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Como todo mundo deve estar careca de saber, saiu Heavy Rain. Uma mega-produção, com promoção forte por parte da Sony. Boa dublagem, história bem construída (até certo ponto), e tecnicamente perfeito (apesar de alguns bugs, até compreensíveis considerando o tamanho do jogo).

Como poucos devem ter ouvido falar, saiu junto com Heavy Rain um jogo similar para Xbox 360. Deadly Premonition é um jogo feito pela produtora cult Marvelous Entertainment. Também é um jogo de investigação, como Heavy Rain, mas com elementos de survival horror. Só que é um jogo ruim: a história é bizarra e mal construída, tecnicamente o jogo é cheio de falhas (como personagens com vozes inaudíveis, música muito alta em vários momentos sem motivo)… Tanto que o jogo foi lançado diretamente a preço de “classics” nos EUA, por 20 dólares (lembrando que um lançamento normal sai por 60 dólares).

Até aí, nada demais. Todo jogo, filme, músico etc. famoso tem seus “sucessores”/copiadores nojentos, que tentam ir na onda pra faturar uma grana fácil. No entanto, ao ver as páginas dos dois jogos no Metacritics, a gente tem uma surpresa…

Comparando as médias de reviews profissionais, temos uma boa idéia das diferenças objetivas entre os dois jogos: Heavy Rain tem 87, enquanto Deadly Premonition tem 54. Bastante justo. Mas as médias das opiniões dos usuários são bem diferentes; Heavy Rain tem 6,0, enquanto Deadly Premonition tem um 8,0!

O pior de tudo: eu sei que, objetivamente, Heavy Rain é muito mais jogo que Deadly Premonition. Só que, depois de jogar Heavy Rain e ler muito sobre Deadly Premonition, eu tenho uma opinião completamente distinta. Heavy Rain pode ser melhor construído, ter uma história complexa e tudo mais, mas tem um defeito: ele é EXTREMAMENTE pretensioso. A sensação que tenho ao jogar aquilo é que o pessoal da Quantic Dream está a todo momento olhando pra mim enquanto jogo, com um ar de superioridade, dizendo “você OUSA questionar nossa opinião? Nós gastamos milhões de dólares nesse jogo, esse jogo é bom porque fomos NÓS que o fizemos, não um idiota como você!”

Enquanto isso, Deadly Premonition tem uma história nonsense, um herói que discute com um amigo imaginário sobre como o punk rock é um dos maiores legados do século vinte ou como o filme do Superman é melhor do que Star Wars porque a música do John Williams é melhor no Superman – e que dá um sorrisinho pro jogador quando resolve um mistério. E, mesmo com uma jogabilidade quadrada e gráficos dignos da primeira geração de jogos do PS2, vou comprar assim que puder e jogar até terminar. Porque tenho a sensação de que é um jogo divertido, que o pessoal da Marvelous simplesmente colocou no jogo todas as coisas que achavam divertidas e colocaram ali, sem pensar muito se fazia sentido ou não.

Claro que esse tipo de sensação não é exclusivo desse jogo… O Suda51 e sua obsessão por luta livre fez alguns dos jogos mais bizarros da história. No More Heroes é um jogo bizarro, mas é careta perto de outras doidices suas, como Killer7, Flower, Sun And Rain ou Michigan: Report From Hell. E nem mesmo é exclusivo dos videogames. Quem não gosta daqueles filmes B com sangue de catchup? E aquelas roupas de brechó não são cool, no sentido de “eu nunca usaria uma porcaria daquelas, mas caramba, como fica legal!”?

Michael Clarkson, em seu blog, discorre um pouco sobre esse tema. É o que os anglo-saxões chamam “camp”, o ridículo e ruim, mas de uma maneira tão exagerada que fica legal. E ele tem razão em muitos pontos, mas esquece de uma coisa…

Não basta você ser ridículo. God of War e Resident Evil 4 são ridículos no sentido de que têm uma jogabilidade mais ou menos limitada, histórias clichê e muito sangue… Mas esses jogos, por melhores que sejam, não entram nesse espírito por um bom motivo: eles são superproduções. O dinheiro sempre paira como uma “entidade”, faz com que eles não sejam percebidos como autênticos. Agora, um game de um outsider, sem apoio de grandes estúdios, mesmo que seja ruim, tem essa aura de autenticidade que falta nos outros.

Porque todo mundo gosta dos outsiders, dos caras que não se dobram às grandes corporações e que são autênticos. Você “sabe” que o Suda51 é um cara legal, porque ele gosta de coisas legais, faz os jogos dele do jeito que ele gosta e coloca essas coisas legais que ele gosta no jogo, aí o jogo também é legal! Ele não tem que obedecer a uma grande corporação, ele vai na porta da loja pra dar rolos de papel higiênico pra quem compra o jogo dele! Ele faz as coisas como quer, punk is not dead!

Algo completamente subjetivo? Com certeza. Mas é bom jogar um pouco de subjetividade no gosto da gente. Ficar jogando só o que as grandes corporações empurram pra gente é um saco.