Em 1982, a Disney se aventurava em sua primeira tentativa de produzir um filme misturando o humano e o digital, com a história de Tron. Um clássico dos filmes cult, caso não o conheça, é uma das mais fortes inspirações de Narita Boy. É impossível jogá-lo sem associar as duas histórias, ainda mais para quem gosta desse universo dos anos 80 que é trazido com toda a sua força pelo Studio Koba.
Mas não se deixe levar pela megalomania de um mundo cibernético e um herói que está ali para salvar os dois mundos do completo caos, que é causado por um dos programas que assumiu o controle do lugar, Him. Mesmo com essa ameaça, o título traz uma história intimista, cheia de nuances e que vai, sem sombra de dúvidas, bater no seu emocional como um socão daqueles muito bem-dados.
O cyber-herói
Surgido numa campanha do Kickstarter em 2017, Narita Boy levou quatro anos para a sua produção ser completada e eu não me conformo de não ter visto algo sobre ele antes. O game de plataforma te joga na sua arte pixelada, representando a década de 80, para mergulhar numa jornada dentro do início da exploração cibernética e no surgimento dos primeiros consoles de mesa no mercado.
Mesmo controlando o herói que dá o nome do jogo, que é o escolhido e previsto em todas as profecias, a história não é sobre ele ou o vilão. É sobre o criador deste universo, Lionel. Him conseguiu apagar as memórias do desenvolvedor, deixando ele completamente fora de si e não conseguindo agir conforme a poderosa entidade toma conta de tudo e ameaça dominar ambas as realidades.
Seu trabalho ali não será apenas destruir todos os Stallions, fiéis servos do grande mal. Cabe a você ajudar a Motherboard a recuperar todas as lembranças perdidas de Lionel, entrando em cada uma e revivendo os momentos mais impactantes de sua vida. Vou ser sincero com vocês, adorei cada instante que Narita Boy me fazia descer a espada em meus inimigos, mas era nas memórias do homem que eu realmente me aprofundava na história que era apresentada.
Eu não vou dar muitos detalhes para evitar que tome spoilers, porém se você jogar Narita Boy preste muita atenção em toda a saga que ocorre no mundo real e nestes pedaços perdidos que Him tomou. Acompanhar tudo o que aconteceu com o programador, desde o seu nascimento, infância e fase adulta é um dos pontos altos e admito que em alguns trechos isso vai chegar até a te emocionar.
Entre estes momentos, o game vai te oferecer uma excelente jogabilidade enquanto avança entre os reinos criados por Lionel. A energia Trichroma vai te acompanhar enquanto explora cada canto deste universo, eliminando os Stallions e desvendendo diversos puzzles que impedem o seu avanço. Alguns são simples demais, enquanto outros vão exigir que esteja 100% atento ao ambiente ao seu redor. Às vezes a resposta que procura está pintada numa parede ou no rosto digital de alguma criatura aleatória. Preste atenção.
Confesso que, enquanto a história segue uma trilha tocante, o gameplay também tem momentos de genialidade. Para fugir do básico, você não será apenas um herói com a espada lendária nas mãos em Narita Boy. Você desbloqueará muitos power-ups que darão técnicas distintas, que exigirão bastante habilidade para prosseguir utilizando-as. Além disso, contará com o apoio de summons, de uma prancha e até mesmo poderá montar em certos robôs para chegar em outros lugares.
Você contará com comandos simples, porém dominá-los te dará um bom trabalho. Cada oponente tem uma certa fraqueza e, muitas vezes, vários diferentes aparecem para te enfrentar em hordas. Aqui não será o lugar onde ser bom em apenas um dos pontos te ajudará. Ou você realmente aprendeu a jogar ou o título te esmagará nas inúmeras mortes que vai ter de encarar. Se dominando você já não aguentará tanto o tranco, imagina sem saber.
