancada é chão. Para evitar isso, basta mandar para dentro uma das diversas pílulas do jogo, que aumentam o foco, força física do personagem e diminuem o tempo ao nosso redor. Assim podemos facilmente matar nossos inimigos com as mãos nuas, pegar uma de suas armas antes que toquem o chão e abrir uma cadeia de mortes sequenciais.
No entanto, pelo uso contínuo das pílulas, nosso amigo passou a sofrer um quadro de perda de memória recente, o que faz com que percamos nossas armas toda vez que avançamos para o próximo nível de uma fase. Isso dá um enfoque maior na letalidade de nosso personagem, pois mesmo sem a utilização das pílulas, é possível utilizar o combo chute + soco que leva inimigos à morte rapidamente. No entanto, enquanto sob o efeito das pílulas, seja lá quais forem, o chute envia os inimigos voando a metros de distância e os socos destroem o interior dos oponentes.
Project Downfall é uma experiência interessante de seu próprio tempo e de sua cultura, trazendo uma amálgama de inspirações como fusão de estilos entre filmes como Drive, Blade Runner, John Wick e até mesmo uma pegada de Medo e Delírio em Las Vegas. Nosso personagem vive em constante degradação psicológica e emocional, levando-nos a crer que o que quer que seja que o espera no final da estrada, não há de ser elegante. Com o passar do tempo, a casa luxuosa se torna cada vez mais suja, nossa esposa se torna alguém totalmente estranha e vômito e lixo infestam o local.
O mundo de Project Downfall é como uma sequência indireta de Hotline Miami 2. As fortes cores neon invadem nosso campo de visão a todo momento, milícias e gangues tomam as ruas da cidade em uma guerra caótica e um civil comum tem que se armar contra os mesmos para sobreviver. Porém, diferentemente de seu antecessor espiritual, em Project Downfall a linha entre realidade e alucinação se torna ainda mais borrada, sendo difícil encontrar os motivos que levam nosso protagonista a tais surtos de fúria e assassinato.
Quem está aí?
Se me perguntassem o que realmente me faria indicar Project Downfall para alguém, seria a incrível habilidade de prender o jogador. Mesmo sem qualquer indicação de narrativa ou motivo pelo qual nos afundamos cada vez mais nesse redemoinho de decadência e violência pixelada, buscamos cada vez mais a mesma. Talvez a busca por uma conclusão onde finalmente entendamos o que está se passando não importe, e o simples prazer de poder ir de peito aberto contra uma sala repleta de inimigos é o que nos guia em frente.
Outro fato interessante é trazer à vida um antigo debate: como seria uma experiência ao estilo Hotline Miami em perspectiva de primeira pessoa. Aqui, diferente de seu predecessor, não temos máscaras ou alucinações atemporais galináceas. Mas temos a boa e velha trilha sonora sintetizada, uma antigo carro que nos leva aonde precisamos e uma grande dose de violência em slow-motion e sanguinolência. Ainda há muito o que se trabalhar em relação ao universo e como as personagens interagem entre si, e o jogo parece ter diversos finais, então resta muito a se explorar de Project Downfall.