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Uma das grandes paixões da minha vida são os RPGs. Pena que hoje em dia está difícil arrumar tempo e aproveitar horas contínuas de uma aventura, seja na tela ou no papel. Há muito tempo venho acumulando vários livros de sistemas e cadernos de histórias, personagens e criaturas. Em 2015, quando me deparei com o primeiro Pillars of Eternity no PC, foi uma experiência muito interessante. Com a sequência, a Obsidian conseguiu se superar e Pillars of Eternity II: Deadfire pode ser facilmente considerado um dos melhores RPGs modernos.

Pillars of Eternity pegou o melhor do gênero, mas também fez questão de deixar sua própria marca em uma aventura tão bem-feita que a história parece ter saído diretamente de páginas escritas por grandes mestres da literatura, como J.R.R. Tolkien ou George R. R. Martin. Agora, a Obsidian nos leva para outro canto deste mundo perigoso e exótico em Pillars of Eternity II: Deadfire, então prepare sua alma para se aventurar no Arquipélago do Fogo Morto, uma cadeia de ilhas ao leste da verde e agradável Dyrwood.

Rola o dado e faz um teste!

Como dito antes, Deadfire é uma verdadeira obra-prima dos RPGs modernos, contando com tudo o que se pode esperar de um jogo do gênero. Com uma mecânica de gameplay extremamente polida, trilha sonora marcante e ótima escrita, o título mostra porque merece um lugar na história dos games.

Quando eu tiver terminado com você, vai implorar para que eu tivesse usado os canhões.

Começando cinco anos após o final do primeiro jogo, o Observador (o jogador) está desfrutando de uma vida relativamente calma e tranquila em sua fortaleza em Caed Nua. Uma pequena ligação entre este e o jogo anterior permite que este novo incorpore a possibilidade de rever e arcar às suas decisões, desde que você importe o save da primeira aventura. Uma grande sacada da Obsidian é o fato de que as duas storylines não são diretamente interligadas, permitindo que quem não tenha jogado o primeiro possa aproveitar Pillars of Eternity II da mesma maneira.

Você é um herói que, dependendo de para quem se pergunta, é amaldiçoado ou abençoado, com a capacidade de guiar e ouvir as almas dos mortos. Após os eventos do game anterior, você decidiu pendurar a chuteira e viver tranquilamente, mas após diversos sonhos que foram ignorados o desastre ocorre e o colosso de cristal Adra, que estava enterrado sob um castelo, é possuído pelo deus morto Eothas. Com isso o titã explode do chão, destruindo a sua casa e te deixando para morrer.

Você sobrevive, graças à força descomunal da sua alma. Tendo servido os deuses no jogo anterior, você tem a bênção de Berath, deus(a) da vida e da morte, podendo retornar a um corpo saudável desde que concorde em rastrear Eothas e descobrir o que ele está planejando. Ou você pode recusar e morrer, mas graças ao seu/sua salvadora você descobre que o gigante foi visto marchando na direção do Arquipélago do Fogo Morto. Assim se dá início à perseguição a bordo do seu navio, o Defiant.

As cartas vão contar o passado e revelar o futuro.

Antes de qualquer aventura de RPG vem a melhor parte: criar seu personagem! O sistema de criação de personagens é muito rico e bem trabalhado, dando a capacidade de criar o seu personagem inteiramente, não só escolher o nome ou afins. O jogador pode escolher seu sexo e uma das seis raças, sendo que cada uma delas possui sub-raças como os elfos da floresta e elfos da tundra, por exemplo.

Após ter escolhido sua raça e gênero, podemos partir para a escolha de classes. O Observador e seus companheiros agora podem ser híbridos de duas classes e todas as combinações possíveis tem seus próprios nomes. O primeiro personagem que criei possuía apenas uma classe: era um dobra-mentes, um mago focado em ataques mágicos e capaz de controlar inimigos, mudando completamente o campo de batalha. Já o que criei para uma segunda rodada foi um anão híbrido, um cruzamento entre um lutador e um trapaceiro. Ao recrutar novos companheiros, o jogador também poderá escolher se o seu companheiro terá apenas uma classe, que poderá ser escolhida entre duas opções pré-definidas, ou se será um personagem híbrido com a fusão das duas classes oferecidas para ele.

Algo que senti falta é como os NPC reagem em relação à raça escolhida. Não há diferença de tratamento e nem desvantagens com aparências grotescas ou monstruosas.

Como sempre, há uma barreira para evitar o famoso OP (overpower): personagens híbridos não podem acessar a camada final da árvore de habilidades de suas classes combinadas. Enquanto os personagens de classe única obtêm dois pontos de habilidade por nível, personagens híbridos recebem apenas um ao todo ou um por classe, restringindo um pouco a progressão, a fim de balancear o jogo e aumentar ainda mais o seu valor de replay.

Agora que você já terminou seu personagem e já adentrou na história, você acorda em seu navio, mas não há tempo de sequer descansar, pois já está sob ataque. O combate é basicamente o mesmo do primeiro jogo, mas muito mais responsivo. O sistema de pausa em tempo real pode ser ajustado com a mesma medida de profundidade que em Pillars of Eternity. Você pode programar para que o jogo pause ocasionalmente durante o combate e você consiga se orientar melhor.

Eu sei que vocês esperavam uma batalha épica com canhões e tudo mais, mas estou com pressa…

Em termos de mecânica, o combate não é alterado de forma significativa, apenas levemente modificado. A inteligência artificial melhorou, há mais uso automático de magia, ficou melhor equilibrado e assim por diante. Os encontros de combate são mais curtos porém mais dinâmicos, mesmo que você seja o tipo de jogador que faz uma pausa toda vez que alguém planeja respirar. Além disso, cada personagem também tem a capacidade de usar “Empoderar” uma vez a cada encontro. Ou seja, agora você pode fazer diversos textões enquanto bebe seu Starbucks medieval.