Apesar de ter uma dificuldade em certos momentos, Narita Boy é um game relativamente fácil. Ele salva a todo momento e as mortes não são muito punitivas. No máximo, você volta do último ponto salvo, que pode ter sido em menos de dois minutos. Eu não me senti nem um pouco acuado, dando mais espaço para tentar coisas novas em menos tempo, ao invés de percorrer longas distâncias como é visto em alguns outros.
Anos 80 e Narita Boy
O jogo tem uma história excelente e um gameplay invejável para vários games de plataforma, mas o que Narita Boy chama atenção mesmo é no seu design. Conforme podem ver pelas imagens deste review, até mesmo a tela é adaptada para ser semelhante a uma TV de tubo, dando a impressão de que está realmente jogando algo antigo no seu videogame. Claro que dá para mudar isso e deixar tudo normalizado, mas você não ousaria, certo?
A equipe do Studio Koba também abusa da temática em seu visual, com códigos binários aparecendo em vários momentos, as cores básicas estarem sempre em algum ponto e a arte pixelada te deixando ainda mais na vibe da década proposta. Eu realmente senti estar jogando algo criado nessa época, não algo que foi feito em 2021 baseado nisso, sabem? Tem uma diferença absurda entre ambos e acredito que a desenvolvedora acertou o tom em trazer uma experiência que realmente soasse real o bastante.
O mesmo vale para o som, que diga-se de passagem merecia até um prêmio. Não digo apenas no tema musical, que conta até com uma canção que ficará na minha mente por um longo tempo, mas todos os áudios foram feitos com o intuito de que você gravasse aquilo consigo. Quando o game começa, você falará junto com a abertura “NARITA BOOOY”, assim como quando morrer, repetirá o “REST IN FORCE” do mesmo modo. Se possui dúvidas sobre ela, toda a trilha-sonora já está no Spotify, pessoalmente recomendo ouvir Saving the World.
Aplaudo de pés toda a equipe da produção deste título, qual eu não estava dando a menor bola até alguns dias atrás e depois que finalizei ele não pude imaginar o meu ano sem tê-lo jogado. Ele casa perfeitamente até com as minhas obras preferidas, como o filme citado anteriormente Tron e sua estética, assim como tudo apresentado na obra literária Jogador nº1, que depois virou um longa-metragem adaptado pela Warner Bros. Não tinha como eu odiar, mas não sabia que gostaria tanto dele.
O único defeito que encontrei é a sua duração, qual foi curto demais de acordo com as limitações que seu universo possui. Você tem o cenário da Capital e dos três reinos, o amarelo, azul e vermelho. Você passa por cada um deles em menos de duas horas, dependendo de sua habilidade. Se você não for como eu, que fica procurando cada detalhe por algo secreto nem nada do gênero, completa isso em muito menos tempo. Quando eu estava verdadeiramente empolgado, ele já estava no trecho final.
Isso não atrapalha em nada a sua experiência em Narita Boy, até porque tem alguns segredos dentro destes reinos que pode passar mais tempo buscando. Cada um dos representantes do lugar, as summons que te acompanham, possui um quarto escondido que desbloqueia um troféu ou uma conquista nova para a sua coleção. Nada de impressionante até esse ponto, mas quem busca a platina e os 1.000 pontos do Xbox darão uma boa buscada nisso para completar.
Se você curte a ambientação dos anos 80 e busca um jogo de plataforma que te fará pegar o gosto de avançar, a Team17 e o Studio Koba acertaram em cheio em trazer esse sucesso para todos os videogames atuais. Como disse, eu não sabia que precisava jogar essa pérola até o instante que estava cortando todos com a TechnoSword e ouvindo os sons clássicos, como se tivesse com um NES ligado na minha frente.
Caso não dê uma chance a Narita Boy, estará perdendo uma chance de ouro de ver o início desta saga. Apesar de ter começo, meio e fim, a desenvolvedora mostra que a sua trama não vai parar por aí e pode esperar por algo maior e completamente mais insano em breve. Eu mesmo mal posso esperar pelos próximos capítulos sobre tudo que envolve o mundo cibernético visto no game.