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Ó, cinzas, ó, cinzas, queima-se a compreensão de cem noites, dança o cavaleiro negro com seu maciço de ferro. Assim como o nome dita, a Dragon Slayer é uma lâmina de dimensões impossíveis, de poder tão bruto e selvagem, que apenas um Berserker poderia empunhá-la. Porém, as histórias de Kentaro Miura não se resumem apenas a Berserk e sua reputação lendária. Bem como Delos, o Gigante, o soldado Noah, ou então Usumgallu (no recente e excelente Duranki), Miura sempre captou os olhos e corações de seus leitores com personagens e mundos extremamente complexos, com um amor intenso por suas obras.

Infelizmente, o mestre nos deixou no dia 6 de maio, por complicações causadas devido ao rompimento da aorta. No entanto, as obras de Kentaro Miura continuam vivendo em seus mangás e no mundo dos games.

Imagem doa rtigo sobre Kentaro Miura

Gigantomachia é um one shot excelente do começo ao fim!

Deuses mesopotâmicos e nórdicos festejam

Com grande influência da chamada “era barroca do mangá”, Kentaro Miura começou a dar seus passos neste universo. Trabalhando como ilustrador de títulos excelentes como King of Wolves e Japan, Miura foi ganhando espaço. Originalmente seus trabalhos iniciais possuíam traços mais semelhantes a obras como Capitão Espacial Harlock e Hokuto no Ken. Essa influência é evidenciada nas paginas de Noah e Futatabi, respectivamente.

Em Noah, podemos ver os primeiros sinais da influência religiosa e cultural no seu trabalho, um leque que seria amplamente expandido. Em 1988, Berserk, The Prototype ganha o mundo, já ocorrendo após os eventos do Bando do Falcão. Nessa estreia, vemos Guts caçar Vlad Tepes, mas em uma versão bem diferente da conhecida, em que vemos um cadáver vivo se tornar rapidamente um demônio.

Artorias em pose semelhante a de Guts no capa do 28° volume de Berserk.

Com o sucesso e aceitação que o protótipo recebeu dentro do grupo de teste, logo Kentaro Miura se pôs a aprimorar aquela que seria sua obra de maior escopo. Ele assimilava assim diferentes culturas, universos e lendas em um lindo universo de fantasia sombria. Berserk abraçou o mundo com sua história de vingança, violência, abuso e, acima de tudo, superação! A batalha entre o Cão Negro e o Falcão da Luz começava.

Entregue me aquilo, a sua Alma Negra

Com a explosão de Berserk, Kentaro Miura e Guts ganharam admiração e olhares do mundo todo. A primeira grande inspiração tirada da série pode ser vista em Cloud, de Final Fantasy VII. Assim como o Espadachim Negro, Cloud sofreu traumas (não tão brutos quanto os de Guts, mas ainda assim fortes) e se tornou distante. Portando uma enorme lâmina, Cloud usa a Buster Sword para destruir seus oponentes com ataques extremamente potentes.

Imagem do artigo sobre Kentaro Miura

Aquilo era muito grande para ser chamado de espada. Grande, grosso, pesado e desajeitado demais, parecendo mais um maciço de ferro,

Entretanto, as influências da obra se expandem muito mais além. Dragon’s Dogma, da CAPCOM, também traz um mundo fortemente influenciado pela obra. Durante nossa aventura por Gransys, podemos visitar um lugar extremamente semelhante à casa da bruxa Flora. Além disso, também temos a “aparição” de Schierke na forma da NPC Selene. As armaduras de Guts e Griffith da Era Dourada do mangá também estão disponíveis no PS3 e Xbox 360, embora apenas possam ser adquiridas após a quest Of Merchants and Monsters.

Dark Souls, de Hidetakka Miyazaki, está afundado em referências excelentes da obra. Geralmente quando se é perguntado exemplos, sempre vemos as mesmas referências ao Wheel Skeleton e Artorias do Abismo. Porém, a realidade é que já no primeiro game temos cenários, criaturas e até mesmo nuances trazidas do mangá. Grandes exemplos são as armaduras de Balder e Catarina, que remetem ao design da armadura de Guts e de Bazuzo, respectivamente.

Imagem do artigo sobre Kentaro Miura

Grunbeld sofreu uma depilação forçada pelo visto.

