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[miptheme_alert type=”warning” close=”false”]Atenção! Esta coluna reflete apenas a opinião do autor e não necessariamente a dos outros membros do Gamerview.[/miptheme_alert]

Outro dia o Humble Bundle estava fazendo ofertas em jogos indicados ao BAFTA. Aí resolvi comprar That Dragon, Cancer. Um jogo que eu sempre tive curiosidade desde que saiu. Só pra avisar, esta coluna contém alguns spoilers.

Para quem não sabe a história por trás do jogo: o filho de Ryan e Amy Green, Joel, foi diagnosticado com câncer terminal no cérebro quando tinha 12 meses de vida. Os médicos lhe deram de 4 a 6 meses de vida, mas Joel conseguiu aguentar quatro anos, falecendo aos cinco anos de idade, em 2014. Ryan decidiu que queria compartilhar suas experiências e que a melhor maneira seria através de um jogo.

É uma experiência catártica. Por isso, como pai, fica muito difícil criticar. That Dragon, Cancer realmente passa o desespero de Ryan e Amy (especialmente forte é a parte em que Joel está chorando sem parar no quarto de hospital e Ryan tenta de todas as formas acalmá-lo, sem sucesso). Algumas metáforas-clichê (o pai que “sente que está se afogando”) ou a parte que dá título ao jogo de plataforma, em que o câncer é representado por um dragão que não pode ser derrotado – porque seu medidor de vida chega próximo de zero, mas nunca se esgota) enfraquecem o conjunto. E, numa nota pessoal, a maneira como Ryan e Amy colocam sua religião em primeiro plano sempre que podem é bastante incômoda. Mas a experiência é forte. No entanto, como jogo, That Dragon, Cancer é a prova de que os videogames não são um meio válido para contar histórias.

Como disse, a história é forte, um soco na boca do estômago, e se conta sozinha. Mas a interatividade está ali como um acessório. Você está num hospital vazio, Amy está sentada em uma poltrona com Joel nos braços e a única coisa que você pode fazer é andar pelo hospital e ler cartões espalhados pelos quartos e corredores (que contêm mensagens escritas pelos apoiadores do Kickstart do jogo). Na cena que mencionei acima, em que Joel está chorando sem parar, você é obrigado a fazer o que o jogo quer que você faça: você PRECISA ir até a cama de Joel para ouvir Ryan pedindo para Joel se acalmar, depois você PRECISA ir até a bandeja para pegar uma caixinha de suco para dar a Joel, que vai bebê-la e vomitar. Amy e Joel estão num barco, com Ryan nadando ao lado se afogando, e você é um pássaro que vai voando de boia em boia para fazer que o barco avance e que Amy e Ryan digam as suas próximas falas.

E That Dragon, Cancer não é uma exceção. É uma limitação do meio. Se um game designer chega em um ponto em que precisa fazer a história seguir adiante, ele precisa desativar o jogo e ativar o “livro” (texto) ou o “filme”. A interatividade é temporariamente interrompida, o jogador passa a ser um agente passivo. Mesmo Braid, o jogo que melhor usou a interatividade como parte da sua história, depende de texto para passar ao jogador o que ele quer dizer.

Por isso que eu acho engraçado (e triste, em partes iguais) quando alguém elogia um jogo tal dizendo que é “cinematográfico”. Porque demonstra um desconhecimento do meio. A história tem que estar ali para dar uma razão de ser ao jogo, não ao contrário. The Legend of Zelda Breath of the Wild não é o grande jogo da década porque tem uma história genial, mas pelo que você pode fazer dentro do jogo.

Se o objetivo do criador do jogo é contar uma história é porque está fazendo errado, porque contaria melhor sua história escrevendo um livro ou fazendo um filme.