Empoderar também permite ser usado tanto para buffar o personagem quanto uma de suas habilidades, aumentando ainda mais a chance de derrotar inimigos mais poderosos encontrados por acaso. Isso pode acarretar uma verdadeira mudança na batalha, já que além do status e equipamento do personagem ainda há um grande foco em probabilidade, o que é um dos maiores diferenciais, emulando a rolagem de dados que acontece nos RPGs de mesa. Dessa forma é adicionado uma certa aleatoriedade ao jogo: não é porque você é capaz de acertar aquele inimigo que você de fato irá! Sua flecha pode ser desviada pelo vento, defendida pelo inimigo com um escudo ou você pode ter tremido no ataque.

O Coque Samurai ainda não saiu de moda no Arquipélago do Fogo Morto.

Outra grande característica bem executada em Pillars of Eternity II: Deadfire é o mundo aberto, famoso nos RPGs. O jogador deve explorar o mundo atrás de respostas para a aventura e encontrar viajantes, inimigos, cavernas e templos misteriosos. Nesta sequência, o jogador pode viajar pelo Arquipélago movimentando uma flecha pelo mapa e interagindo com cidades, caravanas, florestas etc. Há também uma mecânica de combate naval, diferente do combate normal: o combate marítimo não rola em tempo real e sim de uma maneira abstrata baseada em turnos.

Os confrontos navais ocorrem com o jogador controlando o navio em diferentes velocidades, fazendo curvas, atacando o inimigo, disparando canhões ou embarcando em seu navio, e isso acabou sendo um ponto negativo no jogo. O combate marítimo toma muito tempo e às vezes ocorrem em momentos realmente inoportunos, que vão exaurir e exigir muito do jogador. Caso você não tenha se acostumado com a mecânica de batalha naval, pode esquecer, pois será constantemente obrigado a tentar embarcar no navio inimigo. Durante estes combates marítimos, o jogador receberá diversos comandos e diretrizes de como o barco inimigo está se comportando, sem nenhum auxílio visual exceto texto. Então caso o jogador não possua nenhum conhecimento naval, o combate marítimo deixa muito a desejar e pode ser um grande empecilho.

Piratas vão evitar que o jogador acesse certas áreas, caso não tenha atualizado seu navio com as melhorias necessárias para aquele momento. Quanto ao seu navio, além de comprar embarcações maiores e mais fortes, fortalecer sua infraestrutura, comprar mais canhões e vários outros itens, você pode personalizar o nome e as cores de seu barco – de preferência nomes que tragam boa sorte e nunca afundem, como Titanic, Bolsa de Valores, Preço de Revenda de Chevete, Vasco da Gama etc. O navio será seu QG e meio de transporte, onde você vai se recuperar, descansar e armazenar itens.

Ainda bem que não é um RPG de mesa, se não metade já teria sido lançada ao mar só pela #zoeira.

Pillars of Eternity II: Deadfire também traz inúmeras sidequests e interações com personagens pelo mundo todo, sejam humanos, anões ou fantasmas. Durante sua aventura, o jogador poderá acessar um diário que lista todas as quests ativas, completas ou as que são deixadas para depois. Outro ponto importante a ser notado é a reputação que seu personagem está deixando no mundo, pois suas ações dividirão as pessoas, que reagirão positiva ou negativamente a certas condutas. A monja Xoti, por exemplo, pode não gostar de você ao demonstrar qualquer sentimento anti-religioso.

Você pode acompanhar o que cada pessoa pensa de você em sua ficha de personagem e com isso se tem uma ideia da sua reputação nesse mundo, que vai sendo moldada pela maneira como você fala com as pessoas e lida com as situações. Sombria, racional, apaixonada, agressiva e diplomática são apenas alguns dos traços de personalidade que você pode e deve aprender. Isso proporciona um roleplaying excepcionalmente profundo, permitindo que crie um personagem com uma personalidade sutil que tenha um efeito direto no diálogo e como as pessoas o percebem.

Não ataque a criatura gigante! Ele pode nos matar mais rápido que um Beholder!

Uma jornada inesquecível

Jogar um RPG tão bom assim é algo que me dá gosto de saber que ainda há muitos fãs do gênero por aí, fazendo histórias ainda mais incríveis do que as que jogamos antes. O jogo se destaca muito bem na história e na apresentação, linda do começo ao fim, com incríveis escolhas estéticas e cores vibrantes. As imaculadas águas azuis do Arquipélago do Fogo Morto acariciam as margens arenosas; pedras irrompem a superfície do mar coberta de corais; pilares luminosos de Adra brilham e hipnotizam o jogador.

O jogo também possui uma forte influência costeira: a pequena cidade de Port Maje parece ter saído diretamente de Acapulco, enquanto a grande cidade de Neketaka mostra como é uma enorme cidade construída pelo Aumaua e fará com que você passe horas explorando seus vários distritos. A trilha sonora é outro ponto forte, deixando a sua jornada sagrada na caça de outro deus ainda mais épica e prazerosa. A navegação é a única parte que eu realmente detestei neste jogo, embora você passe a maior parte do tempo em combate. Propondo um RPG de fantasia com páginas e páginas de diálogos brilhantes e capazes de descrever de maneira fantástica até os mínimos detalhes, Pillars of Eternity II: Deadfire entrega tudo isso e muito mais!