Sol negro do eclipse

Ainda assim, em minha opinião, uma das referências mais deixadas de lado está em Darksun Gwyndolin. Mesmo que as habilidades e estilo de luta sejam totalmente distintos um do outro, podemos claramente ver semelhanças na lore e no físico. Ambos são homens brancos andrógenos de cabelos brancos ligados a um sol negro, além de ambos acabarem sendo consumidos pelas trevas em determinado ponto da jornada.

O ferreiro André também tira suas inspirações do ferreiro de Guts, Goto. Com ambos trazendo um aprendiz bem jovem com o nome de Rickert. Temos a Moonlight Butterfly e sua aparência exatamente igual a de Rosine no arco das fadas. Seth, o dragão sem escalas, funciona em contra peso com Grunbeld, o apóstolo que se torna um dragão diamantino. Behelit na forma do Red Eye Orb e os Darkwariths se assemelham ao Skull Knight da obra de Kentaro Miura.

Guts idoso?

Dark Souls 3 é sem dúvida alguma o jogo que mais bebe das fontes de Berserk, no entanto. No jogo base, temos o set da Legião, extremamente parecido com a armadura do Espadachim Negro, com direito até mesmo a uma manopla diferente no braço esquerdo. A Fera das Trevas que personifica a fúria de Guts também pode ser encontrada na Fera de Sulyvahn e no Cão de Vigia dos Velhos Lordes, em Bloodborne. Schierke também retorna na forma de Karla, a jovem bruxa. Tendo “aparecido” na franquia Souls anteriormente como a companheira de Artorias. Inimigos como Winged Knight, Hollow Slave e Cathedral Evangelist fazem um excelente contraste a Azan, The Imp e Mozgus.

E onde estaria realmente Guts na obra de Hidetakka? Artorias, mesmo referenciando a pose, ainda possui discrepâncias. Afinal ele era um cavaleiro honrado, sua lâmina, mesmo sendo grande, não é tão violenta e rústica.

Se isto não é uma referência clara ao Eclipse do Behelit, eu não sei mais o que é!

A realidade é que o maior expoente de Guts na série é o Cavaleiro Escravo Gael. Com uma abertura lançando um corpo semelhante a Artorias, Gael traz ambos em sua concepção, portando uma lâmina brutalmente rústica, parecendo até mesmo não ter corte. Sua evolução o torna cada vez mais violento, errático e imprevisível, se movendo como Guts enquanto ensandecido pela armadura. Ele é mais perigoso ainda quando começa a usar a besta em sua mão esquerda e a capa para ocultar os movimentos de sua gigantesca e improvável lâmina.

Uma flor no campo de batalha

Demon’s Souls, Dark Souls e Bloodborne são excelentes homenagens à série Berserk e Kentaro Miura, mas não podemos esquecer dos jogos próprios. Infelizmente, Berserk possui apenas três títulos baseados diretamente na obra. Primeiramente, temos Sword of the Bersek: Gut’s Rage, lançado para o Dreamcast encapsulando os volumes 22 e 23 da obra.

Se você vir uma lâmina dessa magnitude vindo em sua direção, ajoelha e reza.

Cinco anos depois, Berserk Millennium Falcon Chapter: The Holy Demon War Chronicles chegou ao Playstation 2. O jogo trazia melhoras no gameplay e nos gráficos em relação ao anterior. O novo título abordava os eventos dos volumes 22 a 27. Por último, mas não menos importante, temos Berserk and the Band of the Hawk. Este foi um lançamento muito mais abrangente, disponível para PlayStation 3, PlayStation 4, PlayStation Vita e PC. O terceiro jogo mostrava o inicio da relação de Guts e Griffith, começando com a luta de Guts e Bazuzo, e terminava anos depois com Guts e seus companheiros embarcando o navio Seahorse.

A morte de Kentaro Miura é uma grande perda para o mundo das artes. Ele era um amante da própria obra, que acabava por atrasar seus volumes, justamente por ter uma grande paixão por desenhar ele mesmo. Sempre que vemos uma classe em algum jogo com enormes espadas montantes, cavaleiros em suas armaduras negras abastecidas por raiva e ódio, vemos ali Kentaro Miura. Como fã, me despeço de você, Miura San, através deste simples texto, que os deuses de todos os panteões o recebam com braços abertos.