Skip to main content

Bayonetta, o jogo de Hideki Kamiya (Devil May Cry) para a Platinum Games, foi sem dúvida um jogo de impacto. Conseguiu ótimos reviews, incluindo uma nota 10 da Edge inglesa (e 4 estrelas do Gamerview). Junto com sua qualidade, veio também uma boa polêmica. E com certeza não foi pela estilização de seu visual, ou seu gameplay – que, afinal de contas, são uma evolução (ou não) do que Kamiya já tinha mostrado na sua outra série estrela. O principal problema veio da sua heroína, e da maneira como o jogo gira em torno dela (tanto literal como figurativamente).

Bayonetta é uma mulher impossivelmente estilizada. Supondo que sua cabeça tenha o tamanho da cabeça de um ser humano normal, ela é uma gigante de mais de 2,20m, com pelo menos 1,40 de pernas. Além disso, a atitude – tanto da personagem quanto do jogo – é totalmente, digamos, “sexo-cêntrica”: ao andar, ela cruza as pernas de maneira provocativa. Existe um botão com o único propósito de fazê-la dançar como uma stripper. Existem algumas sequências onde a câmera passa entre suas pernas, com um generoso close de suas partes, hã, pudendas.

Eu já dei minha opinião sobre tudo isso antes, quando escrevi uma prévia baseado na demo. Bayonetta é uma personagem desenhada para dar vazão às fantasias loucas de um japonês tarado. A mulher tem uma cara de MILF S&M, mas exagerada à décima potência. Exagerada de tal forma que eu não me surpreenderia se começarem a aparecer travestis fantasiados de Bayonetta. E tampouco ajuda a roupa feita de cabelos, que convenientemente faz com que ela fique menos vestida quanto maior for o poder que ela está liberando.

Deixem-me repetir: quanto maior é o poder que Bayonetta tem que liberar, menor é a quantidade de roupa que ela veste. Além disso, existem aqueles golpes que ela tem. O mais legal, de longe, é aquele que eu mencionei na última coluna, que é descrito como um “vórtice de feminilidade super-poderosa” – que, claro, envolve uma abertura total de pernas. Sem contar que chegar no chefe de fase é descrito pelo jogo como um “clímax”…

Analisando este último parágrafo, aparece na minha cabeça uma metáfora tão estúpida que é genial. Tão genial, que acho impossível que Kamiya tenha criado o jogo baseando-se nisso. De acordo com essa tradução cretina que estou fazendo das intenções que Kamiya provavelmente nunca teve, o verdadeiro poder de Bayonetta é o sexo. Os poderes mágicos não são mais do que uma metáfora.

E a gente vê as matérias publicadas pelos colunistas por aí e vê opiniões das mais distintas. Muitas delas falam que Bayonetta é um exemplo de mulher forte nos videogames, que é realmente uma mulher, e não um ser bípede assexuado que tem seios, como a Chell de Portal, a Jade de Beyond Good and Evil, a Faith de Mirror’s Edge ou a Alyx de Half-Life 2 (apesar de eu discordar fortemente de que Alyx seja uma personagem assexuada). E algumas pessoas – como a Leigh Alexander menciona na sua coluna na GamePro – dizem que uma mulher ficar ofendida pela Bayonetta seria a mesma coisa que um homem ficar ofendido por aqueles personagens impossivelmente másculos e musculosos de qualquer jogo por aí.

Só que existe um problema. Você não fala algo como “homem forte” no mesmo sentido com que você fala “mulher forte”, como que para diferenciar da maioria das mulheres, que seriam “fracas”. E esse mesmo pessoal que celebra a Bayonetta como um exemplo para as mulheres do mundo todo, um tipo de ícone do neo-neo-feminismo, não se dá conta disso – e nem da metáfora (ainda que involuntária) de que a “mulher forte” que elas tanto celebram na verdade está “subindo na vida” à base de, hã, golpe de vagina.

Sei que muitas mulheres não se sentiram aludidas com a estereotipização (palavra feia, mas correta) das mulheres no meio dos videogames que a Bayonetta representa. Não sei até que ponto isso é bom ou ruim. O preconceito/estereótipo está nos olhos de quem vê. Só que tampouco podemos fechar os olhos para fingir que não vemos. A “cultura” dos videogames é algo tremendamente sexista, e Bayonetta, ainda que seja um jogo bastante competente, é um exemplo gritante de algo que não pode ser tolerado – porque mostra uma mulher que é forte, sim, mas da pior maneira possível.